quinta-feira, 29 de novembro de 2012

O primeiro negro da suprema corte brasileira

Márvio dos Anjos 

Em sua posse na Presidência do Supremo Tribunal Federal do Brasil, a mais alta corte do Brasil, o juiz Joaquim Barbosa, negro de pele, pontuou na última quinta que a Justiça é indissociável da cultura.

Inegável. O conceito de Justiça muda conforme os avanços da sociedade, da ciência e dos desejos de uma coletividade. À época dos descobrimentos, por exemplo, a Igreja Católica autorizava a escravidão dos negros pelos colonizadores ibéricos. O Iluminismo, a relativização do papel da Igreja e a constante secularização da sociedade nos levaram à conclusão de que toda condição de escravo era um dos máximos fracassos da civilização – que nós brasileiros mantivemos por 66 anos, ainda que já independentes de Portugal.

Com dificuldade, o Brasil tenta se tornar uma sociedade mais justa, mas ainda falta educação. Pesquisa encomendada à consultoria britânica EIU nos pôs em penúltimo lugar numa lista de 40 países por qualidade de educação. Atrás de nós, somente a Indonésia. Esse índice é puxado para baixo pelas escolas públicas, que mal conseguem alfabetizar nossas crianças.

Por outro lado, temos 1.240 escolas para essa formação, contra 1.100 do resto do mundo inteiro, segundo dados do Conselho Nacional de Justiça. Esse emaranhando, fruto de anos e anos de exigência de diploma de Direito para funcionalismo público, não nos fez um país mais justo, nem cidadãos mais conscientes do que podemos e devemos fazer, nem nossa Justiça mais rápida. Apenas enriqueceu empresários do setor de diplomas.

Levamos assim 124 anos desde a abolição dos escravos até vermos um negro chegar ao mais alto posto da Justiça brasileira. Um homem de 58 anos, filho de um pedreiro, que estudou a duras penas e conseguiu, por méritos próprios, formar-se em Direito e doutorar-se em Paris.

É fácil santificá-lo, e isso é fruto de um olhar condescendente com o elemento negro, assim como é fácil usá-lo para reforçar que o Brasil é uma democracia racial resolvida, o que tampouco somos. Joaquim é no máximo um sintoma de que o Brasil não proíbe o negro de chegar aos seus sonhos. O juiz teve acesso aos livros e às instituições e as aproveitou bem. Ao louvar a cultura, e não as cadeiras da escola de Direito, disse-nos um óbvio que tanto relutamos em praticar: não há Justiça onde há ignorância.
Título e Texto: Márvio dos Anjos, Destak, 28-11-2012

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Não publicamos comentários de anônimos/desconhecidos.

Por favor, se optar por "Anônimo", escreva o seu nome no final do comentário.

Não use CAIXA ALTA, (Não grite!), isto é, não escreva tudo em maiúsculas, escreva normalmente. Obrigado pela sua participação!
Volte sempre!
Abraços./-