sexta-feira, 29 de novembro de 2013

A vez e a hora de o Irã provar a sua sinceridade sobre o que afirma de seu programa nuclear

Um gesto aparente de boa vontade ou mais manobras diplomáticas para ganhar tempo?
 
Francisco Vianna
O Irã convida os inspetores da AIEA da ONU a fiscalizarem o reator nuclear da usina de Arak, onde centenas de centrífugas têm enriquecido urânio a até 20 por cento na produção de tório e plutônio. 
Imagem de satélite desatualizada, de 2004, do reator de água pesada de Arak, no Irã
A Associated Press (AP) informou ontem que, após um período de dois anos em que Teerã afastou os inspetores da AIEA da ONU, o país islâmico está a convidar essa agência nuclear da ONU para visitar e proceder a uma vistoria de um reator ainda inacabado que poderia estar a produzir plutônio suficiente para até duas ogivas nucleares por ano.

O dirigente da AIEA da ONU, o japonês Yukiya Amano, ao anunciar o convite feito na quinta-feira de hoje, disse que a agência vai aceitá-lo e irá visitar as instalações de água pesada no centro da cidade de Arak. O fato ocorre extensivamente às 35 nações que formam o Conselho da AIEA há menos de uma semana depois de um acordo nuclear entre o Irã e G5+1 ter sido assinado.

Amano disse também que sua agência será encarregada de supervisionar o cumprimento do acordo assinado em Genebra no último fim de semana por parte do Irã. O diretor não deu uma data para a AIEA começar a por em prática o seu papel previsto no acordo, mas sugeriu que isso levaria algum tempo, em parte porque sua agência não foi informada com a anterioridade necessária para que se preparasse para a missão. Há motivos para se crer que, enquanto isso não ocorrer, nada mudará na atividade da usina nuclear.

O convite feito para 08 de dezembro não faz parte do acordo assinado com o G5+1, pelo qual o Irã se compromete a congelar seu programa nuclear, durante seis meses, enriquecendo urânio a no máximo 5 por cento, o suficiente para produzir combustível para seus geradores de água pesada, em troca de um alívio limitado das sanções econômicas. Isso tem sido visto pelos analistas especializados como uma mostra de que Teerã esteja começando a cumprir com sua parte nos diferentes compromissos para abrir uma fiscalização irrestrita dos inspetores da AIEA ao seu programa nuclear. O status das instalações de Arak tem sido um dos principais problemas durante as negociações que levaram ao acordo nuclear.

Vista externa parcial do novo reator de água pesada da usina de Arak, no Irã
Mohammad Javad Zarif, Ministro das Relações Exteriores do Irã, declarou na quarta-feira de anteontem que algumas obras em Arak vão continuar e quando o complexo tiver sido concluído poderá produzir plutônio suficiente para ser usado em armas nucleares. Mas, ele insiste em afirmar que “esse não é o objetivo e que seu programa nuclear é apenas para fins pacíficos, para a produção de energia elétrica e para a investigação científica e médica”. O Irã tinha programado a conclusão do complexo de ISIS em Arak para o próximo ano, uma ambição maior que a própria capacidade do país mesmo levando as obras a toque de caixa.

O porta-voz do Departamento de Estado dos EUA, Jen Psaki, disse que os comentários de Zarif não constituem uma violação do acordo, embora o Irã efetivamente tenha se comprometido em congelar o avanço das obras de complementação do complexo.

A decisão do Irã em permitir que os inspetores da ONU visitem a usina de Arak e seu novo reator de água pesada visa dar a esses inspetores uma imagem mais clara do quanto de material crítico a usina está a produzir e outros detalhes técnicos.

O reator, que fica a uns 150 km a sudoeste de Teerã, já foi parcialmente visitado por alguns funcionários fiscalizadores da AIEA, mas eles não foram capazes de inspecionar in loco a usina desde 2011. As barras de urânio enriquecido têm sua atividade radioativa controlada em parte pela água pesada em reatores desse tipo.

O Irã tem outras usinas nucleares, como a de Qom e de Bushenir, onde a AIEA sabe que estão instaladas centrífugas capazes de enriquecer urânio a até 10 por cento, o que, segundo especialistas, já é capaz de produzir artefatos nucleares conhecidos como “bombas sujas”, que têm pouco potencial destrutivo, mas que espalham radioatividade em níveis letais por toda uma área em torno da explosão, cuja extensão varia com o vento e outros fatores atmosféricos.

A usina nuclear de Bushenir, à beira do Mar Negro, já há algum tempo tem capacidade de enriquecer urânio a até 10 por cento e também de há muito não é fiscalizada pela AIEA
Uma autoridade iraniana disse ontem que o seu país vai aumentar o seu enriquecimento de urânio de baixo nível (até 5 por cento) para produzir combustível de reatores e isótopos nucleares para uso médico e científico. Ali Akhbar Salehi, chefe do programa nuclear persa, contou à agência de notícias estatal IRNA que as centrífugas anteriormente utilizadas para enriquecimento de urânio a nível superior seriam agora voltadas à produção de urânio pouco enriquecido para combustível de reatores. No então, não deu maiores detalhes sobre o assunto, lembrando apenas que o acordo assinado por Teerã com o G%+1 em Genebra não proíbe o Irã de fazer urânio mais enriquecido (até o limite de 20 por cento). Estipula apenas que todo o material recém-produzido deva ser transformado em óxido, que é difícil de ser reconvertido em material sensível.

“Provavelmente, a AIEA da ONU não vai estar pronta para dar início à parte que lhe compete no acordo assinado senão a partir de janeiro do ano que vem”, disseram alguns diplomatas à AP na última quarta-feira. Ao não estabelecer uma data para tal, Amano confirmou indiretamente alguns atrasos, explicando, na reunião de quinta-feira última, que tal atividade vai "demorar algum tempo". “O importante é não haver afobação numa tarefa bastante complicada onde uma boa preparação é essencial para se levar a cabo um bom trabalho”, completou o diretor da AIEA.

Em todo o caso, a partir de janeiro próximo, o país persa poderá demonstrar sobejamente o que afirma sobre o seu programa nuclear e convencer de vez o Ocidente de sua sinceridade, o que, certamente, caso aconteça, poderá inclusive receber ajuda do G5+1. Afinal, como se diz, é mais fácil pegar um mentiroso do que um coxo...
Título e Texto: Francisco Vianna, (da mídia internacional especializada), 29-11-2013

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