quinta-feira, 22 de novembro de 2012

O retrato incompleto de Pedro Passos Coelho

Teresa de Sousa

A História ainda pode ser generosa com ele, se a história desta crise acabar bem e não demasiado tarde. Mas também pode vir a ser implacável. Hoje já menos gente se atreve a subestimá-lo. Para este retrato, todas as perguntas são legítimas. As respostas são ainda muito incompletas.

Foto: Rui Gaudêncio/Público
No fim da tarde, o Palácio de São Bento está silencioso e tranquilo. Reina a ordem no seu gabinete. Lá fora desenrola-se uma tempestade política. O primeiro-ministro tem e não tem tempo a perder. Durante duas horas, o telefone não toca. Olha apenas uma vez para o relógio. Não muda de posição. Raramente deixa transparecer um sinal de irritação. Não, a palavra é excessiva. Talvez seja melhor dizer algum incómodo. Explica tudo o que entende que deve ser explicado. Não faz cedências. Uma parte do mistério que ainda envolve o personagem começa aqui.

Passos Coelho é um sedutor. Pelo trato, pela educação, pela afabilidade, pela cortesia. Depois, há uma parede de vidro, invisível, que rapidamente se percebe que é intransponível. Quando foi eleito líder do PSD, em Março de 2010, toda a gente quis saber quem era o homem que ousara desafiar a oligarquia cavaquista. Dos grandes espaços africanos à dureza de uma aldeia transmontana. A imersão precoce na política. A liderança da JSD. O desprendimento da política. "Entrou e saiu", "liga e desliga com uma enorme facilidade".

Sem alarde. E sem cobranças. Regressou para liderar um país em plena tormenta. Entre a cordialidade e a distância, há um campo difícil de decifrar. Que apenas se pode intuir.

Mário Soares nunca escondeu a simpatia pelo personagem, incluindo nos momentos politicamente mais inoportunos. Ninguém como ele sabe separar as ideias das pessoas. "Gosto dele porque é simpático e inteligente, mas eu sou um socialista e ele é um neoliberal". O que parece não ter grande importância. "Há dias, logo a seguir a eu ter dito o que disse sobre o Governo e sobre a troika, encontrámo-nos numa coisa pública e ele cumprimentou-me com a simpatia de sempre." 

Aparentemente, Passos retribui. Nunca cortou as pontes com Soares. "Talvez sejam os dois muito ciosos da sua própria autonomia". Talvez. Soares simboliza a história da democracia portuguesa.

Passos é da geração que pela primeira vez se libertou do momento da ruptura com o antigo regime e da visão que emanou dessa ruptura. A democracia rotinizou-se. Os políticos também. Vai um mundo entre eles. Passos Coelho foi, no entanto, o primeiro primeiro-ministro de um governo de centro-direita a comparecer no Parlamento no dia 25 de Abril exibindo um cravo vermelho. Sinal de libertação? Há qualidades de carácter que o definem e que um ano de governo através da maior crise vivida pela democracia portuguesa não parece ter conseguido alterar. Assunção Esteves, a Presidente da Assembleia da República que resultou do primeiro "erro" cometido pelo novo primeiro-ministro (a escolha falhada de Fernando Nobre para segunda figura do Estado), não faz parte do círculo mais próximo.
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A reportagem é de Teresa de Sousa, Público, 22-11-2012 – 00:17. Continue lendo aqui.

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