segunda-feira, 25 de outubro de 2010

Ele ainda não entendeu a democracia e deixa uma herança maldita na política

Criação: Cláudio Teixeira


Ainda fazendo alusão aos episódios ocorridos em Campo Grande, no Rio, quando seus amigos e comandados se comportaram como a SA nazista, assaltando uma manifestação tucana e agredindo o candidato José Serra, Lula afirmou ontem num dos palanques da vida: “Nós vamos bater neles nas urnas”, reiterando, contra os fatos, que os tucanos tentaram protagonizar uma farsa para caracterizar o PT como violento. As fotos  do post abaixo não deixam a menor dúvida sobre a ligação do partido com aquela baderna autoritária. Também evidenciam quem é o chefe do bando. Chegaremos a ser uma República?

Em nenhum lugar do mundo democrático um chefe de governo se mete no processo eleitoral com a desenvoltura e a sem-cerimônia de Lula. Essa característica “muito nossa” depõe contra o país. Até nos regimes parlamentaristas, em que o primeiro-ministro está submetido a freqüentes referendos por intermédio das eleições legislativas, o comportamento é mais comedido. A razão é simples: a sociedade não aceita que os assuntos que dizem respeito ao governo e ao estado sejam submetidos, prioritariamente aos interesses partidários. E reage.

Fiquemos na maior democracia presidencialista do mundo, também a democracia mais influente. Bill Clinton exerceu dois mandatos amplamente aprovados pela opinião pública. Al Gore, o candidato democrata, recebeu o apoio possível de um presidente americano. Mas estava claro que era ele o candidato. Na cultura daquele país, a suposição de que o candidato a mandatário não anda pelas próprias pernas, ao contrário de ser um ativo, pode ser eleitoralmente mortal. O contraste com o antecessor, se muito evidente, pode é atrapalhar enormemente o postulante. De certo modo, foi o caso de Al Gore, o insosso.

O mesmo se viu na eleição de Barack Obama. George W. Bush, sabemos, foi um peso para John McCain, personalidade admirada por milhões de americanos. Ainda assim, Bush tinha, se quisesse usar, um arsenal imenso nas mãos para fazer terrorismo eleitoral. Os inimigos que os Estados Unidos enfrentam deixaram um rastro de destruição em solo americano. As alas mais radicais do Partido Republicano questionaram — e isso é próprio da política — a inexperiência de Obama, o pai islâmico, seu real amor pelo país, sua religião, suas opiniões sobre o aborto… Tudo isso, em suma, é mesmo parte do arsenal político em qualquer país do mundo. Mas não o presidente da República. E olhem que Bush apanhou muito nas prévias democratas e depois durante o processo eleitoral propriamente.

Existe uma noção de decoro. Na democracia americana — e nas democracias do mundo inteiro —, perder e ganhar fazem parte do jogo; os derrotados, já escrevi aqui, são tão legítimos quanto os vitoriosos; sem aqueles para reconhecer a validade das regras, não existem esses. Isso significa que as instituições estão acima dos grupos e da vontade dos homens, e agredi-las é considerado algo inaceitável. Mal Obama assumiu a Presidência, os Republicanos deixaram claro que haveria, sim, oposição no país — e há a possibilidade de o presidente perder a Câmara e o Senado na eleição do mês que vem.

Obama sabe o risco que corre — não demora, e ele precisa começar a se articular para o segundo mandato — e se desdobra. Mas ai dele se fugir ao decoro que se espera de um presidente e se ficar caracterizado que usa a Presidência para beneficiar seu partido e a si mesmo! A própria imprensa do país, mesmo a liberal (que lá quer dizer “democrata”), recusa o expediente e cai de pau naquele que se atrever a macular a instituição.

No Brasil, Lula avança sempre um pouquinho mais, demonizando seus adversários, deslegitimando-os como forças autenticadoras do processo democrático, caracterizando-os não como pessoas que têm respostas erradas ou ineficazes para os problemas do Brasil e dos brasileiros (isso seria próprio da política), mas como agentes de um suposto retrocesso social e político. Para tanto, nem a mentira descarada lhe é um terreno vedado. Ao contrário: um dos pilares da campanha petista, hoje, é a falácia de que a disputa se dá entre privatistas e antiprivatistas. Sem limites, atribui a seus adversários intenções que eles claramente não têm.

Setores da sociedade brasileira que deveriam ser os principais procuradores da ordem democrática e de seu decoro se mostram pouco preparados para a tarefa — com as exceções de sempre. Nesse caso, refiro-me à imprensa mesmo. A “cultura das ditaduras” ainda pauta as mentalidades. Vivemos sob os efeitos da tal “luta contra o regime militar”, de que o PT, mas não só ele, foi personagem. O partido passou a ser a encarnação do padrão democrático — o que é uma piada grotesca — em oposição à “ditadura”, e poucos se deram e se dão conta do viés autoritário e antidemocrático do próprio partido. Nota à margem: pouco importa a idade da garotada; refiro-me é a uma mentalidade que se plasmou.

Ao longo do tempo, a agenda do petismo pode ser acusada de qualquer coisa, menos de apreço declarado pela democracia representativa — que, evidentemente, é incompatível com as esquerdas. Boa parte da nossa imprensa não tem o DNA das liberdades públicas, das liberdades individuais, da cultura institucional, da impessoalidade do estado. Ao contrário até: assim como se admite e se acha até correto que se possam transgredir leis para fazer “justiça social”, admite-se que se possam fraudar até mesmo certas regras básicas do jornalismo para fazer justiça com o próprio teclado. Mas deixo esse particular para outra hora. O que interessa é apontar, em muitos casos, a quase cumplicidade dessa ala do jornalismo com cesarismo verde-amarelo de Luiz Inácio da Silva.

A reação aos descalabros que este senhor tem protagonizado nos palanques é fria, dado o agravo feito à ordem democrática, às instituições e ao decoro. O agente do ódio na disputa eleitoral se chama  hoje Luiz Inácio Lula da Silva, o que, já escrevi aqui, trará dificuldades a seu sucessor — seja Dilma, seja Serra. O discurso político do Lula dos palanques se parece muito mais com aquele Lula de 1989 — que, felizmente, não chegou ao poder. E ele próprio diz hoje dar graças a Deus porque, de fato, não estava preparado.

Que herança e que mensagem deixa Lula? Levadas em conta as suas palavras, a democracia só é legítima se o PT vence as eleições. A política comporta mesmo tolices como essas. Mas tal visão de mundo é inaceitável num presidente da República que chegou ao poder por meio das urnas e que agora usa a máquina do estado para que as urnas confessem o que ele quer ouvir.
Título e Texto: Reinaldo Azevedo, 25-10-2010

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