quarta-feira, 24 de novembro de 2010

Patrulha inútil! Não vou parar!

Quando certo blogueiro lulista recomendou aos coleguinhas que fizessem reportagens para encontrar os 3% que achavam o governo ruim ou péssimo, entendi que ele sintetizava o espírito de um tempo: se havia pessoas descontentes com o governo, isso seria tão absurdo que urgia saber quem eram e quais os seus motivos. Se não podiam lhes abrir a cabeça para fatiar o cérebro e saber onde se alojava o antilulismo, que ao menos fossem social e politicamente dissecadas. Foi então que sugeri que o lulo-petismo, identificadas tais pessoas, as obrigasse a andar com um uniforme listrado e um triângulo roxo, típico dos que não aderem ao regime por objeção de consciência.
Comecei a militar num grupo trotskista ainda no governo Geisel, tinha de 14 para 15 anos. Depois veio a ditadura meio esculhambada de Figueiredo, abertura, Sarney etc. No fim do regime militar, a barra ainda pesava, e se sentia muito medo. A democracia trouxe a sensação, que correspondia à realidade, de liberdade. E eu fiquei viciado nesse negócio. A suposição, nos limites da Constituição, de que alguém tente me impedir de dizer o que acho que tem de ser dito, desperta o capeta em mim. Nunca, do governo Sarney para cá, houve um clima de caça às bruxas como o que se vive agora. Com uma diferença: se, durante o regime militar, as ameaças à liberdade vinham de órgãos do estado, agora, os tiranetes de quarteirão, espalhados em todo canto, inclusive nas redações, ousam criar uma espécie de index do que pode e do que não se pode escrever. Os “tolerantes” chegaram ao poder e descobriram que esse negócio de democracia é bacana desde que as pessoas digam as coisas certas.

Os argumentos perdem sentido, tornam-se inúteis. Desde que se tenha uma “boa causa”, considerada correta, que se danem os números, a lógica e os fatos. A matemática pode ser declarada um instrumento da reação caso ela se negue a endossar a reivindicação militante. E aqueles que ousam dissentir tornam-se alvos da satanização. Se o movimento a favor do aborto, por exemplo, usa estatísticas vigaristas para defender a sua causa, ai de você se demonstrar, como fiz, que os números são fajutos porque desmoralizados até pela taxa de natalidade do país. Em vez de voltarem à prancheta para verificar se sua causa se sustenta com dados verdadeiros — ou, então, que defendam a sua tese dispensando os números —, passam a ofendê-lo como o “reacionário” do Opus Dei (ao qual não pertenço e, se pertencesse, diria porque não haveria nada de errado nisso), interessado, como dizem, em “impor a sua pauta católica”. Não quero impor nada. Mas me pergunto por que eu, católico, não posso defender o meu peixe se eles, os não-católicos, podem vender  seu. “Porque o estado é leigo”, logo responde o esquerdistazinho excitado, achando que me pegou. Leigo, mas não ateu. E, enquanto as religiões não forem proscritas, os cristãos hão de se manifestar em igualdade de condições com ateus e agnósticos.
Anteontem, escrevi aqui um texto contra a tal PL 122, que chamei de “AI-5 gay”. Deixei claro, inclusive, o que penso sobre união civil de homossexuais e adoção de crianças — ambas, acho, aceitáveis, guardadas certas condições. O que as pessoas fazem na cama não me interessa. Mas não é possível condescender com uma lei que viola a liberdade de expressão e a liberdade religiosa, incorporando, com demonstrei, a linguagem militante e mandando às favas o estado de direito sob o pretexto de proteger os gays. Pra quê!? Foi um deus-nos-acuda!  Houve quem achasse por bem, em nome das liberdades democráticas, pedir a minha cabeça para a VEJA. Afinal, vocês sabem, essa gente não pode conviver com um sujeito como eu, que não respeita a liberdade alheia…
Como as minhas ousadias e provocações não têm limites, ousei dizer que o papa não mudou de opinião em relação à camisinha e que tratou do assunto como o mal menor, expressão, diga-se — dêem aqui o mérito para este servo de vocês, hehe — , que o porta-voz do Vaticano empregou nesta terça-feira. Chamei a atenção para aquela que é posição da Igreja nessa questão: o método mais eficaz contra a transmissão do vírus pela via sexual é a responsabilidade individual. Uma integrante do programa da ONU de combate à Aids na África, não consegui saber a nacionalidade, afirmou:  ”Vai ajudar bastante, mas poderia ter prevenido muitas infecções se fossem divulgadas antes”. Ela está mentindo. Quem deixou de usar camisinha seguindo, supostamente, orientação da Igreja, que nunca disse para não usar, deveria ter sido obediente à real orientação da Santa Madre: abstinência e fidelidade. E, de novo, lá veio a avalanche! Até parece que as pessoas contraem Aids fazendo o que o papa recomenda! Não contraem! Fosse sua orientação moral um método, seria 100% seguro — um índice certamente superior ao da camisinha… Mas isso não pode ser dito.
Em meu supremo atrevimento, tenho ousado contestar o “milagre” da segurança pública de Sérgio Cabral, aquele que supostamente vai tomando territórios ocupados pelo narcotráfico sem dar um tiro e sem prender bandidos. Método inédito no Brasil e no mundo. Como sabem, não esperei a onda de violência para afirmar que estávamos diante de uma “mistificação”, e o blog logo se encheu de “especialistas” furiosos sustentando que um reaça como eu gosta de ver cadeias lotadas; que não percebo a ineficácia das prisões; que o Brasil prende demais ou sei lá o quê. Ignoro o que quer dizer “muito” nesse caso. Sei que São Paulo, com 22% da população, tem quase 40% dos presos, e o índice de homicídios no estado, mesmo tendo algumas das maiores cidades do país (inclusive a maior), é de 9 por 100 mil habitantes, número considerado aceitável pela Organização Mundial da Saúde. O do Rio, que prende muito menos, é o quádruplo. Uma coisa é pacificar o narcotráfico, outra é combatê-lo. Já escrevi bastante a respeito e não vou me repetir. O que nunca ficou muito claro para mim é por que não prender é mais justo e humano do que prender. Para quem? É claro que eu acho que os bandidos também têm direitos — eles só não têm direito de ser bandidos. Por isso têm de ser afastados do convício social. Essa tese é assim tão esquisita? E para encerrar essa passagem: “São Paulo tem menos homicídios por outros motivos”, dirá alguém. Pode ser. Primeiro o Rio (e também a Bahia, Pernambuco…) põe os seus bandidos na cadeia. Aí a gente vê.
O que me impressiona em todos esses casos é que a turma da gritaria não se ocupa minimamente em  contestar argumentos, dados, informações, nada! Tenta-se resolver a coisa pelo caminho da estupefação: “Como você pode dizer isso?” Ou ainda: “Olhem só o que ele disse! Que absurdo!” Ora, se não posso “dizer isso” porque falso, então digam a verdade; se a tese é absurda, então mostrem o que não é. Xingar, vituperar, espernear, fazer correntes na internet, tudo isso é inútil. Esse tipo de adversidade até me anima a encontrar novos consensos furados.
E, finalmente, há o lado jocoso nessa história, embora emblemático: contestar Chico Buarque é proibido, ainda que ninguém se atreva a escrever um texto de alcance acadêmico, técnico que fosse, demonstrando por que estamos diante de um autor de ficção como há muito o Brasil não vê: autor de quatro romances, ganhou três Jabutis. Só  um “conservador” como eu para contestar. “Eles” não contam para ninguém por que o sambista é um grande romancista, mas eu deveria ser impedido de dizer por que não é.
Um recado aos que gostam e aos que não gostam do que lêem aqui: não vou parar! Sempre que esses consensos fajutos botarem jabutis em árvores ou na mão do Chico Buarque, eu vou estranhar: “Jabuti não sobe em árvores! Chico não escreve romances!” E percorrerei com muito gosto a trilha da divergência. Ademais, as urnas deixaram claro: a divergência reúne bem mais do que 3%, não é mesmo?
Reinaldo Azevedo

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