Luiz Carlos Azedo
A Operação Lava-Jato atingirá um novo
patamar com as delações premiadas de Marcelo Odebrecht e Léo Pinheiro (OAS)
“O único meio de salvar e
engrandecer o Brasil, é tratar de colocá-lo em condições de poder ele tirar de
si mesmo, quero dizer, do seio de sua história, a direção que lhe convém. O
destino de um povo, como o destino de um indivíduo duo, não se muda, nem se
deixa acomodar ao capricho e ignorância daqueles que pretendem dirigi-lo.” O
“estalo de Vieira” do sergipano Tobias Barreto (1839-1889), no ensaios Questões
vigentes, permanece atualíssimo. Notável orador, filósofo e professor de
direito, germanista ao seu tempo, patrono da cadeira 38 da Academia Brasileiro
de Letras, por indicação de seu amigo Sílvio Romero, Barreto, um dos expoentes
da chamada Escola do Recife e precursor do pensamento social no Brasil.
O impeachment da presidente
afastada, Dilma Rousseff, que deve se consumar a partir do dia 25, quando
começará seu julgamento pelo Senado, encerra um ciclo de experimentalismo
político e econômico de esquerda no Brasil, que se esgotou porque o projeto do
ex-presidente Lula e do PT estava referenciado em ideias nacionais
desenvolvimentistas e socialistas derrotadas historicamente no século passado,
além de alicerçadas em práticas políticas pautadas pelo populismo, pelo
fisiologismo e pela corrupção. Além disso, o voluntarismo de Dilma, que tentou
mudar o destino do país com “capricho e ignorância”, resultou na mais longa e
profunda recessão de nossa história, agravada por uma crise ética cujos
desdobramentos ainda estão por vir do ponto de vista dos partidos e do sistema
eleitoral. É nesse contexto que o presidente interino, Michel Temer, será
efetivado no cargo e precisará tirar da história do país, como diria Tobias
Barreto, e não da “transa” política, o rumo seguro para consolidar seu governo
e conduzir o país às eleições de 2018.
O julgamento de Dilma Rousseff
deve durar uma semana, tempo suficiente para que Temer possa realizar sua
primeira viagem oficial e representar o país na reunião do G-20, em 4 e 5 de
setembro, na China, sinalizando para o mundo que a crise política no país foi
superada. Entretanto, até lá, outra tarefa de grande envergadura precisa ser
realizada: avançar com o ajuste fiscal pelo Congresso, cujo primeiro passo
efetivo foi a aprovação da lei que limita os gastos públicos pela Câmara. Nesse
quesito, ficou evidente o poder das corporações e sindicatos de servidores
públicos, que conseguiram barrar a tentativa da equipe econômica de limitar
aumentos salariais e contratações de pessoal pela União, estados e municípios.
O país não produz riqueza
suficiente para bancar os custos de uma estrutura governamental cujos serviços
deixam muito a desejar e que acabam por formar uma casta de privilegiados em
relação ao restante da sociedade. Essa questão será objeto de outra batalha
difícil: a reforma da Previdência, cujo deficit cresce exponencialmente,
colocando em risco as futuras gerações. As duas medidas são estruturantes para
a economia voltar a crescer, revertendo uma recessão que no semestre foi de
5,6%. Apesar do otimismo gerado pela aprovação do impeachment, o afastamento
definitivo de Dilma, por si só, não muda o cenário econômico, ainda que seja
fundamental para que os investimentos estrangeiros voltem a apostar no Brasil.
Qual será o recado de Temer quanto a isso na China? Dessa resposta dependerá em
parte a postura dos investidores e líderes mundiais quanto à economia
brasileira. O Brasil precisa modernizar a economia e reformar o Estado.
Crise ética
Outra incógnita no processo é
o futuro da crise ética. A Operação Lava-Jato atingirá um novo patamar com as
delações premiadas de Marcelo Odebrecht e Léo Pinheiro (OAS), que prometem
denunciar todos os políticos que receberam dinheiro do caixa dois das empresas,
com as respectivas provas materiais. A expectativa quanto a isso é enorme, uma
vez que o establishment político como um todo será atingido. A cassação do
mandato do deputado Eduardo Cunha, cuja votação está marcada para 12 de
setembro, aumenta ainda mais a tensão política porque é muito provável que ele
recorra à delação premiada e revele os nomes dos políticos que ajudou nas
campanhas eleitorais, atingindo em cheio o PMDB e o governo. Outra possível
delação explosiva parece ser a do pecuarista José Carlos Bumlai, amigo do
ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
O sinal de que o sistema
partidário — e não apenas o PT — pode estar entrando em xeque foi dado pelo
presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Gilmar Mendes, que abriu
investigação sobre o envolvimento do PT, do PMDB e do PP na Lava-Jato. Pela
legislação atual, dependendo da gravidade dos crimes que forem comprovados,
partidos políticos podem ter seu registro cassado.
Título e Texto: Luiz Carlos Azedo, Correio Braziliense, 14-8-2016
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