sábado, 2 de julho de 2011

A Presidente (Ou: A diferença entre dicionaristas e filólogos)

Imagem: SOL

Margarida Davim
Assunção Esteves é a nova presidente da Assembleia da República. Dilma Rousseff é a ‘presidenta’ do Brasil. A confusão está instalada, desde que há cada vez mais mulheres em cargos de poder: afinal, diz-se ‘a presidente’ ou ‘a presidenta’? 
«De acordo com a norma culta do Português, diz-se ‘a presidente’», esclarece Margarita Correia do ILTEC (Instituto de Linguística Teórica e Computacional). «Segundo a gramática, palavras acabadas em ‘ente’ são invariáveis». Ou seja, é por isso que ‘adolescente’, ‘comerciante’ ou ‘confidente’ não têm masculino e feminino, mas apenas uma forma para ambos os géneros.
A explicação não impede que ‘presidenta’ figure em vários dicionários. «Até nos mais antigos», frisa José Mário Costa, do site Ciberdúvidas. «É inaceitável dizer que ‘presidenta’ não é Português», defende.
Margarita Correia, que não gosta de ser chamada ‘presidenta’ do ILTEC, dá-lhe razão. «É uma forma popular», esclarece, lembrando outros vocábulos usados pelo povo como ‘parenta’ ou ‘estudanta’, «normalmente com conotação depreciativa».
A linguista lembra que «no Brasil, os jornais de referência chamam ‘presidente’ a Dilma, enquanto os mais populares optam por ‘presidenta’». De resto, é assim que a chefe do Governo brasileiro faz questão de ser chamada e é como ‘presidenta’ que é apresentada no site oficial da Presidência do Brasil.

E se fosse ‘o jornalisto’?
Não está sozinha na defesa desta palavra. Pilar del Río insiste em que lhe chamem «presidenta da Fundação Saramago». E, no documentário José e Pilar, mostra-se indignada com quem insiste em não reconhecer a palavra como Português correcto.
Como a Língua está em constante mudança, Margarita Correia acredita que «o uso pode fazer com que a gramática mude» e ‘presidenta’ passe a ser a forma corrente. Tal como aconteceu a ‘juíza’ – uma palavra que ainda hoje não é usada na Universidade de Coimbra, onde se prefere dizer ‘a juiz’.
José Mário Costa acha mesmo que o facto de «alguém com a importância de Dilma querer usar a palavra ‘presidenta’ pode fazer norma».
Mas o argumento não convence a professora Regina Rocha. «A evolução da Língua pauta-se por normas», frisa, sublinhando que «não deverá passar a considerar-se correcto um termo ou uma construção apenas porque alguém com poder social ou político lhe tenta conferir essa qualidade». Regina Rocha já confessou no Ciberdúvidas achar «ridículo» querer impor este termo. «Que diríamos se os homens reivindicassem para si a designação de ‘o maquinisto’ , o ‘astronauto’ ou o ‘jornalisto’?». 
Mas a polémica é levada muito a sério em países como a Suécia, onde uma escola afastou o uso do masculino e o feminino para evitar interferências de estereótipos sexuais no desenvolvimento das crianças. A estratégia é usar um pronome neutro, que em Português não existe.
Por cá, as dúvidas, acredita José Mário Costa, poderiam ser desfeitas mais facilmente «se houvesse em Portugal uma autoridade que normalizasse as novas palavras» à semelhança do que faz a Fundação para a Língua Espanhola.
Margarida Davim, SOL, 01-07-2011
margarida.davim@sol.pt

Dona Pilar, por favor, cuide do castelhano!
Veja este programa da RTP1, da série "Cuidado com a língua!"sobre presidente

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