terça-feira, 26 de maio de 2015

A retórica do exagero e a criação de uma histeria na direita

Luciano Henrique
Quando alguém diz “a democracia, para o PT, é uma ditadura” faz uma propaganda – não sem um fundo de razão, mas a verdade é que o justo seria dizer que o PT é tão totalitário que corrompe qualquer democracia. O PT também faz isso o tempo todo. Por exemplo, eles usam o termo “massacre do Paraná”, para o confronto entre manifestantes e a polícia. Mas um massacre envolve mortes. É claro que não existiu massacre algum. Mas, tecnicamente, em termos de guerra política, é um acerto tático. Eis a retórica do exagero.

Enfim, o que quero dizer é que a retórica do exagero, onde as palavras são tiradas do seu sentido para serem usadas em versões exageradas, a fim de causar um efeito psicológico, são parte da guerra política. Esta técnica é melhor utilizada durante o ataque a um oponente, pois no auto-elogio pode se tornar até caricatural.

Porém, há um detalhe que não pode passar batido: a esquerda é esperta o suficiente para saber a diferença entre o exagero praticado por fins de propaganda e a realidade.

Algumas vezes a retórica do exagero é utilizada para alertar alguém sobre algum risco. Por exemplo, dizer “consumir (x) vai te matar” pode ter um tom de exagero para fins de conscientização. Às vezes alguns médicos se valem do recurso, sempre a ser usado com moderação.

Nós usamos isso no dia-a-dia. Recentemente, ao receber as datas propostas para a entrega de um projeto, disse: “Isto é uma insanidade. Coisa de internação.” Obviamente, eu não esperaria que o carrinho do manicômio chegasse para levar o líder de projetos em uma camisa de força.

Vamos a um outro exemplo de como a extrema-esquerda compreende isso direitinho. Quando Eduardo Cunha foi eleito presidente da Câmara parecia que havia ocorrido o apocalipse. Porém, os petistas seguem lutando, dia após dia, em prol de sua agenda (tudo bem que muitos desanimaram, mas principalmente pela postura do PT em favor do arrocho). A direita também tratou a eleição de Luiz Fachin como se fosse o fim do mundo. Mas o problema é que, ao contrário da esquerda, muitos encararam de fato a questão como ponto terminal, e então surgiu ali mais um fluxo de desespero.

Este é um dos problemas que a direita precisa corrigir. No momento de delinear suas expectativas e avaliar o futuro, é prioritário observar a realidade, muito mais dos que as frases de efeito e os slogans (que também possuem sua serventia na guerra política). Muitos na direita têm errado neste aspecto. Eles entram em desespero ao confundirem os slogans e os exageros retóricos, utilizados como fins de propaganda, como se fossem a descrição da realidade.

Me lembro de um caso onde eu argumentava contra a intervenção militar. Um outro afirmou: “a intervenção militar é justa, pois o PT é tropa de ocupação”. Pronto. O exagero retórico (“tropa de ocupação”) se transformou na descrição da realidade, o que só serviu para levá-lo a um radicalismo injustificado.

Comecei a mapear este padrão dias atrás ao observar que algumas pessoas da direita aparentam-se impacientes e enfurecidas, até desesperadas (e sem motivo, pois o momento é de manter confiança na vitória, mas sem perder o foco e atenção, claro). Ao justificarem seu comportamento, usam os exageros retóricos e slogans como descrição da realidade. Muitos fazem isso inconscientemente.

Daí é um pulo para dizerem que “não há democracia alguma no Brasil”, que “não se vence mais o PT pelas vias democráticas”, que “está tudo dominado”, que “PSDB e PT fazem apenas teatro” e daí por diante. Com tantos excessos retóricos levados ao pé da letra, não surpreende que uma parte da direita esteja mais usando discurso de retirada de tropa do que atuando politicamente. É de dar pena ver tanto esforço desperdiçado em interrupção de ações políticas. Hoje em dia a direita conseguiu ter a proeza de ter uma tropa política dedicada única e exclusivamente a desanimar tantas pessoas de seu lado político quanto for possível.

É claro que o PT é totalitário em essência. É claro que o PT é desleal até o limite da psicopatia mais assombrosa. É claro que o PT fará de tudo para se manter no poder. É claro que o Foro de São Paulo é uma ameaça constante. Todavia, nada disso justifica a visão de “está tudo dominado”, apregoada por tamanha perda de conexão com a realidade que beira a histeria.

Eis aqui uma meta: tentar ao máximo observar a realidade, de fato, de maneira serena e racional, no momento de delinear suas próxima ações, definir seus objetivos, escolher seus discursos e “selecionar” seu estado mental. A partir daí, use a retórica a seu favor. A retórica não foi criada para que seu usuário perca a conexão da realidade. Ao contrário, foi feita para que ele obtenha seu benefício na comunicação pública, especialmente quando queremos convencer um público neutro a se opor a um adversário.

A retórica do exagero deve ser uma arma a nosso favor. Não deixe ela se tornar instrumento de suicídio político.
Título e Texto: Luciano Henrique, Ceticismo Político, 26-5-2015

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