terça-feira, 26 de agosto de 2014

"O fato é que aqueles que negam a existência de Deus argumentam geralmente em seu favor"

Rivadávia Rosa
É por aí, mas afastando Marx, Engels e Hegel – há uma Inteligência Absoluta – na origem da Criação, uma Energia transcendente e imanente que impregna o Universo, a Natureza e o próprio Homem; Essência e Substância – que pressupõe que nada existe fora Dele e independente Dele, seja no plano material ou no plano espiritual; Consciência – daí Ser, ou como diziam os hebreus Ele é Aquele que é – “Ele é Aquele que sabe que é”;  na visão hermética: “Deus é uma esfera cujo centro está em toda parte e a circunferência em parte alguma”.

Enquanto Inteligência absoluta – uma particularidade pode lhe ser atribuída: a de Se exprimir e Se manifestar na Criação através de leis imutáveis e perfeitas. Conforme sua aplicação – no plano material ou no espiritual – essas leis são chamadas “físicas” (sucessão das estações, gravitação universal...) ou “metafísicas” (carma, reencarnação..). A primeira categoria diz respeito aos cientistas, já a segunda aos místicos.

O fato é que aqueles que negam a existência de Deus argumentam geralmente em seu favor que, caso Ele existisse não haveria infelicidade, nem penas e nem sofrimento e “castigos” na Terra. Ainda que compreensível esse argumento do ponto de vista humano, ele denota uma má compreensão daquilo que deve ser concebido como Deus e o papel que Ele desempenha na Criação. A maioria dos ateus, assim o é porque se recusa a aceitar que Deus deixe de se opor a tudo aquilo que põe nosso bem-estar em perigo. Contudo, não é Ele que ocasiona ou produz algum tipo de mal, como a violência, as injustiças, as guerras, mas os homens, da mesma forma que a maioria dos acidentes viários são decorrentes da imprudência, inconsciência ou até mesmo ignorância...; as doenças se devem muitas vezes à falta de higiene, ou à violação das ‘leis naturais’.

Porém, do ponto de vista racional, a Criação é necessariamente obra de um Criador, pois aquilo que existe (que “é”) não pode resultar de um não-ser; uma vez que o Universo, a Natureza e o Homem são regidos por leis que impressionam não só a religiosos e místicos, mas também  cientistas, logicamente esse Criador é sumamente Inteligente.  

Assim, torna-se até despiciendo saber se Deus existe ou não – pois Ele não pode não existir, mas compreender em que medida Ele intervém na vida.

Contudo, há o marxismo com sua confusão dialética que pretende ser o único humanismo completo, em que o homem se produziria a si próprio, sem carecer de apoio transcendental; isso culminaria no ser social do comunismo, coincidente com o ateísmo. Marx, em Manuscritos é categórico “O comunismo começa onde começa o ateísmo.”

Para Marx, a questão da origem humana não se coloca em abstrato, mas em concreto, dentro da praxis, no interior da experiência histórica. “O socialismo dispensa esse método assim tão circundante; ele parte da percepção teórica e prática sensorial do homem e da natureza como seres essenciais. É autoconsciência positiva humana, não mais uma autoconsciência alcançada graças à negação da religião; exatamente como a vida real do homem é positiva.” (Marx, Manuscritos, III, 5.)

O homem está aí, apresenta-se sensivelmente, é um fato incontestável. É um elemento da natureza como qualquer outro; está na natureza, e aos poucos a ela se opõe dialeticamente para trabalhá-la, para humanizá-la, e, desta maneira, satisfazer suas necessidades e se produzir. Sua origem para K. Marx é natural, experimental. Basta dizer que surge por geração espontânea.

Para variar K. Marx – entende que colocar o problema da criação do homem como do mundo, é colocar um falso problema e somente um espírito alienado pode entregar-se a uma preocupação desta natureza. “Se você indaga acerca da criação da natureza e do homem, você está abstraindo estes. Você os supõe não-existentes e quer que eu demonstre que eles existem. Replico: desista de sua abstração e ao mesmo tempo você abandonará a pergunta.” (Marx, Manuscritos, III, 5.)

O método marxista decorre da experiência sensível. Se aí estão o homem e a natureza, se aí estão pai e mãe gerando o homem, para que a indagação abstrata a respeito do primeiro pai, a respeito da origem do gênero humano? Basta encontrar o fato do homem existente, criando-se e procriando-se, para que se explique a origem do homem. Aí está a solução dada pela experiência, e é desta, e não da teoria abstrata, que resultaria a verdadeira ciência.

Nessas pré-condições  a solução marxista não satisfaz, de forma alguma, à indagação da inteligência humana, mas serve, contudo, para indicar a maneira como o sistema marxista encara o problema e como procura evitar uma incômoda dificuldade:

“Como, no entanto, para o socialista, o conjunto do que se chama história mundial nada mais é que a criação do homem pelo trabalho humano, e a emergência da natureza para o homem, ele, portanto, tem a prova evidente e irrefutável de sua autocriação, de suas próprias origens. Uma vez que a essência do homem e da natureza, o homem como um ser natural e a natureza como uma realidade humana, se tenha tornado evidente na vida prática, na experiência sensorial, a busca de um ser estranho, um ser acima do homem e da naturza, torna-se praticamente impossível.” (Ib., III, p. 133.)

Com essas palavras é sintetizado muito bem a doutrina marxista a respeito do homem, ou seja, a legitima “fuga alienada” em que o homem é um fato experimental, autocria-se, e, por isso, é impossível buscar um ser estranho acima do homem.

E, assim, o humanismo marxista tem essa estrutura porque é ateu. O ateísmo não é concomitante ao humanismo. É intrínseco, é constitucional. O homem, para K. Marx positivamente desalienado é, efetivamente, positivamente, ateu. Se não fosse ateu, o humanismo não teria a consistência, a independência nem a totalidade acima descritas. Ficaria dependendo de alguém, de “um ser estranho”. E todo ser que depende de outro, não é plenamente ser. Ou seria exatamente o contrário?

No comunismo, ainda segundo K. Marx o homem se firma exclusivamente sobre si mesmo e não depende de deus algum. E Marx insiste na auto-suficiência humana: “Um ser não se encara a si mesmo como independente a menos que seja seu próprio senhor, e ele só é seu próprio senhor quando deve sua existência a si mesmo... Mas, eu vivo completamente por favor de outra pessoa quando lhe devo não apenas continuação de minha vida, como igualmente sua criação.” (Manuscritos, III, 5, 132.)

Diz ainda Marx, pré celebrando, seu comunismo ateu em que o homem não toma o lugar de Deus, porque Deus não tem lugar algum na concepção do materialismo dialético; simplesmente retoma, reassume o seu lugar, perdido que fora por malfadada alienação. E, considera Deus um equívoco da humanidade perdida, o qual segundo ele e cessou porque a humanidade se redescobriu e se reencontrou.

Na realidade, Marx discute indevidamente a questão da qual tenta fugir. E, não leva em conta todos os dados da questão. O problema da existência de Deus é um tema cuja profundidade que não cabe nos moldes de nenhuma filosofia, sobretudo da filosofia marxista.
Título e Texto: Rivadávia Rosa, 26-08-2014

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4 comentários:

  1. Eu ia dar mais um pitaco neste assunto que transcende o conhecimento humano,e do qual pouco sei.
    Cheguei a escrever algumas linhas.
    Como de praxe quando se quer discutir-se algo que não dominamos plenamente,e consigamos "trovar" com alguma credibilidade , já estava indo em busca de citações de grandes nomes da filosofia, para dar peso extra as minhas palavras ,( coisa que todos fazemos),. Mesmo os doutores em filosofia usam tal recurso! .
    Mas aí lembrei que muito tempo atrás tive este atrevimento, (discutir a existência de DEUS !) ,ainda no antigo Orkut do Jim , e deparei-me com um jovem ,VITOR, que "patrolou" todas as minhas certezas.
    Foi um "KO" que levei tempo para reavaliar minhas convicções . Desde então ,a única certeza que tenho sobre o assunto é que "SOU ATEU....GRAÇAS A DEUS!"

    Paizote

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  2. Na minha opinião, todo o discurso do Marx contra a existência de Deus nunca passou de desejo de arrebanhar fiéis para o lado dele e ter poder.
    No fundo, todos precisam acreditar em alguma coisa e por que não no Marx, já que muitos não acreditam em Deus?
    Todas as instituições que existem, sejam empresas capitalistas, escolas, grupos, etc se estruturam em arquétipos que reconhecemos e nos identificamos. Assim, existe um pouco de tudo para todos os gostos.
    Considerando que a maioria tem preguiça de viver mas tem direito de escolher quem vai dizer-lhes como viver, é preciso que exista a figura de um líder ambicioso que percebe que existe este 'mercado',

    abs
    circe aguiar

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  3. Dando o meu pitaco...
    Nem todo o ateu é marxista.
    Nem todo religioso é humanista.
    Uns escolhem líderes, políticos ou religiosos, outros escolhem ser liderados.
    Como se escolhe uma liderança?
    Geralmente ninguém quer ser o líder, por preguiça ou falta de capacidade.
    Antigamente era pela força.
    Depois pelo grupo formado, e finalmente pelo desconhecimento, pelo medo do desconhecido.
    Assim se formaram os pajés, os líderes religiosos, que comungam da mesma corrupção dos grupos aparelhados pra comandar.
    Todos falam do deus único, seria ele judaico, cristão ou muçulmano?
    Nenhum, nem outro, os todos os três?
    Somos os retalhos do tecido que forma a sociedade, cada um escolhe seu lugar, uns pelas recompensas, outros pela orgia, e alguns pelo simples fato de viver em paz.
    Paz é uma simbologia.
    Vivemos a guerra do cotidiano e da sobrevivência, por isso quem morre tem a paz eterna.
    Todos os marxistas pensam em suas sobrevivências às custas do desconhecido.
    Não dar conhecimento é a vulgaridades do humanismo e a excelência do comunismo.
    Os imperadores romanos davam circo ao povo, que diferença têm dos governos que se dizem altruístas na cultura?
    Generalizar o conteúdo é uma forma marxista de coloquiar. Assim existem ateus humanistas, e existem religiosos comunistas.
    A igreja católica e suas reduções jesuíticas foram os alicerces das comunas de Marx.
    Ateus humanistas pensam mais na coletividade do que os religiosos.
    Encerro com o mesmo parágrafo em epígrafe.
    Sou ATEU, graças a deus, amo a mãe natureza.
    buenas tchê

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  4. No comunismo, socialismo ou outro ‘ismo’ do mesmo gênero – o Estado é erigido a Deus, sendo representado pelo ditador de plantão, ou mesmo defunto como é o caso da flamante república bolivariana da Venezuela, em que os mentecaptos e sicofantas adotaram até uma versão do “Paí Nosso”, adulterado com o nome de Chávez Frías, como se ele estivesse no “céu” ...

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