Rui Ramos
O PCP e o BE não são partidos
como os outros. Por vezes, diz-se que são partidos de “protesto”. Não: são
partidos revolucionários.
Depois do debate entre António
Costa e Catarina Martins, alguma gente de boa-fé convenceu-se de que sim, o
Bloco de Esquerda estaria disponível para conversar com o PS. Não ouviram
Catarina Martins. O BE só atenderá o telefone ao PS caso o PS, muito
solenemente, renegar desde já pelo menos uma parte do seu programa eleitoral.
Ou seja, António Costa precisaria de submeter-se à direcção do BE mesmo antes
de discar o número de Catarina Martins.
O PCP e o BE não são partidos
como os outros. Por vezes, diz-se que são partidos de “protesto”. Não: são partidos
revolucionários. Têm, por razões históricas, um lugar na democracia e são
partidos legais, mas a constituição só lhes interessa na medida em que poderem
dizer que os outros a atacam. No fundo, esta constituição ou o Estado social
não representam os seus fins últimos. Aquilo que sempre os animou foi a ruptura
violenta com a democracia pluralista (“a ditadura da burguesia”) e a economia
de mercado (o “capitalismo”). Até 1976, foram claros nesses objectivos. Quando
deixou de haver “condições objectivas” para a revolução, trataram muito
oportunisticamente de manter viva a chama, à espera de melhores tempos. Têm
explorado, com disciplina, as posições institucionais conquistadas no PREC
(como os sindicatos) e a socialização esquerdista de certas gerações e
profissões no sector público. Vigiam, com uma fúria sectária, essas quintas de
opinião e de organização. De certo modo, é por causa deles que não há Podemos
nem Syriza em Portugal: com medo de perder o controlo, nunca deram espaço ao
tipo de movimentos alargados de contestação (como os Indignados) que sopraram o
balão da esquerda radical da Espanha.
Para os perceber, basta
ouvi-los. Por exemplo: o PCP e o BE falam muito de “esquerda” e de um “governo
da esquerda”. Mas quem seguiu a extraordinária rábula de Dupond e Dupont que
Catarina Martins protagonizou com Jerónimo de Sousa na RTP, terá certamente
reparado que o principal alvo das suas fúrias não é a direita, mas o maior
partido da esquerda em Portugal, o PS. Para Catarina Martins, o PS tem um
“alinhamento completo com o PSD e o CDS no que é essencial”; para Jerónimo de
Sousa, o PS seguiu sempre “uma política de direita”, diferente do PSD e do CDS
apenas em “ritmo” ou “grau”. Esta raiva ao PS tem uma grande razão de ser: um
dos maiores obstáculos à revolução está em que a maior parte da opinião
“progressista”, de “esquerda” se reconhece, através do PS, no pluralismo
democrático e na livre iniciativa dos cidadãos. A destruição do PS ou a sua
redução a um novo MDP-CDE é assim uma condição básica para a promoção
revolucionária. É por isso que, como António Costa notou no debate com Catarina
Martins, eles têm tanto interesse como a direita em propalar que, “no actual
sistema”, “não há alternativa”. O que lhes interesse é sair do sistema, não é
arranjar alternativa.
As “políticas” não são para
eles muito importantes, ao contrário do que acontece para os partidos de
governo da democracia. Fundamentalmente, apoiam tudo o que lhes pareça ter
potencial para abalar o sistema: desde uma segurança social sem financiamento até
à imigração sem limites. Não o fazem, porém, sem os devidos cálculos. Por
vezes, diz-se que o PCP quer a saída do euro, ou que o BE quer o repúdio da
dívida. Mas quem tem acompanhado a peregrinação de Catarina Martins e Jerónimo
de Sousa pelas televisões já terá descoberto que não é bem assim: o PCP,
afinal, propõe apenas “o estudo e a preparação” da “hipótese” de saída do euro;
o BE pretende simplesmente discutir e negociar com os credores, para determinar
que parte da dívida é “legítima”. Não há mistério nem moderação aqui: o PCP e o
BE não podem esconder que a bancarrota e a inflação teriam custos muito maiores
do que a austeridade, como aliás António Costa disse a Catarina Martins. E
poupam-se, muito sensatamente, ao trabalho de defender, em véspera de eleições,
o que lhes serve apenas para se distinguirem circunstancialmente dos outros
partidos. Não há aqui “idealismos” nem romantismos. A revolução perdoou sempre
o cinismo dos revolucionários.
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Não publicamos comentários de anônimos/desconhecidos.
Por favor, se optar por "Anônimo", escreva o seu nome no final do comentário.
Não use CAIXA ALTA, (Não grite!), isto é, não escreva tudo em maiúsculas, escreva normalmente. Obrigado pela sua participação!
Volte sempre!
Abraços./-