terça-feira, 24 de setembro de 2013

"Merkel é a única líder de um grande estado europeu que sobreviveu à crise"

Alfredo Valladão
Poderoso anjo! Ou melhor anja... Depois de sua acachapante vitória eleitoral, Angela Merkel é a única chefe de governo de um grande Estado europeu que sobreviveu à crise econômica dos últimos anos. Todos os outros foram sumariamente descartados. Com um terceiro mandato consecutivo, “Angie” como chamam carinhosamente entra para a história da Alemanha moderna junto aos pesos pesados que foram Konrad Adenauer e Helmut Kohl. Mais impressionante ainda é o fato de que os cristãos-democratas que apoiam a chanceler quase conseguiram a maioria absoluta de cadeiras no Bundestag.

Foto: Tobias Schwartz/Reuters
E não era para menos. Se praticamente todos os países europeus estão afundados na crise, com uma luzinha no fundo do túnel ainda muito longínqua, a Alemanha vai bem obrigado. Claro que não passou incólume pelo furacão, mas comparado com os outros, os problemas alemães foram, esses sim, uma “marolinha”. O slogan de campanha de Merkel foi “mais do mesmo”. E os eleitores compareceram

Na verdade, o que foi referendado pelo voto é uma política de austeridade prudente. Nada de combater a crise econômica com gastanças e déficits orçamentários. Merkel não cansou de lembrar que dez anos atrás a Alemanha era considerada o “homem doente da Europa” e que hoje ela é, de longe, a mais poderosa economia do Velho Continente. Isto porque teve a coragem de fazer o dever de casa: passando para 67 anos a idade legal das aposentadorias, flexibilizando o mercado de trabalho, cortando as despesas do estado e promovendo a competitividade da indústria e do país. E é essa a receita que ela quer ver aplicada pelos outros governos europeus, sobretudo pelos países da Europa do Sul vistos como perdulários reincidentes. E logo antes da eleição, ela se beneficiou das boas notícias vindas da Inglaterra e da Irlanda, dois países que não hesitaram em submeter suas populações a um choque de realismo econômico doloroso.

A vitória dos cristãos-democratas alemães é um sinal evidente de que a política econômica européia não vai mudar apesar dos gritos de desespero da Grécia, da Espanha, de Portugal e até num certo ponto da França. Merkel deixou bem claro que está disposta a manter a zona euro, incluindo todos os seus membros, até a Grécia. E isto apesar de que um parte da opinião pública alemã já se tornou “eurocéptica” – os adversários declarados da moeda européia quase conseguiram entrar no parlamento com pouco menos de 5% dos votos. Mas em contrapartida, ela exige que os países do sul da Europa acabem de vez com o carnaval dos déficits orçamentários e o clientelismo deslavado. A Alemanha é rica, mas não vê razão nenhuma de ter que pagar pelos outros.

Isto não quer dizer de maneira nenhuma que a Alemanha da chanceler virou uma potência imperialista. Muito pelo contrário. O sucesso de Merkel é a vitória de uma posição centrista que recusa qualquer atitude extremista ou radical. A Alemanha moderna está super-contente de ser uma grande Suíça pacífica e moderada. Ela não quer impor nada a ninguém, mas também não quer ser considerada como a vaca leiteira financeira do resto do continente. Até que enfim, depois de um século de agressões que produziram duas guerras mundiais, a Alemanha virou um Estado “normal”, sem pretensões de impor a todo custo a sua vontade aos vizinhos. Isto merece o aplauso de todos. Hoje, o peso e o sucesso de economia alemã fazem com que o país seja a potência dominante na Europa. Mas é muita hipocrisia denunciar a suposta “arrogância” de Berlim só porque os alemães se organizam e fazem os sacrifícios necessários para serem bem-sucedidos.

O problema agora é que nada é simples no país de Angela Merkel. O partido Liberal, principal aliado da Democracia Cristã, não conseguiu eleger nem um deputado. Faltam três cadeiras para a maioria absoluta, portanto a chanceler vai ter que negociar um pacto de governo com os Socialistas ou com os Verdes. Não vai ser fácil: esses dois possíveis parceiros saíram do pleito muito enfraquecidos. E quanto mais fracos, mais caro vão tentar vender a participação no governo. Mas eles sabem também que os eleitores alemães não perdoariam uma crise política e que uma nova eleição daria um triunfo ainda maior aos cristãos-democratas. Para formar o novo governo, Merkel vai ter que aceitar algumas demandas simbólicas dos seus parceiros derrotados. Mas essa situação pode até ser uma bênção para a chanceler que gosta de governar bem no centro do espectro político: um governo de coalizão é uma boa maneira de neutralizar a direita mais radical dentro do seu próprio partido que poderia ter se tornado um baita problema em caso de maioria absoluta no Bundestag.

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