domingo, 5 de dezembro de 2010

Cabral vê um Picasso em Lula: “O maior, o melhor, o mais extraordinário!”

Em algum momento, escrevi neste blog que a personagem da política brasileira mais parecida com Lula é Sérgio Cabral (PMDB), governador do Rio, comparação que certamente há de deixá-lo bastante feliz. Pertencem a gerações distintas, não são do mesmo partido, não têm a mesma origem social, nada… Mas exibem características comuns que têm rendido a ambos bons dividendos políticos: falam rigorosamente o que lhes dá na telha sem temer o ridículo; conseguem transformar em sucessos de público mesmo os seus mais clamorosos desastres; se preciso, descem a rampa do populismo; na adversidade, atacam os adversários com impressionante rapidez e, last but not least, são amados por amplos setores da imprensa até mesmo quando se dedicam a evoluções circenses.
Cabral tem afirmado que, encerrado o próximo mandato, pretende se aposentar. Aos 51 anos? Duvido! Só mesmo se a soma de narcotráfico e milícias derrubá-lo. Mas já se decretou que tudo “dará certo”. De um jeito ou de outro! Cabral  conclui seu segundo mandato no ano da Copa do Mundo. Deve ser posto na lista dos presidenciáveis. Mas vamos ao caso.
O Ministério da Cultura realizou ontem a 16ª cerimônia de entrega da Ordem do Mérito Cultural a personalidades, instituições e grupos que tenham colaborado com o setor. A cerimônia ocorreu no Teatro Municipal.  Cabral e Lula discursaram. O governador do Rio foi de uma espantosa ousadia: a despeito dos 90 anos que há pela frente, ele elegeu Lula o ” Estadista do Século”. Leiam a sua fala:
“Não tenho a menor dúvida de que estamos diante dessas coisas que ocorrem raramente, é um privilégio nosso estar aqui encerrando oito anos [de governo Lula]. São aquelas personalidades que, no esporte, por exemplo, aconteceu (sic) com o Pelé: quem viu, viu, quem não viu tem o DVD. O Picasso também. Nós temos, diante de nós, o maior, o melhor, o mais extraordinário… Não sei se daqui a cem ou duzentos anos produziremos outro igual: o presidente Lula.”

Pablo Picasso, 1881-1973

A platéia, composta de artistas, intelectuais e celebridades — cada vez mais, esses grupos se confundem: são todos “amigos dos amigos” — veio abaixo, num aplauso entusiasmado. Luiz Inácio, em breve, passará a falar de Lula na terceira pessoa, como o Edson se referindo a Pelé. Ainda visitaremos museus com a obra do Grande Mestre: “Aqui, a fase vermelha, lá em São Bernardo. A Fase Azul começou quando ele surrupiou o software do governo FHC.” Cabral, evidentemente, não sabe o que diz. Pode até conhecer Lula, mas certamente tem um juízo bastante prejudicado sobre Pelé e Picasso… É bem verdade que Lula, ele mesmo, já se comparou a Jesus Cristo…
É ocioso especular sobre os motivos de tanta gratidão. Lula também discursou. Lembrou do convite que recebeu de Jacques Chirac para participar da reunião do G-8, em 2003. E contou esta história pela enésima vez:
“Era a primeira vez que um presidente do Brasil iria participar do G-8. E eu cheguei em Evian, a cidade toda cercada de arame farpado. Eu não sei por que o G-8, que é tão importante, eles se acham tão bons, é obrigado a fazer reuniões tão cercadas. Quase num passe de mágica, todo mundo se levantou quando o Bush chegou. Eu peguei no braço do Celso Amorim e falei, ‘Nós não vamos levantar’. Não era orgulho, não! É que ninguém tinha levantado quando eu entrei”.
Os artistas, intelectuais e celebridades da platéia, os amigos dos amigos, caíram na gargalhada, e irrompeu-se uma estrepitosa salva de palmas. Lula realizava vicariamente o desejo de muitos ali: demonstrar altivez diante dos EUA — menos na hora de fazer compras em Nova York… E Não seria Lula se não sobrassem farpas para a imprensa: “Voltei para o Brasil com alívio e sensação de ter vencido, porque a imprensa brasileira se preocupava com o fato de eu não falar inglês e pensei: passei no primeiro teste, não preciso falar inglês para governar o Brasil”.
Mais palmas!
Nota: essa história de que a imprensa se preocupava porque Lula não sabia falar inglês é uma das fantasias que ele criou para, fazendo praça da própria ignorância, mostrar-se superior. Até parece que foi o primeiro presidente brasileiro a não dominar um outro idioma… Mal se dá conta de que ele é a regra; FHC estava entre as exceções. Lula também deu a receita do seu sucesso:
“O óbvio é a única coisa que um governante tem que fazer. Inventar é para cientista. Não é para governo. O governo faz, realiza”.
Certo! No caso, o óbvio consistiu em dar seqüência à obra do antecessor, desqualificando o seu trabalho e se dizendo arauto de uma nova aurora.
Nem  Pelé foi tão longe! Nunca declarou ter reinventado o futebol.
Nem Picasso foi tão arrogante! Nunca declarou ter reinventado a pintura!
Os rivais de Lula não são dessa esfera. Por isso ele chamou, certa feita, a Terra de “planetinha”…
Reinaldo Azevedo

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