Rui Ramos
Não convinha nada que as
próximas eleições dependessem das gafes de Costa em reuniões com investidores
chineses ou dos conhecimentos que Passos tinha em 1999 sobre o regime da
segurança social.
A semana passada, António
Costa deu a entender a um grupo de investidores chineses, no Casino do Estoril,
que o Portugal de Passos Coelho era “diferente” do Portugal de José Sócrates,
no sentido em que estaria em melhores condições para justificar investimentos.
Entre os socialistas, houve de tudo: estados de alma, apartes, silêncios. Entre
os outros, houve o resto: denúncia, chacota, ironia.
Para quase toda a gente, a
questão consistiu em determinar o que convém às aspirações socialistas. A
solução não é tão fácil como os críticos de Costa insinuaram. Costa precisa dos
votos dos portugueses para ganhar as eleições, mas também do dinheiro dos
chineses para governar o país. Por isso, interessa-lhe fazer constar que
Portugal está pior, para que os eleitores escolham outro governo, mas também
que Portugal está melhor, para que os capitalistas chineses invistam no país. O
que lhe aconteceu não foi apenas uma gafe, mas a manifestação das suas
contradições de líder da oposição a pensar já na chefia do governo.
Mas o problema de Costa não é
só esse, e não é só dele. Aceitando que lhe interessa dizer o que por um lado
diz aos portugueses e o que por outro lado diz aos chineses, quando é que diz a
verdade? Também não é fácil resolver a questão. É um facto que o país está
pior, porque os impostos são mais pesados e o desemprego aumentou, mas também é
um facto que o país está melhor, não apenas porque o BCE garante que não
faltará dinheiro, mas porque diminuíram os grandes desequilíbrios que em 2011
puseram toda a gente a prever a bancarrota de Portugal e a sua expulsão do
Euro. Dizer que o país está pior é tão verdade como dizer que o país está
melhor.
Toda a gente tem mais ou menos
consciência disto. Daí os debates serem tão inconclusivos e as sondagens tão
incertas. Esse é o risco, porque no estado em que o país está — melhor ou pior
do que em 2011, conforme as opiniões –, importa que as próximas eleições sejam
decisivas, no sentido de darem um mandato claro a uma maioria bem definida. E
para isso, a grande questão não pode ser apenas saber como correram os últimos
quatro anos, se pretendermos julgar esta maioria, ou os últimos vinte anos, se
desejarmos também julgar este Partido Socialista. Isso é muito importante, mas
mais importante ainda é os portugueses decidirem finalmente como querem e podem
ser governados.
O ministro Miguel Poiares
Maduro tem razão, ou melhor, deveria ter razão: “nas próximas eleições, o país
vai escolher entre duas formas de governar”. Oxalá seja assim, oxalá haja mesmo
essa escolha. Para Maduro, os portugueses vão optar entre “aqueles que entendem
que governar é confundir um Estado forte com um Governo omnipresente” e aqueles
que “entendem que ter um Estado forte, por vezes, exige um Governo que saiba
bem as fronteiras entre aquilo que é a esfera da política, da economia e da
justiça”. António Costa, como é óbvio, descreveria de outra maneira os termos
da opção. Mas sejam quais forem esses termos, falta saber se a nossa elite
política consegue formular os seus projectos de um modo suficientemente
plausível para justificar um debate e uma escolha. O que não nos convinha nada
era que a próxima estação eleitoral dependesse de pequenos incidentes, do que
Costa diz em reuniões com investidores estrangeiros, ou dos conhecimentos que
Passos Coelho tinha em 1999 sobre o regime da segurança social.
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