Nuno Melo
Augusto Santos Silva diz-se do
"povo", quando ser do povo interessa. E socialista, claro. Porque em
eleições, ser-se socialista, com o chavão de que se é do povo - mesmo que
aristocráticos os gostos e os vícios - rende mais. É ministro dos Negócios
Estrangeiros.
E, ficou a saber-se, não gosta do Tony Carreira.
O cantor foi condecorado pelo
Estado francês com o título de Cavaleiro da Ordem de Artes e Letras,
considerado o "serviço prestado à cultura do país e às relações com
Portugal". A distinção, à altura de poucos, teve precedentes na
inigualável Amália Rodrigues, David Bowie ou Bob Dylan.
Orgulhoso das origens, Tony
Carreira solicitou que a cerimónia tivesse lugar na Embaixada de Portugal em
Paris. O Embaixador recusou. Mas criado o incidente, o ministro optou pela
graçola, dizendo: "Nunca consegui cumprir um dos meus sonhos sociológicos
que foi assistir a um concerto de Tony Carreira, porque me dizem que é um dos
acontecimentos que um sociólogo deve observar".
Interpretando; ufano, o senhor
professor, que é ministro, quis colocar no lugar o cantor popular, emigrante de
origem humilde, nascido na Pampilhosa da Serra, pelo topete da crítica em área
da sua tutela. Recorreu à tirada irónica feita de soberba, vaidade e de
preconceito. E desdenhou como insólito e digno de estudo, que Tony Carreira
possa arrastar mais multidões em concerto do que o PS em comícios.
Trata-se, sublinhe-se, de quem
superintende o Instituto Camões, instrumento da política cultural externa e tem
responsabilidades no Conselho das Comunidades Portuguesas.
Como o ministro, também não
conheço as músicas do Tony Carreira, nem lhe assisti a concertos. Mas o facto
não invalida o reconhecimento do óbvio. É português. Ascendeu com esforço no
elevador social.
Venceu por si, sem
reivindicações de subsídios a governos e entidades da cultura. Enche casas de
espetáculo, do Pavilhão Atlântico ao Olympia de Paris. Acumulou discos de
platina e vendeu milhões de álbuns. Conquistou o afeto da França, país
estratégico no relacionamento com Portugal. E merecia maior respeito.
Já agora, aconselha-se ao
governante a consulta da página da Embaixada de Portugal em França. Lerá que
" (...) procuramos ir ao encontro de quantos se interessam por Portugal,
pela sua cultura, pela sua história e também pelo país que hoje somos, moderno
e virado para o futuro".
A França interessou-se por
Tony Carreira.
A Embaixada, coisa diferente
de Portugal, não foi ao encontro da França e virou as costas ao artista. Fez
mal. Mas tudo medido, Augusto Santos Silva foi capaz de bem pior.
Parabéns, Tony Carreira.
Título e Texto: Nuno Melo, Jornal de Notícias, 21-1-2016
O atual embaixador de Portugal
na França foi Chefe de Gabinete do ex-presidente Jorge Sampaio.
Relacionados:
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Não publicamos comentários de anônimos/desconhecidos.
Por favor, se optar por "Anônimo", escreva o seu nome no final do comentário.
Não use CAIXA ALTA, (Não grite!), isto é, não escreva tudo em maiúsculas, escreva normalmente. Obrigado pela sua participação!
Volte sempre!
Abraços./-