segunda-feira, 23 de agosto de 2010

Eurodeputados apelam à comutação da pena de Sakineh Ashtiani

Esquerda.net
Os eurodeputados eleitos pelo Bloco de Esquerda escreveram ao Embaixador do Irão, apelando "à comutação da pena de Sakineh Mohammadi Ashtiani" condenada à morte por “homicídio e adultério” depois de ter sido julgada duas vezes em condições injustas. 

Miguel Portas, Marisa Matias e Rui Tavares, eurodeputados do Grupo da Esquerda Unitária (GUE/NGL) eleitos pelo Bloco de Esquerda, enviaram ao Embaixador do Irão uma carta sobre a situação de Sakineh Mohammadi Ashtiani, mulher iraniana condenada à morte por “homicídio e adultério” depois de ter sido julgada duas vezes em condições injustas, designadamente numa língua que desconhece e sem tradução. “Apelamos à comutação da pena de Sakineh Mohammadi Ashtiani e que esta constitua uma oportunidade para a aplicação de uma moratória sobre a pena capital no seu país”, escrevem os eurodeputados.

Publica-se a seguir, na íntegra, a carta de Miguel Portas, Marisa Matias e Rui Tavares.

Exmo. Senhor Embaixador da República Islâmica do Irão,
Rasool Mohajer,
Nas conversas que temos mantido com vexa pediu-nos que houvesse sempre franqueza e sinceridade entre nós. É por isso que agora lhe escrevemos.

Não podemos deixar de exprimir a nossa profunda indignação ante as notícias de novas execuções iminentes no Irão, em particular a de Sakineh Mohammadi Ashtiani, uma mulher que a “convicção” de três juízes condenou à morte por lapidação. Não podemos ignorar os constantes apelos da família desta cidadã iraniana, obrigada a encarar a morte por um «crime» admitido sob tortura e pelo qual já tinha sido punida com 99 chicotadas, na presença de um filho.

Sakineh Mohammadi Ashtiani não teve direito a um julgamento na sua língua e ouviu a pronúncia em farsi, língua que desconhecia. Do mesmo modo assinou o documento que lhe foi apresentado pelas autoridades e só minutos depois é que as suas co-detidas lhe revelaram o que tinha acabado de ser decidido: apedrejamento até à morte.

Esta não foi a única violação de direitos básicos e elementares. O seu advogado, Mohammad Mostafael e a sua família foram vítimas de repressão e intimidação e encontram-se hoje no exílio, na Noruega. Infelizmente, as autoridades da República Islâmica do Irão nada fizeram para garantir que este advogado pudesse desempenhar o seu dever de defesa em condições de segurança.

Senhor embaixador,
A história milenar do seu país, que tantos exemplos de inteligência e sensibilidade deu à humanidade, não se honra com a persistência da lapidação e da pena de morte, castigos cruéis e inelutáveis que envergonham, aos olhos do mundo, os regimes que os toleram ou promovem.

Não nos compete dizer à República Islâmica do Irão o que ela deve ou não deve fazer - essa é a vossa responsabilidade ante o vosso povo e ante a Humanidade. Mas enquanto cidadãos do mundo e representantes políticos do povo que primeiro colocou uma pedra sobre a pena de morte, apelamos à comutação da pena de Sakineh Mohammadi Ashtiani e que esta constitua uma oportunidade para a aplicação de uma moratória sobre a pena capital no seu país.

Pedimos-lhe que transmita esta mensagem às autoridades iranianas.
Com os melhores cumprimentos,
Miguel Portas, Marisa Matias e Rui Tavares

A história de Sakineh
Sakinheh Mohammadi Ashtiani é uma mulher iraniana azeri viúva, mãe de dois filhos, nascida em 1967 na província do Azerbaijão Oriental. A sua língua materna é o azeri, de raiz turca, não dominando o farsi, a língua dominante no Irão.

Em 2006, quando já estava viúva, foi acusada de “relacionamento ilícito” com dois homens e sentenciada a ser punida com 99 chicotadas, pena a que foi submetida.

Posteriormente, na sequência do julgamento de um dos homens em causa, acusado de envolvimento no assassínio do marido, Sakineh foi novamente julgada por ter alegadamente mantido “relações ilícitas” quando ainda era casada. Foi julgada por “assassínio, homicídio culposo e adultério” e condenada em 2007 à morte por lapidação – apedrejamento até ficar sem vida.

O processo decorreu em situações incompatíveis com os direitos elementares básicos, como têm denunciado os filhos e o advogado, entretanto forçado a exilar-se e a refugiar-se na Noruega devido às ameaças de represálias. Sakineh foi julgada e condenada em língua que não domina, sem a presença de um tradutor; confessou crimes sob pressão e tortura e sem perceber as acusações. Só compreendeu o conteúdo da sentença quando duas companheiras de prisão a informaram.

As condições impróprias do julgamento e condenação têm vindo a ser conhecidas do mundo através de uma campanha de informação promovida pelos dois filhos e que tem o apoio de organizações de defesa dos direitos humanos como a Amnistia Internacional e a Human Rights Watch.

As autoridades do regime de Teerão, incluindo o próprio presidente Ahmedinadjad, consideram as posições internacionais em defesa de Sakineh como uma ingerência nos assuntos internos e, citando o embaixador iraniano no Brasil, uma “intervenção irracional e caracterizada por ter conteúdo político”.

O presidente brasileiro, Lula da Silva, propôs a Teerão acolher Sakineh através da concessão de asilo mas Ahmedinadjad rejeitou. O embaixador iraniano em Brasília declarou à comunicação social que o Irão “prefere exportar tecnologia em vez de gente deste tipo”.

A sentença resulta da aplicação estrita da “sharia”, lei islâmica tal como é interpretada pelo regime confessional xiita da República Islâmica do Irão.

O Supremo Tribunal Iraniano confirmou a sentença. Neste caso só o dirigente supremo iraniano, o ayatollah Ali Khamenei, pode comutar ou revogar a sentença.

A execução de Sakineh esteve marcada para Julho passado mais foi suspensa por um período indeterminado.

O embaixador iraniano em Londres declarou entretanto que “Sakineh não será executada por lapidação”, deixando em aberto um conjunto de outras hipóteses desde a comutação da pena à morte por enforcamento ou fuzilamento.

O advogado da cidadã iraniana revelou na Europa que já existe jurisprudência de comutação de penas por intervenção governamental no Irão pelo menos em sete casos. Segundo informações de fontes diplomáticas iranianas, o processo de Sakineh continua aberto e sobre ele ainda não foi tomada uma decisão final.

Os filhos e o advogado da detida consideram que as aparentes hesitações das autoridades iranianas podem estar relacionadas com os movimentos internacionais de solidariedade. Existem muitas formas de manifestação de apoio e solidariedade com  Sakineh Mohammadi Ashtiani disponíveis na internet através da pesquisa pelo nome. 

Atenção: são deputados de Esquerda!

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