Só esta semana, o Governo tentou fazer quatro
tipos de cortes na despesa que poderiam evitar subidas de impostos: todas foram
recebidas com uma oposição feroz. Veja porque é que o País não quer mudar
Editorial, Sábado
A mobilidade dos médicos
O Governo, naturalmente, não pode mexer nas
condições de trabalho dos médicos. Quando esta semana se soube que eles iriam
passar a ter de prestar serviço em vários hospitais, os sindicatos percorreram
o habitual caminho da retórica anti mudanças. Primeiro, acusaram o Governo de
ser ignorante: “Revela o mais absoluto desconhecimento das exigências técnicas
do que é a atividade médica, do que é o trabalho em equipa e da penosidade do
trabalho em serviço de urgência.” Depois, lembraram que a prioridade é o
dinheiro: “Sempre dissemos que estas matérias só iriam ser negociadas depois de
fechada a negociação das grelhas salariais.” A seguir, tentaram desqualificar
as medidas: “É um atrevimento. (…) Não percebemos como é que o Governo se
atreve a fazer isto.” Por fim, recorreram ao sentimentalismo: lamentaram que o
Ministério da Saúde estivesse a mostrar “insensibilidade social”. O Sistema
Nacional de Saúde representa uma parte significativa da despesa do Estado, mas,
como se vê, se depender dos médicos nada pode mudar.
Professores dispensados
Na terça-feira passada, o Governo anunciou um
objetivo modesto: construir a escola pública “na justa medida das
necessidades”. Traduzindo: contratar apenas os professores necessários para o
número de alunos inscritos. E este ano são necessários menos 5.147 professores
do que no ano passado. É claro que, para os sindicatos, isto representa uma
medida inaceitável. E a Fenprof já prometeu fazer uma manifestação sempre que
um governante sair à rua. O que para os portugueses é apenas uma forma de
poupar o dinheiro dos contribuintes para a Fenprof é um “ataque à escola
pública”.
Salários da função pública
O Governo começou esta semana a negociação com os
sindicatos sobre os salários da Função Pública. Para início da conversa, o
líder de um deles explicou logo que, em sua opinião, está a lidar com
incompetentes: os ministros são “um grupo de pessoas sem experiência
governativa” que tem produzido uma “diarreia legislativa”. Depois de isto estar
esclarecido, vieram as exigências dos sindicatos, feitas, lembre-se, numa
altura em que o País continua perto da bancarrota. Por ordem crescente de
loucura, é assim: a Federação Nacional dos Sindicatos da Função Pública quer
aumentos entre 2% e3%; a Frente Sindical exige “a reposição dos níveis
remuneratórios de 2010” e uma subida do subsídio de refeição de 4,27 para 5
euros; e a Frente Comum de Sindicatos da Administração Pública reclama (respire
fundo, isto vai demorar a ler) um aumento de 47 euros por trabalhador, um
aumento do subsídio de refeição para 6,5 euros, a reposição dos cortes
salariais feitos nos últimos dois anos e o regresso dos subsídios de férias e
de Natal. Quer dizer: não é só não poder haver cortes nas despesas – tem de
haver mais despesa ainda.
Menos funcionários públicos
Em Portugal há 605 mil funcionários públicos. Mais
85 mil contratados a prazo. Mais 109 mil trabalhadores no setor empresarial do
Estado. No total, são cerca de 800 mil pessoas a quem os contribuintes pagam o
ordenado todos os meses – ou um sétimo da população ativa do País. Posto isto,
e estando Portugal tecnicamente falido, os portugueses estão à procura da
melhor forma de cortar alguns destes funcionários, certo? Errado. Alguns minutos
depois de o Governo ter anunciado que pretende dispensar todos os trabalhadores
com contrato a prazo – segundo a Constituição, os do quadro não podem ser
despedidos – para tentar evitar uma nova subida de impostos, os sindicatos
juntaram-se para explicar o crime que isso representaria. A medida começou por
ser “preocupante”, passou a provocar a “degradação dos serviços públicos” e
finalmente acabou por se tornar “brutal”. Para os sindicatos, o objetivo é
manter a despesa do Estado e baixar os impostos. Só falta descobrir de onde
virá o dinheiro.
Texto: Editorial, Sábado, nº 438, de 20 a 26-9-2012
Edição: JP
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Não publicamos comentários de anônimos/desconhecidos.
Por favor, se optar por "Anônimo", escreva o seu nome no final do comentário.
Não use CAIXA ALTA, (Não grite!), isto é, não escreva tudo em maiúsculas, escreva normalmente. Obrigado pela sua participação!
Volte sempre!
Abraços./-