sexta-feira, 13 de agosto de 2010

Alejandro Penã, prisioneiro político venezuelano, escreve aos jovens


Queridos jovens: 
Ao completar um mês de meu encarceramento injusto, senti o desejo de me comunicar com vocês, convencido que me minhas palavras poderiam lhes ser úteis. 
A maior aspiração de todo ser humano - especialmente intensa nos jovens - é alcançar a felicidade; entretanto, segundo minha experiência pessoal, encontra-se a felicidade de uma forma que poderíamos chamar de misteriosa. 
Dado que nosso corpo é animal, mas nossa alma é angelical, existem tendências contrárias dentro de nós. A parte animal nos tenta a buscar a felicidade nos aspectos materiais, como são os prazeres, o dinheiro, a satisfação egoísta, etc. 
Essa foi a opção que escolhi em minha juventude. Venezuela era um país pujante, havia estabilidade política e dinheiro em abundância, e todo profissional universitário tinha seu futuro econômico assegurado. Tanto assim que, recém-graduado pela Universidade Simón Bolívar, já era dono de minha própria empresa, tinha dinheiro, propriedades, carro, e ao cabo de poucos anos, até mesmo um avião. 
Me dediquei ao trabalho, ao esporte (obtendo triunfos para a Venezuela em numerosos campeonatos de artes marciais), a festas, a viagens prazerosas e, enfim, a desfrutar a vida. Entretanto, apesar das aparências, não era feliz; sentia um grande vazio dentro de mim. 
Não me sentia bem me divertindo quando, ao redor de mim, observava tanta pobreza e tantas diferenças sociais. Ademais, compreendi que o sistema democrático venezuelano era insustentável, a não ser que mudanças fundamentais fossem feitas. 
Apesar da aparente bonança, produto dos lucros do petróleo, Venezuela estava se desmoronando moral e economicamente. Isso se fez evidente em fevereiro de 1983, quando ocorreu a primeira desvalorização do bolívar, o que se conheceu como "sexta-feira negra". 
Ao completar trinta anos - após passar por uma crise existencial derivada daquelas reflexões - cometi o que qualquer pessoa consideraria uma "loucura": vendi tudo o que tinha, decidi me dedicar à política, e comecei a elaborar um projeto capaz de converter a Venezuela em uma potência industrial; para tanto, estudei as experiências históricas de Estados Unidos, Alemanha e Japão, assim como o caso exitoso do Plano Marshall, que serviu para reconstruir a Europa após a Segunda Guerra. 
Estava convencido de que o bem-estar que havia observado nos Estados Unidos e na Europa, e outros países que havia visitado durante minhas viagens, não podia ser propriedade exclusiva de outras nações. Se eles haviam pedido alcançar o desenvolvimento, o que nos impedia de fazer o mesmo? 
Confesso que os primeiros anos de minha atividade política foram muito duros e cheios de incompreensão; entretanto, comecei, por fim, a experimentar - ainda que levemente - um sentimento de plenitude que até então me era desconhecido, o qual me animou para seguir adiante, apesar das dificuldades. O sentimento de plenitude cse foi incrementando ao passar do tempo, à medida que avançava em minha preparação intelectual e obtinha alguns incipientes sucessos políticos. 
Afortunadamente, consegui uma maravilhosa mulher que compartilhava minha "loucura" pela Venezuela. Nos casamos, tivemos três filhas, e há pouco completamos 20 anos de matrimônio estável, muito frutífero e cheio de amor. Esse apoio foi fundamental para continuar meu caminho com perseverança e firmeza. 
Quando o senhor Chávez chegou ao poder em 1998, eu tinha 44 anos. Havia alcançado a maturidade política e intelectual suficiente para enfrentar com êxito seu projeto castro-comunista, como de fato tenho feito. Modéstia a parte, tenho sido tão bem-sucedido em meu trabalho, que a Chávez não coube outra medida que me prender, para tentar - sem êxito - refrear minhas iniciativas. 
Paradoxalmente, esses últimos doces anos, ainda que carregados de problemas, tem sido os mais felizes da minha vida, sem renegar os anos anteriores. Certamente, me dá tristeza ver meu país se destruindo; todavia, em meio a essa tragédia, sou feliz, pois não vivo para satisfazer a mim mesmo, mas para fazer o bem à minha pátria, à minha família e a meus amigos. 
E é justamente nisto que consiste a verdadeira felicidade: em se esquecer de si próprio (no fim, somos seres mortais) e em se entregar a uma causa transcendente, servindo aos demais e construindo o bem comum. 
Com isso, não quero censurar os prazeres que a vida proporciona, mas afirmar que essas diversões ganham outro sentido - mais humano e verdadeiro - quando são ordenadas segundo uma causa superior. 
Vocês vivem uma Venezuela muito diferente daquela de minha juventude. Atualmente, apenas se percebem problemas; existe um desconcerto e um desânimo generalizados; e, pior ainda, o futuro parece mutilado. Não obstante, vista de uma perspectiva diferente, a Venezuela de hoje lhes dá a oportunidade de assumir desafios e responsabilidades maiores; de se preocupar com assuntos transcendentes; de lutar por seu futuro, pelo futuro de seus entes queridos e por todos os seus compatriotas; por fim, lhes permite orientar sua vida de acordo com o conteúdo angelical de suas almas ao invés de dedicá-la a satisfazer a parte animal que jaz no corpo. 
Comentava no começo dessa carta que a felicidade se consegue de maneira misteriosa. Exemplo disso é minha situação atual: supostamente eu deveria estar triste e ressentido porque me encarceraram injustamente, acusando-me de um horrendo delito que não cometi, e, entretanto, ocorre o contrário; nunca me senti tão orgulhoso, tão útil à minha pátria, e tão contente comigo mesmo por haver agido com patriotismo e retidão. Sem dúvida, sou um homem feliz e plenamente realizado. 
Esta - meus queridos jovens - é a lição que queria lhes transmitir hoje. A felicidade se encontra quando a vida está orientada a um fim superior. 
Sejam felizes, mas construindo o bem. Amem sem limite, mas de maneira ordenada. Respeitem e queiram bem a seus pares, buscando bem-estar deles mais do que o seu próprio. Riam a gargalhadas, mas, ao mesmo tempo, dediquem-se ao próximo. Estudem muito, não por obrigação, mas pelo prazer de aprender. Sejam valentes, mas não temerários. E, por fim, desfrutem a vida com alegria, mas também cumpram a vocação que Deus depositou em seus corações. 
Finalmente, quero lhes enviar uma mensagem de esperança e de otimismo. A triste situação política que vive o país é temporária. Logo se abrirão novos caminhos para os venezuelanos. Ponham sua fé em Deus e sua confiança na pátria que os viu nascer. Prometo-lhes que o futuro será bem melhor. 
Queridos jovens, de minha "prisão irmã", reitero: não tenham medo! Ânimo, tenham esperança! 
Alejandro Peña Esclusa
Prisioneiro político
Tradução livre da carta em espanhol publicada em: 

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