Ou: Joaquim Barbosa e Luís Roberto Barroso fora
do tom. Ou ainda: “Demorou para abalar, mas abalou”
Reinaldo Azevedo
A palavra “decoro” perdeu parte do seu sentido entre nós. Em latim, seu uso mais frequente estava ligado à adequação. Até a poesia deveria ser “decorosa”, pautar-se pela medida. Nesta terça, dois ministros do Supremo disseram, pois, coisas indecorosas — também segundo uma das acepções, a quarta, do dicionário do Houaiss. Ali se diz que o decoro é a “postura requerida para exercer qualquer cargo ou função, pública ou não”. Viram? Pública ou não! Um pasteleiro também pode ser decoroso — se seguir as regras de higiene e se seu avental estiver limpo — ou indecoroso. O que não dizer, então, de dois de um colégio de apenas 11 notáveis da República. Já escrevi sobre Barbosa. Encontrou-se com Dilma Rousseff e concedeu depois entrevista. Afirmou que a democracia brasileira deveria ser menos dependente de partidos, defendeu a existência de candidatos avulsos — o que poderia ser a porta aberta para aventureiros —, falou na necessidade de ouvir mais o povo (aceno, ainda que silencioso, a plebiscitos), sorriu de satisfação por ter sido apontado como presidenciável em pesquisa do Datafolha e acusou uma crise de representatividade. Ora, ele foi indicado pelo Poder Executivo e aprovado pelo Legislativo. Sente-se ou não como expressão da crise? Imaginem, só por hipótese, o presidente da Suprema Corte dos EUA a conceder uma entrevista, depois de um encontro com Barack Obama, em que descascasse os partidos, o Congresso e, como Joaquim é Joaquim, o próprio Judiciário. Cairiam os dois. Por aqui, alguns tontos acham que isso é prova de coragem, de desassombro, de sinceridade necessária. Ele fez um bom trabalho no mensalão, que ainda pode ser destruído? Fez! Não me obrigo, por isso, a apoiar certos absurdos que diz.
A palavra “decoro” perdeu parte do seu sentido entre nós. Em latim, seu uso mais frequente estava ligado à adequação. Até a poesia deveria ser “decorosa”, pautar-se pela medida. Nesta terça, dois ministros do Supremo disseram, pois, coisas indecorosas — também segundo uma das acepções, a quarta, do dicionário do Houaiss. Ali se diz que o decoro é a “postura requerida para exercer qualquer cargo ou função, pública ou não”. Viram? Pública ou não! Um pasteleiro também pode ser decoroso — se seguir as regras de higiene e se seu avental estiver limpo — ou indecoroso. O que não dizer, então, de dois de um colégio de apenas 11 notáveis da República. Já escrevi sobre Barbosa. Encontrou-se com Dilma Rousseff e concedeu depois entrevista. Afirmou que a democracia brasileira deveria ser menos dependente de partidos, defendeu a existência de candidatos avulsos — o que poderia ser a porta aberta para aventureiros —, falou na necessidade de ouvir mais o povo (aceno, ainda que silencioso, a plebiscitos), sorriu de satisfação por ter sido apontado como presidenciável em pesquisa do Datafolha e acusou uma crise de representatividade. Ora, ele foi indicado pelo Poder Executivo e aprovado pelo Legislativo. Sente-se ou não como expressão da crise? Imaginem, só por hipótese, o presidente da Suprema Corte dos EUA a conceder uma entrevista, depois de um encontro com Barack Obama, em que descascasse os partidos, o Congresso e, como Joaquim é Joaquim, o próprio Judiciário. Cairiam os dois. Por aqui, alguns tontos acham que isso é prova de coragem, de desassombro, de sinceridade necessária. Ele fez um bom trabalho no mensalão, que ainda pode ser destruído? Fez! Não me obrigo, por isso, a apoiar certos absurdos que diz.
Barbosa não foi o campeão do
dia do despudor. Venceu a disputa, com vantagem, Luís Roberto Barroso, novo
ministro do tribunal, que toma posse hoje. Depois, Brasília será abalada por
uma festa de comemoração para DUAS MIL PESSOAS. Vocês sabem o que disse o New
York Times sobre as respectivas festas que deram o conservador Anthony
Kennedy ou o liberal Stephen Breyer quando indicados para a Suprema Corte dos
EUA por, respectivamente, Ronald Reagan e Bill Clinton? O NYT não disse
nada porque eles não deram festa nenhuma. Também não ocorreria nem ao
conservador nem ao liberal chamar um ídolo pop, ou algo assim, para cantar o
Hino Nacional. O Brasil é um país moderno, como a gente tem visto à farta. A
festa de arromba constrange o bom senso e a acepção número três do decoro no
Houaiss — “seriedade nas maneiras; compostura”. Mas não é o que Barroso pode
oferecer de pior.
Acompanho política de muito
perto desde o 15 anos — já lá se vão 36!!! Isso não quer dizer que não possa
ficar chocado. O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso nunca disse “esqueçam
o que escrevi”. Nunca! Até porque não seria necessário. Nada do que fez na
Presidência nega em essência o que escreveu em seus livros. Já Barroso pode
acrescentar a esse um outro convite à amnésia: “Esqueçam o que eu disse”. Assim
que ele foi indicado por Dilma para o Supremo, resolvi ler seu livro “O Novo
Direito Constitucional Brasileiro – Contribuições para a construção teórica e
prática da jurisdição constitucional no Brasil”. Encontrei coisas espantosas, que registrei numa série de posts.
No livro, Barroso confessa que, em 2000, assinou um artigo, em parceria com uma
sócia, em que sustentava que, quando há tratado de extradição firmado com um
país, o presidente da República não pode se negar a extraditar um preso. Muito
bem! Ocorre que o homem se tornou depois advogado do terrorista Cesare
Battisti, e o Brasil tem um tratado de extradição com a Itália. Como o advogado
lutava para o sujeito ficar no Brasil, estava negando o que ele próprio
escrevera. Ah, o doutor não se apertou. Rapaz esperto, fez o quê? Renegou o
próprio artigo e passou a sustentar que o trecho em questão fora escrito pela
sócia. Saiu com o seu nome, mas ele não pensava aquilo. Logo, se e quando
Barroso voltar a se contradizer, fiquem certos: o que leva seu nome não lhe
pertence. Esqueçam o que ele escreveu.
Visitando o Congresso
Tão logo a presidente da República lançou a sua exótica proposta de uma Assembleia Constituinte específica, para fazer a reforma política, publiquei neste blog um vídeo com trecho de uma entrevista que Barroso concedera ao site “Migalhas”, especializado em assuntos jurídicos, em outubro de 2011. FAZ MENOS DE DOIS ANOS!!! Já transcrevi pequeno trecho de sua fala. Agora, segue um maior. E, mais uma vez, abaixo dela, vai o vídeo. Retorno em seguida.
Tão logo a presidente da República lançou a sua exótica proposta de uma Assembleia Constituinte específica, para fazer a reforma política, publiquei neste blog um vídeo com trecho de uma entrevista que Barroso concedera ao site “Migalhas”, especializado em assuntos jurídicos, em outubro de 2011. FAZ MENOS DE DOIS ANOS!!! Já transcrevi pequeno trecho de sua fala. Agora, segue um maior. E, mais uma vez, abaixo dela, vai o vídeo. Retorno em seguida.
“[Constituinte exclusiva]
não é possível. A teoria constitucional não conseguiria explicar uma
constituinte parcial. A ideia de um poder constituinte é a de um poder
soberano, um poder que não deve o seu fundamento de legitimidade senão a si
próprio e à soberania popular que o impulsionou. De modo que ninguém pode
convocar um poder constituinte e estabelecer previamente qual é a agenda dessa
poder constituinte. O poder constituinte não tem agenda pré-fixada. Mas, às
vezes, a realidade derrota a teoria constitucional. Isso não seria propriamente
um problema. Mas a vedade é que não há necessidade. Porque você precisaria de
um poder constituinte originário se houvesse alguma coisa na Constituição que
impedisse a reforma política de que o país precisa. Não há! Absolutamente nada.
A Constituição tem como cláusulas pétreas a separação de Poderes e a Federação.
Acho que ninguém quer derrotar isso. não há. (…) Não há nenhuma cláusula pétrea
na Constituição que se impeça de fazer a reforma constitucional que se queira.
Então, se quiser fazer voto distrital misto, não há impedimento na
Constituição; se quiser fazer só voto distrital — portanto, majoritário puro,
não há impedimento na Constituição —; se quiser instituir um sistema de
fidelidade partidária, não há impedimento na Constituição (…). Eu não vi
nenhuma ideia posta no debate político que não possa ser feita, concretizada
com a Constituição que nós temos ou, no máximo, com uma emenda à Constituição”.
Voltei
Nesta terça, no entanto, Barroso passou a dizer rigorosamente o contrário. Pior: foi ao Congresso para tentar convencer os parlamentares da possibilidade da Constituinte. Raramente vi cena tão constrangedora. Ele tentou dar nós no verbo e provar que não entenderam direito o que dissera antes:
“Nunca pode ser uma
Constituinte originária, mas reformadora. Não é possível abolir a federação, a
separação dos Poderes ou cláusulas pétreas. Se o Congresso achar que deve
delegar [a reforma política] a um órgão externo, e a população chancelar, essa
é uma via legítima”.
Doutor Barroso, e isso é muito
frequente em seu livro, tenta nos convencer de que as palavras não fazem
sentido. Repito o que ele próprio disse: “A ideia de um poder constituinte é
a de um poder soberano, um poder que não deve o seu fundamento de legitimidade
senão a si próprio e à soberania popular que o impulsionou”. Como
compatibilizar essas palavras com a fala desta terça-feira? Pois é…. O doutor
da festa de arromba parece que pretende que esqueçamos o que ele escreveu, o
que ele disse e também o que outros escreveram: a Constituição, por exemplo.
Vem coisa por aí. No STF, já se diz que serão necessárias duas cadeiras para
abrigá-lo: uma para ele, e outra para o ego. Certamente não se orgulha da
coerência.
Demorou para abalar, mas
abalou
Barroso contratou uma cantora chamada Ellen Oléria para cantar o Hino Nacional na solenidade de posse. Li na Ilustrada, da Folha, que ela é lésbica assumida (Barroso patrocinou no STF a causa da união civil de homossexuais). Ao jornal, a moça expressou o desejo de que “as ideias do novo integrante da corte sirvam de exemplo para outros membros do Judiciário, Legislativo e Executivo”. Quais ideias? As que ele tem ou aquelas às quais ele renuncia sem dar explicações?
Barroso contratou uma cantora chamada Ellen Oléria para cantar o Hino Nacional na solenidade de posse. Li na Ilustrada, da Folha, que ela é lésbica assumida (Barroso patrocinou no STF a causa da união civil de homossexuais). Ao jornal, a moça expressou o desejo de que “as ideias do novo integrante da corte sirvam de exemplo para outros membros do Judiciário, Legislativo e Executivo”. Quais ideias? As que ele tem ou aquelas às quais ele renuncia sem dar explicações?
Ellen sintetizou o que pensa
de Barroso com aquela linguagem metafórica muito própria dos artistas: “Demorou
para abalar, mas abalou…”.
É isso aí. A partir desta
quarta, tudo indica que o Supremo estará abalado.
Título e Texto: Reinaldo Azevedo, 26-06-2013
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