Paulo Lopes Marcelo
Francisco Louçã deixou no
Sábado a liderança do partido que ajudou a fundar há treze anos. Este
afastamento vai suscitar os habituais elogios politicamente correctos.
Não contem comigo para esse
peditório. A deferência pela extrema-esquerda é uma das singularidades
nacionais. Com excepção da Grécia (Syriza), em mais nenhum país da europa
ocidental, os partidos de esquerda radical (PCP e BE) têm uma popularidade tão
elevada, perto dos 20%, a acreditar nas últimas sondagens. Dá que pensar.
Louçã é o exemplo acabado do
demagogo radical. A sua inteligência e verbo inflamado ajudam a disfarçar o
populismo que o levou, várias vezes, a distorcer factos em nome do melhor
‘sound bite' parlamentar. Por detrás de uma aparente modernidade, Louçã é um
comunista não assumido. A sua visão do mundo é marxista, a que soma a
"revolução permanente" do trotskismo, onde o jargão ideológico é
substituído por uma linguagem não menos maniqueísta e fracturante, que separa
os "nossos" dos "outros", genericamente classificados de
ricos, corruptos ou hipócritas.
Com o fracasso do socialismo
real, a esquerda tenta encontrar novas causas, desde antiamericanismo, à luta
contra a família dita ‘tradicional' e, mais recentemente, o combate à
austeridade atribuída à ‘troika', como se uma pior austeridade não tivesse
emergido em todos os países que levaram à prática o seu ideal igualitário. Mas
este tacticismo ideológico não esconde alguns paradoxos: como defender o
socialismo e a propriedade privada; proibir o despedimento em empresas
lucrativas mas dizer que se respeita a liberdade empresarial; ou falar de
direitos humanos e laicismo ao mesmo tempo que se apoia o Hizbolah, o braço
armado do Irão. Só a cumplicidade de certos jornalistas permite disfarçar estas
incoerências debaixo de uma capa de modernidade.
Sem esquecer o radicalismo que
tem levado o Bloco a rejeitar qualquer tipo de coligações, mesmo à esquerda, ou
a recusar reuniões com a ‘Troika' na primavera de 2011. Os mesmos tiques
autoritários vieram agora ao de cima no processo de sucessão de Louçã. Nos
partidos democráticos os dirigentes são eleitos e não nomeados. Em vez de se
afastar, permitindo um debate e renovação depois do BE ter perdido metade dos
deputados nas legislativas, Louçã não resistiu a sugerir os seus sucessores
naturais, num modelo bicéfalo que vai enfraquecer a liderança até ao regresso
do fundador e líder natural. Depois do mau resultado de Manuel Alegre, desta
vez será o próprio Louçã a avançar para as presidenciais. Só isso explica este
precoce afastamento de um partido feito à sua imagem e que aguardará
ansiosamente o seu regresso.
Título e Texto: Paulo Lopes Marcelo, Diário Económico, 13-11-2012
Grifos: JP
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