sábado, 19 de dezembro de 2015

Daltonismo estatístico-ideológico

Jacinto Flecha 

Você sabia que só os 10% mais ricos comem tudo o que podem, e os 90% mais pobres comem o resto? Não sabia!? Mas esta afirmação é muito natural. Muito normal também, pois todos se alimentam como querem e como podem. Os donos de muito dinheiro só comem os alimentos que podem comer, não conseguem ir além disso, e o mesmo acontece com os outros.

Será que a estatística lhe deu a impressão de injustiça? Claro que deu, pois foi feita para isso. Numa formulação demagógica como essa, os ricos parecem injustos, exploradores. Quem ouve coisas assim imagina cenas dantescas, onde miliardários obesos esbanjam fortunas com alimentos caros, enquanto multidões de proletários esquálidos e famintos mal conseguem se alimentar.

Um milionário paulistano, cuja única atividade era consumir a fortuna herdada, precisou defender-se dos críticos, e afirmou que cada um dos seus hobbies – boa alimentação e colecionar carros antigos, por exemplo – gerava empregos para cinco pessoas. Tanto ele como os seus empregados comiam o que podiam comer, com o dinheiro disponível, e ainda sobrava para as outras despesas. A alimentação de muitos deles, por sua própria função, era a mesma do patrão rico. Muito natural e normal.

Comparações tendenciosas como essas, sempre com forte carga igualitária, são repetidas por aí como arma para a luta de classes. É flagrante a ausência de base estatística confiável, e as fontes nunca são reveladas. Em outras palavras, não passam de chutes. Tão falsas quanto outras que mudassem apenas o ponto de corte. Por exemplo, de um lado 10, 20, 30, 40, 50 por cento; de outro lado, 90, 80, 70, 60, 50 por cento, respectivamente. Para dar mais aparência de exatidão, alguns chegam ao requinte de incluir alguns decimais. Um literato, tão confiável em assuntos de estatística quanto quem inventou a dos 10 contra 90, fez a clivagem em 50, e decretou: Metade da população passa fome, a outra metade faz regime.

Qual a diferença entre os dois chutes estatísticos? Em rigor, nenhuma diferença, mesmo porque ambos são inventados, têm apenas a credibilidade que se pode atribuir a chutes. O primeiro contém forte ranço igualitário, e no outro está evidente o objetivo humorístico, contrapondo dois tipos de fome – uma por escassez de alimentos, a outra por autopunição com objetivos estéticos.

Por que estou tomando o seu tempo com estatísticas inexistentes, que nem sequer obedecem ao método científico de avaliação dos dados? Meu objetivo é chamar a atenção do leitor para a manipulação abusiva de números, geralmente apresentados como dados indiscutíveis. Posições ou propostas de caráter esquerdista se sustentam frequentemente com base neles, visando influir nas pessoas quando se discutem pontos de vista ideológicos. Ficarei contente se conseguir que o leitor não se deixe iludir por tais manipulações.

Quando demagogos esquerdistas deblateram a favor da reforma agrária, por exemplo, não é raro tirarem da cartola coelhos como este: 10% de latifundiários exploram 90% das terras, enquanto 90% de miseráveis derramam seu suor em apenas 10%. Por que uns derramam suor, enquanto outros exploram? Onde fica o limite entre latifundiários e miseráveis? De onde saíram esses dados? Não ouse pedir ao demagogo tais informações, pois se arrisca a receber dele torrentes de desaforos acusatórios, lançados a fim de livrar-se das perguntas incômodas, sem dar nenhum esclarecimento.

Na atual controvérsia ambientalista sobre poluição e aquecimento global, os decepcionados herdeiros do fracassado regime comunista mudaram um pouco a cantilena antiga, mas prosseguem jogando pobres contra ricos. Batucaram longamente sobre o consumo predatório das reservas mundiais de petróleo – os 10% mais ricos consumindo 90% do petróleo mundial, ou algo assim – mas já se cansaram da música, pois as reservas de petróleo não param de crescer. Quanto maior o consumo de petróleo, mais fontes de petróleo aparecem. A ponto de um potentado do mundo petrolífero afirmar que a era do petróleo não terminará por falta de petróleo, da mesma forma que a idade da pedra lascada não terminou por falta de pedras.

Diante desses fatos indiscutíveis, os esquerdistas passaram a acusar os 10% mais ricos de poluir o mundo dos 90% mais pobres. Trauteiam também que o planeta vai ser destruído pelo CO2 que os ricos despejam no ar.

Sofrem de um curioso daltonismo, esses esquerdistas. Durante décadas a fio, empenharam-se em propagar como solução para o mundo uma revolução vermelha. Fracassou esta quando o mundo ocidental não comunista já estava em plena onda verde do agronegócio, caminhando decididamente para saciar a fome mundial. Mas o progresso inegável do agronegócio, gerador de empregos e alimentos, passou a ser incriminado por eles como fator de poluição ambiental e aquecimento global. Tudo indica que o verde deles não é o mesmo que conhecemos. Deve ser por daltonismo, deficiência genética sem remédio e sem conserto.

Estamos próximo do Natal, e ocorreu-me sugerir aos ecologistas mudar a roupa do Papai Noel de vermelho para verde. Seria muito propagandístico, e também uma boa oportunidade para mudar de mentalidade.

Que tal presentearem a humanidade com algum progresso (verde, que seja), ao invés de criticar qualquer progresso? 
Título e Texto: Jacinto Flecha, 19-12-2015

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