sábado, 2 de julho de 2016

Pré e pós impeachment

Cesar Maia

1. É uma unanimidade entre os politólogos que a relação de representação entre o eleitor e o parlamentar é muito baixa. Aí estão as pesquisas de memória do voto que demonstram isso. E as pesquisas que mostram que os eleitores não se sentem representados pelos deputados e senadores.

2. Dizem os deputados federais seniores que o Congresso não vota contra a opinião pública. Bem, se é assim, sempre que a opinião pública se cristaliza em ampla maioria em torno de uma decisão, a relação de representatividade dos parlamentares é muito alta. Não importa qual a causa e qual o efeito. Nesses casos ocorre uma alta correlação.

3. O processo de impeachment é uma clara demonstração disso. Quase milimetricamente a proporção de votos de deputados e senadores a favor do impeachment é igual à proporção dos eleitores que apoiam o impeachment de Dilma. Os números da Câmara 71,5% igualam os das pesquisas pró-impeachment. A projeção dos votos dos senadores pró-impeachment é a mesmíssima.

4. Nesse sentido em relação ao impeachment há uma lua de mel entre representantes e representados – nessa ordem ou na ordem inversa – não importa. As voláteis redes sociais que se mobilizaram pelo impeachment se sentem representadas pelo voto dos parlamentares e o impedimento de Dilma.

5. Mas a partir do dia seguinte ao impeachment o quadro certamente não será o mesmo. A começar do PT/PCdoB/CUT/MST. A sincronização entre todos está na campanha “é golpe” em defesa do mandato de Dilma e, é claro, de seus empregos e subsídios. Mas estão longe de ter unidade em relação ao dia seguinte. Uns querem se afirmar nitidamente à esquerda, voltar às origens e radicalizar o discurso, a postura de oposição e mobilizarem-se nesta direção.

6. Outros, convencidos pela prazerosa experiência que tiveram no governo, acham que o melhor é apostar na alternância de poder contando com o desgaste do governo – deste ou do próximo. Ou seja, realizar uma oposição parlamentar firme numa linha de centro-esquerda-esquerda. Claro, são posturas nítidas, que na prática se subdividem conforme o momento e o tema.

7. E as divisões pós-impeachment não serão menores – quem sabe bem maiores – entre os que defenderam – eleitores – e parlamentares – e apoiaram e votaram pelo impeachment. O governo Temer é naturalmente híbrido. O núcleo governamental é liberal liderado pela equipe econômica. Questões como rigor fiscal, (que atinge servidores e estados e municípios), como privatizações, como rigor anti-inflacionário, tenderão a se desdobrar em matizes políticas, a favor e contra.

8. Como O PSDB vai se posicionar se esse núcleo prevalecer e dar ao governo uma marca de centro-direita? Provavelmente dependerá dos resultados: quanto mais sucesso, mais adesão, e vice-versa. Como os pré-candidatos a presidente 2018 vão reagir? E como toda uma maioria de deputados pragmáticos, se comportará, especialmente quando 2018 chegar e sinalizar riscos para seus mandatos? O “Centrão” – que sugere ter uma maioria na Câmara de Deputados – manterá a unidade que tem hoje, e que aumenta o seu poder de barganha, ou frente a frente a um governo definitivo e a naturais conflitos de expectativa, se fragmentará? E como o Temer-definitivo vai administrar essa relação?

9. Ou seja, o processo de impeachment dá uma enorme unidade aos que estão a favor de um lado e os que estão contra de outro lado. E depois? Haverá tempo até 2018 para se consensuar que o governo Temer deu certo? E se esse sucesso for parcial quais serão os desdobramentos políticos – e político-sociais e nas redes sociais? Esse sim é um bom exercício de cenários para os cientistas sociais. 
Título e Texto: Cesar Maia, 30-6-2016

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