sábado, 18 de maio de 2013

A perseguida e ameaçada cristandade árabe

Francisco Vianna
Os raptos recentes do Arcebispo Ortodoxo Siríaco Yohanna Ibrahim e do seu homólogo Ortodoxo Grego, Paul Yazigi, refletem não apenas a crescente brutalidade da guerra civil Síria, mas também a escalada da crise para os Cristãos em todo o mundo Árabe – uma crise que poderá terminar por afastá-los completamente desses países.

Catedral cristã maronita em Beirute, no Líbano
De acordo com a Sociedade Internacional para os Direitos Humanos, 80% de todos os atos de perseguição religiosa no mundo inteiro em 2012 foram dirigidos contra Cristãos. Este surto de discriminação contra comunidades Cristãs, em países onde vivem há muitos séculos, pode ser explicado em grande parte pelo aumento da militância Islamita e a ascensão do Islã político no rescaldo da chamada Primavera Árabe. À medida que os partidos Islamitas tomaram o poder na região, uma onda de intimidação e discriminação foi desencadeada sobre as populações de minoria árabe Cristã.
Por exemplo, a 26 de Fevereiro, num mercado de roupa em Bengazi, na Líbia, membros de uma poderosa milícia Islamita reuniram dezenas de Cristãos Coptas Egípcios – identificados por cruzes tatuadas nos seus pulsos direitos – que depois detiveram, torturaram, e ameaçaram executar. Entre as vítimas estava um padre Copta, a quem os captores agrediram severamente antes de lhe rapar o cabelo e o bigode. Padres foram também agredidos em Trípoli, e igrejas foram incendiadas. Tudo isto envia uma mensagem clara: os que não são muçulmanos não estão seguros na Líbia.
Embora a Líbia não possua uma minoria religiosa significativa, há centenas de milhares de egípcios que vivem e trabalham no país, onde o proselitismo cristão é ilegal e onde se pode ser acusado de proselitismo simplesmente por se possuir uma Bíblia. Mas o governo do Egito, controlado pela Irmandade Muçulmana, não parece particularmente empenhado em proteger os seus cidadãos cristãos na Líbia; fez apenas um apelo pouco empenhado pela libertação dos seus cidadãos detidos.
Isto reflete uma similar deterioração da situação para os cristãos no Egito, onde representam algo em torno de 15% da população. No início de abril, o funeral na Catedral de São Marcos (a sede da Igreja Copta no Cairo) de quatro Cristãos mortos em motins sectários dias antes, transformou-se num caos, com o ataque a milhares de participantes enlutados enquanto tentavam sair após o serviço religioso.
A polícia disparou gás lacrimogêneo para o interior do recinto, aguardando que saíssem, enquanto quem estava fora da catedral lançava coquetéis Molotov e pedras, e disparava contra quem se encontrava no interior. Pelo menos duas pessoas morreram e 80 ficaram feridas num confronto de cinco horas.
Os cristãos culpam a Irmandade Muçulmana não apenas por permitir aos muçulmanos egípcios atacá-los impunemente, mas também por permitir – e professar – uma retórica anticristã inflamada. Por exemplo, num comício a favor do Presidente Mohamed Morsi, no ano passado, o clérigo Safwat Hegazy avisou que os muçulmanos egípcios iriam “salpicar de sangue” os cristãos que “salpicassem de água” a legitimidade de Morsi.
Em fevereiro, o patriarca Copta do Egito, Papa Tawadros II, criticou de modo incisivo a liderança do país numa entrevista televisionada, apelidando a nova constituição de discriminatória e desvalorizando os “diálogos nacionais” de Morsi como gestos vazios. Esta postura invulgarmente assertiva reflete a frustração crescente entre os cristãos, bem como na oposição secular e liberal, com o monopólio de poder da Irmandade Muçulmana.

Cristãos coptas egípcios exibem pano manchado de sangue após conflito com soldados e a polícia durante protesto no Cairo.
A Síria, que outrora acolheu milhares de cristãos em fuga de um Iraque assolado pela guerra, atravessa uma mudança análoga, à medida que, cada vez mais sectária, a guerra civil gera medo e desconfiança na população. Apesar de os cristãos terem procurado se manter neutros no conflito, envolveram-se gradualmente, alguns pela tomada de armas e outros como vítimas de rapto e violência.
O Patriarca católico grego, Melquita Gregório III, afirmou recentemente que, desde 2011, foram mortos mais de 1.000 cristãos e mais de 40 igrejas e outras instituições cristãs (escolas, orfanatos, e centros de assistência) foram danificadas ou destruídas. Estima-se que 300.000 Cristãos tenham fugido da Síria.
Para adiante disso, as repercussões do incessante conflito regional estão a desestabilizar o Líbano, um país que oferece aos cristãos uma garantia constitucional de representação política. Cerca de 400.000 refugiados – muitos deles muçulmanos sunitas, incluindo rebeldes fugitivos – irromperam ao longo da fronteira com a Síria, exacerbando as tensões sectárias e ameaçando romper o delicado equilíbrio social e político do Líbano.
Dado que, como salienta Martin Tamcke da Universidade de Göttingen, não restam alternativas aos refugiados cristãos no Médio Oriente, eles dirigem-se cada vez mais para a Europa e a América do Norte. Se for permitido que tal tendência continue, o Médio Oriente perderá gradualmente as suas congregações cristãs. De modo a prevenir tal resultado trágico, os líderes Ocidentais devem ter um papel mais ativo na defesa da proteção das minorias cristãs em todo o mundo árabe.
Em última instância, cristãos e muçulmanos no mundo árabe possuem os mesmos desejos: liberdade, dignidade, e direitos iguais. Aqueles que perseguem os cristãos deveriam reconhecer que a Primavera Árabe deveria beneficiar todos os árabes e não apenas os islâmicos fundamentalistas.
Título, Imagens e Texto: Francisco Vianna, 18-05-2013

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