Quando se pensa que a política
externa brasileira chegou ao fundo do poço, a gente descobre que é possível descer
um pouco mais. Como já informei aqui, a deputada venezuelana Maria Corina
Machado — aquela que teve a cara chutada por parlamentares bolivarianos — está
ameaçada de perder a imunidade parlamentar e pode ir para a cadeia. Estava
prevista uma intervenção sua, nesta sexta, na OEA (Organização dos Estados
Americanos). Em dois lances, com a ajuda do Brasil, sua palavra foi cassada.
Num primeiro, a Nicarágua,
governada pelo orelhudo Daniel Ortega, propôs que Maria Corina falasse a portas
fechadas, sem a presença de público ou da imprensa. A proposta venceu com 22
votos a favor, 9 contra e 1 abstenção. Numa segunda, sugeriu-se pura e simplesmente
cortar o tema Venezuela da pauta, o que também foi aprovado, aí com 22 votos a
favor, 3 contra e nove abstenções. A deputada só conseguiu se pronunciar
brevemente — e a portas fechadas — porque o embaixador do Panamá cedeu a ela a
sua palavra, um recurso que é permitido.
Nas duas vezes, o Brasil votou
para cassar a palavra de Maria Corina. É nojento!
A parlamentar venezuelana foi
à OEA evocar a Carta Democrática Interamericana para que a entidade cumpra a sua função e cobre
o respeito do governo da Venezuela aos fundamentos da democracia. Leiam, por
exemplo, dois artigos:
Restou a Maria Corina falar
com mais vagar numa entrevista coletiva: “Não viemos aqui pedir nenhum favor,
mas exigir que a OEA cumpra o seu dever. Esta é uma organização de Estados, não
um clube de presidentes”. Ela cobra que a OEA reúna o Conselho Permanente para
discutir a crise em seu país; que se condem a repressão e a supressão de
liberdades e que se faça uma comissão, compostas por reais democratas — como
Óscar Arias, ex-presidente da Costa Rica — para visitar a Venezuela.
Ironias
Ao emprestar a sua cadeira
para Maria Corina, o Panamá repetiu o gesto generoso da Venezuela pré-chavista,
em 1989, quando cedeu o seu lugar para que um representante panamenho
denunciasse a ditadura do delinquente Manuel Noriega. Em 2009, já sob os
auspícios do bolivarianismo, o representante da Venezuela na OEA, Roy
Chaderton, também cedeu seu posto a Patricia Rodas, ex-chanceler de Honduras,
para atacar Porfirio Lobo, presidente eleito e legítimo do seu país. Ocorre que
Patricia era da turma do maluco Manuel Zelaya. Nesse caso, como lembra o jornal
“El Nacional”, a sessão foi aberta e transmitida ao vivo pela TV chavista VTV.
Já são 31 os mortos na
Venezuela desde o dia 12 de fevereiro. Mais de 1.800 pessoas foram detidas. Na
semana passada, foram presos os prefeitos Daniel Ceballos, de San Cristóbal, no
estado de Táchira, e Enzo Scarano, de San Diego, em Carabobo. O primeiro foi
acusado de incitar a violência; o segundo, de não ter impedido a formação de
barricadas. É espantoso! O Brasil não apenas se cala diante da escalada
ditatorial como também cala uma representante da oposição, tentando impedi-la
de se manifestar até na OEA.
O governo Dilma poderia se contentar
em ser apenas medíocre. Mas não! A mulher está disposta a nos cobrir de
vergonha.
Título e Texto: Reinaldo
Azevedo, 23-03-2014
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