Francisco Assis não é
conhecido por ser um político radical. Pelo contrário. Que lhe deu então para, na sua coluna semanal, insultar Pedro Lomba – “pequeno apparatchik ligeiramente
alfabetizado” – e Bruno Maçães – um aparente “pateta” que escreve “num inglês
próprio de quem nunca leu Shakespeare”?
O texto, ao contrário do que é
habitual em Assis, não argumenta, vai apenas de bordão em bordão, atirando com
Hayek para um lado, Pinochet para o outro, num amontoado de lugares comuns
sobre o “governo dogmático” com “uma mentalidade escassamente democrática”. É,
porventura, um texto eleitoral: Assis necessita de aumentar o tom de voz para
que, no PS, não desconfiem dos seus galões. Mas não deixa por isso de se um
texto revelador.
Quando chama a Lomba e Maçães “dois pequenos génios condenados à incompreensão”, Assis revela ao que vem, pois a
palavra-chave da frase é “pequenos”. “Pequenos” porque novos, porque jovens,
porque exteriores ao círculo autorizado dos políticos experientes e sensatos.
É curioso que Assis, um
político que ocupou o seu primeiro cargo público aos 25 anos (presidente da
Câmara de Amarante) se junte ao coro dos que procuram desqualificar os mais
novos apenas por serem mais novos – ou “pequenos”, na sua linguagem alegórica.
É curioso mas vai bem com os espírito do tempo. Depois de o 25 de Abril ter
proporcionado uma ruptura geracional que permitir que gente com menos de trinta
anos chegasse a secretário de Estado e a ministro (para não falar dos que
chegaram a directores de jornais ou a presidentes de empresa), agora, que
supostamente temos à nossa disposição “a geração mais bem preparada de sempre”,
um exército de “senadores” passa a vida a desqualificar os que, mais
novos, começam a mostrar o seu valor e, como é natural e saudável, o seu
atrevimento. Resmas de ex-políticos que no passado tiveram a oportunidade de
levar o país por outro caminho sentam-se hoje nos aerópagos que lhes são
generosamente oferecidos para perorarem sobre a corrente “ausência de
estadistas”, um discurso que, se tivessem um mínimo de pudor, deveriam evitar.
Mas há ainda outro preconceito
no ataque a Lomba e a Maçães: o de que a inteligência e a sensibilidade são
qualidades exclusivas de quem é de esquerda. Só muito excecpcionalmente e com
muito ranger de dentes alguém de esquerda aceita que, sobretudo na área das
ciências sociais, há valor em quem tem ideias de direita e, ainda por cima, não
anda por aí a bater com a mão no peito a dizer que tem “sensibilidade social”.
É por isso significativo que Assis não tenha tido qualquer cuidado em averiguar
o seus percursos intelectuais e académicos antes de tratar de os achincalhar –
um achincalhamento que podia ser apenas político mas a que deu um cunho
pessoal.
Esta forma de discutir – se se
pode chamar a isto discutir – tem no fundo outro objectivo: impedir a discussão
que realmente interessa. E essa é sobre se o 25 de Abril é um património
exclusivo da esquerda – e em especial da extrema-esquerda – ou se é património
de todos os que defendem a liberdade. Assim acha (porventura reduzindo o seu
conhecimento do que disse Pedro Lomba à tresleitura de Pacheco Pereira), que
Mas o que é que este dizia na
entrevista? Algo diferente:
Esperava-se que fosse natural,
para alguém como Assis, olhar o 25 de Abril essencialmente como um momento de
restauração da liberdade, liberdade essa que permitissse ao povo português
escolher livremente o seu futuro, não como uma revolução de rumo ideológico
pré-definido, como alguns dos seus intérpretes, em 1974/75 como ainda hoje em
dia, pretendem. Afinal foi essa a luta do PS em 1975.
Mas não. Por razões que
acredito puramente conjunturais, Assis entende associar o 25 de Abril à defesa
de uma economia competitiva e aberta parece ser um anátema. Nisso ele não
destoa do resto da esquerda, dessa esquerda que acha que tem uma espécie de direito
suserano sobre a nossa democracia, pois, como escreveu a Helena,
Porque aquilo que realmente
incomodou Assis na entrecista de Lomba foi a sua frontalidade, a que lhe
conhecíamos como cronista. Essa frontalidade levou-o a dizer coisas proibidas.
Como estas:
O que Assis não quer mesmo é
que esse “sinistrismo” seja questionado e discutido. Mas essa é precisamente a
discussão que vale a pena ter.
Título e Texto: José Manuel Fernandes, Blasfémias,
17-04-2014
Relacionados:
Leite e mel
Leite e mel
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Não publicamos comentários de anônimos/desconhecidos.
Por favor, se optar por "Anônimo", escreva o seu nome no final do comentário.
Não use CAIXA ALTA, (Não grite!), isto é, não escreva tudo em maiúsculas, escreva normalmente. Obrigado pela sua participação!
Volte sempre!
Abraços./-