Luciano Henrique
Quando alguém diz “a
democracia, para o PT, é uma ditadura” faz uma propaganda – não sem um fundo de
razão, mas a verdade é que o justo seria dizer que o PT é tão totalitário que
corrompe qualquer democracia. O PT também faz isso o tempo todo. Por exemplo,
eles usam o termo “massacre do Paraná”, para o confronto entre manifestantes e
a polícia. Mas um massacre envolve mortes. É claro que não existiu massacre
algum. Mas, tecnicamente, em termos de guerra política, é um acerto tático. Eis
a retórica do exagero.
Enfim, o que quero dizer é que
a retórica do exagero, onde as palavras são tiradas do seu sentido para serem
usadas em versões exageradas, a fim de causar um efeito psicológico, são parte
da guerra política. Esta técnica é melhor utilizada durante o ataque a um
oponente, pois no auto-elogio pode se tornar até caricatural.
Porém, há um detalhe que não
pode passar batido: a esquerda é esperta o suficiente para saber a diferença
entre o exagero praticado por fins de propaganda e a realidade.
Algumas vezes a retórica do
exagero é utilizada para alertar alguém sobre algum risco. Por exemplo, dizer
“consumir (x) vai te matar” pode ter um tom de exagero para fins de
conscientização. Às vezes alguns médicos se valem do recurso, sempre a ser
usado com moderação.
Nós usamos isso no dia-a-dia.
Recentemente, ao receber as datas propostas para a entrega de um projeto,
disse: “Isto é uma insanidade. Coisa de internação.” Obviamente, eu não
esperaria que o carrinho do manicômio chegasse para levar o líder de projetos
em uma camisa de força.
Vamos a um outro exemplo de
como a extrema-esquerda compreende isso direitinho. Quando Eduardo Cunha foi
eleito presidente da Câmara parecia que havia ocorrido o apocalipse. Porém, os
petistas seguem lutando, dia após dia, em prol de sua agenda (tudo bem que
muitos desanimaram, mas principalmente pela postura do PT em favor do arrocho).
A direita também tratou a eleição de Luiz Fachin como se fosse o fim do mundo.
Mas o problema é que, ao contrário da esquerda, muitos encararam de fato a
questão como ponto terminal, e então surgiu ali mais um fluxo de desespero.
Este é um dos problemas que a
direita precisa corrigir. No momento de delinear suas expectativas e avaliar o
futuro, é prioritário observar a realidade, muito mais dos que as frases de
efeito e os slogans (que também possuem sua serventia na guerra política).
Muitos na direita têm errado neste aspecto. Eles entram em desespero ao
confundirem os slogans e os exageros retóricos, utilizados como fins de
propaganda, como se fossem a descrição da realidade.
Me lembro de um caso onde eu
argumentava contra a intervenção militar. Um outro afirmou: “a intervenção
militar é justa, pois o PT é tropa de ocupação”. Pronto. O exagero retórico
(“tropa de ocupação”) se transformou na descrição da realidade, o que só serviu
para levá-lo a um radicalismo injustificado.
Comecei a mapear este padrão
dias atrás ao observar que algumas pessoas da direita aparentam-se impacientes
e enfurecidas, até desesperadas (e sem motivo, pois o momento é de manter
confiança na vitória, mas sem perder o foco e atenção, claro). Ao justificarem
seu comportamento, usam os exageros retóricos e slogans como descrição da
realidade. Muitos fazem isso inconscientemente.
Daí é um pulo para dizerem que
“não há democracia alguma no Brasil”, que “não se vence mais o PT pelas vias
democráticas”, que “está tudo dominado”, que “PSDB e PT fazem apenas teatro” e
daí por diante. Com tantos excessos retóricos levados ao pé da letra, não
surpreende que uma parte da direita esteja mais usando discurso de retirada de
tropa do que atuando politicamente. É de dar pena ver tanto esforço
desperdiçado em interrupção de ações políticas. Hoje em dia a direita conseguiu
ter a proeza de ter uma tropa política dedicada única e exclusivamente a
desanimar tantas pessoas de seu lado político quanto for possível.
É claro que o PT é totalitário
em essência. É claro que o PT é desleal até o limite da psicopatia mais
assombrosa. É claro que o PT fará de tudo para se manter no poder. É claro que
o Foro de São Paulo é uma ameaça constante. Todavia, nada disso justifica a
visão de “está tudo dominado”, apregoada por tamanha perda de conexão com a
realidade que beira a histeria.
Eis aqui uma meta: tentar ao
máximo observar a realidade, de fato, de maneira serena e racional, no momento
de delinear suas próxima ações, definir seus objetivos, escolher seus discursos
e “selecionar” seu estado mental. A partir daí, use a retórica a seu favor. A
retórica não foi criada para que seu usuário perca a conexão da realidade. Ao
contrário, foi feita para que ele obtenha seu benefício na comunicação pública,
especialmente quando queremos convencer um público neutro a se opor a um
adversário.
A retórica do exagero deve ser
uma arma a nosso favor. Não deixe ela se tornar instrumento de suicídio
político.
Título e Texto: Luciano Henrique, Ceticismo Político, 26-5-2015
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