quinta-feira, 26 de abril de 2012

O princípio da História

Nos anos 90 e princípio do século XXI, a Europa transbordava de optimismo. A vitória sobre o comunismo, o euro, a riqueza, a “sensibilidade social” eram outros tantos sinais de uma superioridade que tinha por inequívoca.
Luciano Amaral
A Europa desse tempo era o fim da História. Nem sequer a América tinha lições para dar, com a barbárie da pena de morte, do porte de armas, da falta do "Estado Social" e a vontade de ir para a guerra em todo o lado. Não só o desenvolvimento económico e social a colocava acima de todos como também o fazia o "poder macio" (‘soft power'). Toda a gente devia ser como a Europa. Neste mundo europeu, não havia lugar para guerras. A Europa era a compreensão de tudo. Tudo cabia na Europa "humanista", "social" e próspera.

Satisfeita com o fim da História, a Europa não via que ela estava apenas a começar noutros lados. A nacionalização pela Argentina da empresa petrolífera YPF, expropriando a espanhola Repsol, não é uma mera história de petróleos, nem sequer de direitos de propriedade. Trata-se do mais recente episódio de uma ofensiva "anti-colonial" que a "presidenta" Cristina Kirchner vem desenvolvendo e que teve a sua afirmação mais espectacular no regresso à reclamação da soberania sobre as ilhas Falkland (perdidas para a Inglaterra em 1833). Ouvir a retórica anti-colonial de Kirchner remete-nos para um tempo de que os europeus já não se lembravam. Pouco importa que Kirchner (de origem alemã e espanhola) e a própria Argentina sejam dos melhores exemplos do colonialismo europeu (que massacrou os verdadeiros argentinos originais, os índios de que lá há poucos vestígios actualmente). Importa que o nacionalismo da América do Sul não é apenas anti-americano, é também anti-europeu. E importa mais ainda que a Europa não sabe lidar com isto: porquê atacar quem só quer a paz, quem só quer um mundo de harmonia entre os povos?
Claro que estamos aqui de regresso a uma velha história argentina, a do peronismo, essa espécie de fascismo social e sindical que se afirmou contra os banqueiros, os fazendeiros e os ingleses (nem que fosse apoiando a Alemanha nazi). Cristina Kirchner não perde uma oportunidade para aparecer enquadrada com imagens de Evita Perón. Mas a Europa olha estupefacta. Noutros tempos talvez a Espanha enviasse uma expedição punitiva. Hoje, não consegue garantir um mínimo de protecção dos direitos de propriedade dos seus investidores ou uma condenação efectiva da Europa, essa entidade que pura e simplesmente não sabe o que fazer consigo própria.
Era o fim da História, não era? Afinal parece que está tudo apenas a começar.
Título e Texto: Luciano Amaral, Professor Universitário, Diário Económico, 26-04-2012

Relacionados:

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Não publicamos comentários de anônimos/desconhecidos.

Por favor, se optar por "Anônimo", escreva o seu nome no final do comentário.

Não use CAIXA ALTA, (Não grite!), isto é, não escreva tudo em maiúsculas, escreva normalmente. Obrigado pela sua participação!
Volte sempre!
Abraços./-