quinta-feira, 20 de novembro de 2014

A ligação do PT com a democracia e o que devemos aprender com isso

Luciano Henrique

Algumas pessoas defendem a seguinte tese: “Não é momento de desunião. Todos participantes de manifestações anti-PT são bem-vindos. O momento é de juntar a todos. Sejam adeptos da via democrática ou da intervenção militar”. Parece um argumento convincente à primeira vista, não?

A ideia parece tão simples quanto funcional: junte todos, elimine critérios para os que podem se juntar ao grupo, e, então, adquire-se maior força. Essa tese falha ao notarmos que qualquer participação dos intervencionistas, por menor que seja, só serve para ajudar ao PT.

Abordarei aqui uma análise aparentemente contra-intuitiva mas amplamente comprovada pelos fatos: o diferencial do PT é sua consideração pela democracia, e quem não lutar para superar essa desigualdade só serve para ajudar o PT em sua solidificação no poder.

“O quê? Como ousa dizer que o PT considera a democracia? Este é um partido totalitário! Você perdeu o juízo!”, pode gritar o mais empolgado.

Não é que o PT seja um partido democrático. É que até mesmo para exercer sua sanha totalitária ele o faz por meio da corrupção da democracia. Assim, eles jamais desgrudarão “da democracia”, mesmo que seja para usá-la de forma corrompida, em um projeto totalitário, mas ainda assim com verniz democrático.

Você poderia contra-argumentar dizendo que o PT aparelhou o estado. Sim, mas isso não é antidemocrático. É imoral. Pode-se dizer que o PT vai nomear 10 juízes no STF. Mas isso também não é antidemocrático. É perigoso, evidentemente, mas não antidemocrático. E quanto ao Decreto 8243? É um atentado contra a separação dos poderes, perigosíssimo para a democracia, mas todo o seu trâmite foi democrático. Até quando ele foi derrubado pela Câmara. Como vemos, todas as ações do PT podem (e devem) ser desconstruídas sob diversos filtros, menos um: o da luta dentro dos padrões da democracia, mesmo que seja para corrompê-la.

Mas por que o PT faz isso? Será que ele gosta de democracia? De jeito algum. O PT tomou a decisão de lutar pelo poder totalitário a partir da democracia, pois sabia de uma regra fundamental: “o poder conseguido pelas vias democráticas é sempre mais legítimo do que aquele conseguido pelas vias não-democráticas”. Ele leram Gramsci. Só isso…

Preste atenção e note que dentre os grandes partidos democráticos o PT é o mais perigoso para a democracia, mas até para impor esse perigo tudo é feito dentro das regras da democracia.

Alguns adeptos da intervenção militar podem dizer que “se é assim, então o PT adquiriu muito poder e isso valida a proposta por intervenção militar”. Na verdade, é exatamente o contrário, pois todo o projeto de poder do PT começou a ser construído… na ditadura militar.

Dito de outra forma, até mesmo diante de um cenário sem liberdade de imprensa (o período da ditadura militar), o PT pensou em projetos de poder obtidos pela via democrática. Então o truque do “beco sem saída” (focado em sair dizendo que “está tudo acabado, então que venham os militares”) não funciona. E o PT também ajudou a demonstrar isso.

O que estou querendo dizer é que em pleno 2014, com todo conhecimento adquirido através de vários sistemas políticos ao redor do mundo, a tomada de poder via intervenção militar ou revolução armada não serve mais. O PT aprendeu isso, mesmo durante uma ditadura. Os intervencionistas não estão conseguindo entender sequer essa concepção básica, mesmo que vivam em um ambiente com muito mais liberdade do que aquele que os petistas (e os tucanos) tinham nos anos 60 e 70.

O PT entendeu a realidade, viu as possibilidades e entendeu o tipo de estratégia que melhor funcionaria. Eles descobriram o óbvio: no Ocidente, discursos de tomada de poder peça força não colam e, quando ocorrem, não se sustentam. Por isso só falam em “democracia”, mesmo que queiram corrompê-la o tempo todo.

Falta apenas que os intervencionistas descubram essa obviedade. Pedir uma intervenção militar é perder legitimidade automaticamente. É por isso que os tucanos fugiram das manifestações a partir do momento em que alguns participantes intervencionistas resolveram aparecer por lá.

A única coisa a fazer agora é jogar a guerra política, usando insights de gente como David Horowitz e Saul Alinsky. Mas e se o PT levar tudo? Então só vão restar os métodos de ação não-violenta, e daí a maior inspiração deve vir de Gene Sharp.

A conformação diante de tais obviedades não é algo a ser pensado para o futuro, mas para agora!

Os bons guerreiros políticos entendem a noção de que tudo deve ser feito a partir da democracia, pois é assim que se adquire legitimidade. E é claro que devemos saber que os truques de “beco sem saída” sempre serão usados para tentar justificar a alternativa da intervenção militar. Esses últimos sempre ficarão aprisionados em duas alternativas:
(1) honestos em sua proposta, mas incapazes de perceber que jamais conseguirão resultados desse jeito, e, pior, ainda servirão como munição para o PT,
(2) petistas infiltrados.

Não existe nenhuma forma pela qual o discurso intervencionista pode ser útil. Ele só serve para atrapalhar e criar um tipo de conformismo no qual um amontoado de gente acredita que bons valores morais estão embasados em ser leviano na guerra política, não fazer nada e esperar por uma ação externa, violenta e antidemocrática.

O que uma visão republicana defende deve ser o contrário: assumir total responsabilidade na guerra política, fazer tudo o que for possível, entender que os resultados surgem a partir dessas ações, que só podem ser executadas pela via democrática (mesmo em um sistema totalitário, e aí nesse caso Gene Sharp seria mais útil que Saul Alinsky, por exemplo) e de forma não-violenta.

Enfim, a luta é por olhar para o mundo como ele é, de acordo com as possibilidades que temos e em busca de resultados possíveis, que, se alcançados, serão legitimados com facilidade.

Sendo assim, basta uma reflexão para entendermos uma verdade dolorida, mas urgente: o PT faz o que vocês deviam estar fazendo. E eu já sei que vem a conversa: “Ah, mas corromperam a democracia”. Sim, eu sei, e já escrevi muito sobre isso. Mas não muda o fato de que eles fazem o que vocês deviam estar fazendo em termos de guerra política e pela via democrática.

É quando chegamos, finalmente, no verdadeiro beco sem saída: ou você está conosco, querendo jogar a guerra política pela via democrática (pois isso não dará munição ao PT, pode dar resultados e resulta em legitimidade), ou está contra. Se você não conseguir ainda compreender qual é o grande segredo do PT (repito: “fazer tudo pela via democrática, para jamais perder a autoridade moral neste aspecto”) e não tem nenhuma intenção de lutar para vencê-los neste território, então servirá para ajudar o adversário.

Isso nos coloca de lados opostos do front. De um lado, temos os bolivarianos e os intervencionistas (duas gangues querendo o poder totalitária, mas somente a primeira fazendo a coisa certa nos quesitos políticos), e de outro temos os republicanos.

Só há uma coisa a fazer. Jogar a guerra política. Mas para jogar a guerra política é preciso entender a via pela qual os resultados verdadeiros surgem. Ou seja, entender algo que até um partido autoritário como o PT entendeu há 40 anos atrás. 
Título, Imagem e Texto: Luciano Henrique, Ceticismo Político, 20-11-2014

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