quarta-feira, 10 de julho de 2013

O Hezbollah, no Líbano, começa a provar do próprio veneno

Poderosa explosão de carro-bomba sacode posição fortificada do Hezbollah em Beirute. Pelo menos 53 pessoas ficaram feridas no atentado, depois que recentemente rebeldes sírios ameaçaram a milícia libanesa, mas deputado culpa Israel.
Francisco Vianna

Forças de segurança libanesas permanecem na cena do ataque a bomba em Beir el-Abed, um subúrbio ao sul de Beirute, no Líbano, na terça- feira. Foto distribuída pela AP/Bilal Hussein
A agência de notícias americana “Associated Press” informou a poucos minutos que um carro-bomba explodiu e sacudiu uma sede fortificada do grupo terrorista militante xiita Hezbollah na zona sul da capital libanesa hoje pela manhã, ferindo pelo menos 53 pessoas e deixando diversos carros em chamas no mais sério e devastador efeito proveniente da guerra civil na Síria no seu vizinho menor desde que a crise síria começou, segundo uma declaração da polícia local.
A ponderosa explosão reverberou numa área de intenso comércio e também residencial num momento em que muitos libaneses muçulmanos xiitas começavam a observar o mês sagrado do Ramadã. Foi de longe a pior explosão a ocorrer como ataque a Beirute nos últimos anos. Apesar de não ter havido qualquer assunção de responsabilidade pelo atentado, há um temor crescente no Líbano de que o Hezbollah passa estar sofrendo retaliação por seu agora aberto papel na luta em prol da manutenção do poder pelo Presidente Bashar Assad em apoio as suas tropas dentro da Síria, inclusive, dizem os ativistas, na cidade de Homs próxima à fronteira libanesa, onde a batalha está comendo solta.

O ataque a bomba também deverá inflamar as já ferventes tensões dentro do próprio Líbano, onde embates mortais estão acontecendo entre xiitas e sunitas numa incidência crescente à medida que a guerra civil na Síria vai adquirindo tons sectários e sombrios. Alguns sunitas no Líbano, muitos dos quais apoiam os rebeldes sírios, têm expressado sua crescente preocupação e ressentimento sobre o que eles enxergam como um poder clandestino do Hezbollah no país.

O estacionamento, à esquerda, e o prédio do reduto do Hezbollah na zona sul do Líbano.
A explosão na manhã de hoje atingiu a área de Beir el-Abed, e foi muito provavelmente causada pela denotação de um carro-bomba, segundo as declarações de autoridades que falaram sob a condição de anonimato conforme exigem as normas oficiais. Disseram que ele detonou no estacionamento próximo à Cooperativa Islâmica, um supermercado usualmente cheio de compradores, e com um posto de combustíveis.
“A explosão foi tão forte que eu pensei se tratar de um bombardeio aéreo israelense”, disse Mohammad al-Zein, que mora perto do local da explosão. “Minha mulher estava na cama dormindo e todo aquele vidro picado da janela caiu sobre ela, que sofreu pequenos cortes, na boca, nos braços e nas pernas”. Outro residente contou que estava jejuando no primeiro dia do Ramadã e estava a caminho de sua loja para o lanche da tarde que quebraria seu dia inteiro de jejum. “Estava pilotando minha moto em direção à minha loja de doces quando me assustei com a explosão maciça que me atordoou a ponto de me derrubar da moto”, contou esse empregado de 52 anos, que trabalha numa empresa privada. Não quis dizer o seu nome por motivos de segurança.

O Ministro da Saúde, Ali Hassan Khalil, disse que 53 pessoas ficaram feridas e que a maioria dos ferimentos foi leve e que muitos deles foram causados por estilhaços de vidro.
O estacionamento onde a bomba explodiu se situa a algumas centenas de metros do prédio que é conhecido como o “quarteirão de segurança” do Hezbollah, onde muitos dos membros do “partido” moram e têm seus escritórios. O líder do Hezbollah, Hassan Nasrallah, recebeu dignitários lá antes da guerra de 2006 (um episódio do conflito árabe-israelense, também conhecido, em Israel, como ‘Segunda Guerra do Líbano’ e, no Líbano, como a ‘Guerra de Julho’ e, ainda, no mundo árabe, como a ‘Sexta Guerra Árabe-Israelense’). A área foi, na época, bombardeada por Israel e desde então Nassan Nasrallah (muçulmano xiita e Secretário Geral do Hezbollah) passou a viver escondido em subterrâneos, aparecendo apenas raramente em público e nunca por mais de poucos minutos, temendo ser assassinado por Israel.

“Esta explosão é uma mensagem, mas nós não nos dobraremos”, disse Ziad Waked, uma autoridade municipal falando na TV Al-Manar do Hezbollah.
Com os rolos de fumaça saindo ainda do local da explosão, um grupo de cerca de 100 apoiadores indignados do Hezbollah ocuparam a área, portando cartazes com o retrato de Nasrallah, e gritando slogans sectários e em apoio ao seu líder.
Agentes do Hezbollah dispararam para o ar para dispersar as pessoas que invadiram o interior do ministério atirando pedras após terem deixado o local da explosão, caindo numa armadilha por cerca de 45 minutos num prédio até serem escoltados para fora pela porta dos fundos. “O sangue xiita está fervendo”, gritavam os apoiadores do Hezbollah.

O Ministro Marwan Charbel é tido por alguns xiitas como simpatizante da linha dura clerical sunita de Ahmad al-Assir, que pregou uma agitação contra o Hezbollah por meses e agora se encontra foragido.
A explosão da terça-feira de hoje é a maior nos subúrbios da capital libanesa desde o fim da guerra civil de 15 anos que começou em 1990, e vem rachar a rígida segurança de uma área de segurança máxima da cidade. “É uma área enorme e intensamente povoada e nenhuma força no mundo pode proteger cada área e cada rua ao mesmo tempo”, disse o deputado do Hezbollah Ali Moqdad. “Tais atos são um recado que lembra dias sombrios que os libaneses gostariam de apagar de suas memórias”.

Filmagens de TV do local da explosão reviveram lembranças daquele conflito, quando carros-bombas instalados por grupos sectários eram comuns. Têm sido numerosos os carros-bombas visando políticos e jornalistas desde então, mas o uso de carros-bombas aleatórios tem sido uma ocorrência raríssima.
Agentes do Hezbollah em trajes civis, alguns deles portando fuzis Kalashnikov, isolavam o local com cordões e fitas amarelas. Tais agentes junto com agentes da polícia libanesa barraram os jornalistas, impedindo-os de ter acesso ao local da explosão.

Ambulâncias e carros de bombeiros com sirenes abertas cruzavam a área e testemunhas disseram que as baixas foram levadas às pressas para dois hospitais próximos. A força da detonação espatifou a maioria das vidraças das lojas e janelas de uma área intensamente povoada quer por comércio quer por residências. Calcula-se que o veículo que explodiu foi deixado no estacionamento com algo em torno de 35 quilos de explosivo plástico.
Em maio último, dois foguetes arrebentaram um reduto do Hezbollah ao sul de Beirute, ferindo quatro pessoas. Os foguetes foram disparados horas depois de Nasrallah ter prometido fazer um discurso em apoio à vitória de Assad na guerra civil da Síria. Em junho, um foguete explodiu nessa mesma área, sem causar baixas. São foguetes de fabricação caseira, do mesmo tipo dos que são fabricados em Gaza a partir de componentes enviados pelo Irã e contrabandeados pela fronteira com o Egito. 

O Hezbollah tem abertamente se juntado às tropas de Assad na Síria e os guerrilheiros do grupo foram instrumentalizados na recente vitória do regime de Assada quando recuperaram o controle da cidade estratégica de Qusair, próxima à fronteira libanesa.
Os muçulmanos sunitas do Líbano em sua maioria apoiam os sobrecarregados rebeldes sunitas da Síria, ao passo que muitos xiitas apoiam Assad, que, por sua vez é membro da minoria governante alauita da Síria, uma ramificação do islamismo xiita.
Título e Texto: Francisco Vianna (da mídia internacional), 09-7-2013

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