quarta-feira, 23 de março de 2011

O anacronismo (e o caradurismo) dos "movimentos sociais" brasileiros

Militantes, “go home”
Qualquer um tem o direito de ser contra os EUA, mas não há nada mais ridículo que o ato anti-Obama

Foto: Ana Carolina Fernandes/UOL
Ruth de Aquino
Nada mais ridículo que a convocação de uma manifestação na Cinelândia, centro do Rio de Janeiro, “em repúdio” à primeira visita de Barack Obama ao Brasil. Quem convocou foram os “movimentos sociais”. Leia-se CUT, MST, UNE e vários outros grupos com complexo de minoria colonizada. “Obama é persona non grata”, dizia o texto, endossado por líderes do PT. A presidente Dilma Rousseff se irritou e enquadrou a militância petista. O governador do Rio, Sérgio Cabral, perguntou: “O que é isso? Piraram?”.
Não é o protesto em si que incomoda. Qualquer um tem direito de ser contra os Estados Unidos e seu presidente, mesmo que ele não seja mais George W. Bush. Mas o texto dos sindicalistas petistas é pretensioso e ultrapassado: “Os movimentos sociais brasileiros rechaçam a presença de Obama em nosso país”. Com que autoridade essas organizações se intitulam representantes do povo brasileiro?
As 11 entidades que assinam a convocação acusam Obama de “manter a orientação belicista de ocupar países e agredir povos em nome da ‘luta ao terrorismo’”. Trata-se de uma defesa velada da autonomia da Líbia e de seu ditador, Muammar Khadafi, há 42 anos no poder. Continua assim a convocação: “Obama chega ao Brasil num momento em que os EUA e seus aliados, principalmente os europeus, preparam-se, sob falsos pretextos, para perpetrar novas intervenções militares... e assegurar o domínio sobre o petróleo”.

Esta é a primeira visita do presidente Obama à América Latina. Vem acompanhado da mulher, Michelle, e das filhas, Sasha e Malia. Não perceber as diferenças entre Obama e Bush e continuar com o discurso anti-imperialista é aprisionar-se ao passado e ir contra os interesses do país. No almoço previsto para este sábado no Itamaraty, em homenagem ao convidado, dificilmente alguém sentirá a ausência da Central de Trabalhadores do Brasil, ligada ao PCdoB. Eles alegaram “incompatibilidade ideológica” para recusar o convite ao almoço.
O Brasil pode não conseguir nada com a visita de Obama. Nem acordos comerciais vantajosos nem um gesto de boa vontade dos Estados Unidos à pretensão brasileira de um assento permanente no Conselho de Segurança da ONU. Mas Dilma está empenhada numa reaproximação Norte-Sul. E Obama sabe que vai encontrar uma líder que não posará rindo e aos abraços com o apedrejador de direitos humanos Mahmoud Ahmadinejad.
Qualquer um tem o direito de ser contra os EUA, mas não há nada mais ridículo que o ato anti-Obama
Os militantes enraivecidos com Obama devem ser os mesmos que aplaudiram a aproximação entre o Brasil “do cara” e a ditadura do Irã, sob o argumento do pragmatismo. Não irão jamais às ruas protestar contra Khadafi, que massacra quem discorda. São os mesmos que idolatram o fanfarrão do Chávez e defendem qualquer regime autocrático e populista latino-americano, desde que seja contra os ianques.
Entre eles está o secretário de Movimentos Populares do PT-RJ, Indalécio Wanderley Silva. Ele enviou e-mails convocando para o protesto anti-Obama, e foi a uma reunião no Sindicato dos Petroleiros do Rio. Indalécio é filiado a um diretório presidido até o ano passado pelo ministro de Relações Institucionais, Luiz Sérgio, articulador político de Dilma. Aí começa o constrangimento da presidente, comandante máxima do país e integrante do Partido dos Trabalhadores. Imediatamente, o PT do Rio desautorizou qualquer protesto, “em nome de toda a Executiva Partidária”.
O mundo das patrulhas ideológicas é muito chato. Convicções se tornam dogmas. Há um ranço nesses grupos que cheira a mofo e não tem mais lugar em nosso país. Militante de esquerda se parece demais com militante de direita. Na Europa, especialmente na França, comunistas desiludidos acabam aderindo a candidatos de extrema direita, racistas, moralistas e xenófobos. Entoam palavras de ordem nacionalistas. Temem por seus empregos e por isso odeiam imigrantes.
O mesmo pode-se dizer dos radicais sociais: são chatos os militantes gays, as militantes feministas, os militantes afrodescendentes, os militantes religiosos, os militantes intelectuais. Não escutam nem debatem, só protestam ou aclamam. Please, go home!
Ruth de Aquino, revista Época, edição nº 670, 19-03-2011
Título: JP

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