Luiz Carlos Azedo
Não há saída de curto prazo para a
economia, só há uma luz no fim do túnel na política: as eleições de 2018
Certa vez, o ex-prefeito carioca
César Maia, fazendo uma autocrítica de sua gestão, disse que o seu maior erro
foi dar uma entrevista no exterior sobre a situação da cidade depois de um
temporal que havia inundado vários bairros do Rio de Janeiro. Os estragos eram
maiores do que a habitual capacidade de resposta da administração, o que ele só
descobriu quando chegou. É mais ou menos a situação do presidente Michel Temer
em relação às manifestações de protesto contra seu governo: no exterior,
avaliou mal o que estava acontecendo.
O Palácio do Planalto precisa
se convencer de que está diante de uma oposição dura e organizada, formada por
forças que estão encasteladas em muitos órgãos e repartições federais e
controlam os movimentos sociais, dos sem-teto e sem-terra às principais centrais
sindicais. Além disso, o PT não luta pela volta da presidente Dilma Rousseff,
cuja saída do Palácio da Alvorada foi vista com alívio por deputados e
senadores da legenda, apesar da retórica contra o impeachment. Luta para
desestabilizar o governo Temer, mobilizando outras forças e setores
insatisfeitos com a crise.
Até agora, a maioria da
população não aderiu aos protestos contra o governo, embora os índices de
aprovação sejam baixíssimos. Os trabalhadores também não estão engrossando os
protestos, quando nada porque o desemprego bate à porta das famílias. Mas as
corporações da alta burocracia, servidores públicos e funcionários de estatais
já sentiram o cheiro de animal ferido e logo começarão a pressionar o governo.
A greve dos bancários deflagrada ontem, alavancada pelos funcionários do Banco
do Brasil, será um bom termômetro do ânimo da tropa.
Na cozinha do Palácio do
Planalto, criou-se o fetiche de que a aprovação definitiva do impeachment
funcionaria como uma espécie de bálsamo milagroso, tanto do ponto de vista da
economia como da política. A forma como foi aprovado pelo Senado, porém,
mostrou que a situação não é bem essa. Dilma Rousseff foi poupada de uma
punição mais dura, ao preservar o direito de exercer cargos públicos, numa
votação que serviu também para mostrar que o presidente Temer não pode contar
com o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), que tem a sua própria
política. Ou seja, existe um polo de poder no Congresso que não está alinhado e
pode surpreender em momentos decisivos.
Os ministros do chamado núcleo
duro do governo também ainda não se convenceram de que não são um governo de
salvação nacional, mas um governo de transição, cuja legitimidade é dada pelo
fato de que Michel Temer foi escolhido vice pela presidente deposta e com ela
foi eleito, sendo, por isso mesmo, o seu sucessor legítimo em caso de
impeachment. Numa situação como essa, a sustentação popular dependeria de uma
operação política das mais complexas, ou seja, recompor a sua base conquistando
o apoio dos que faziam oposição ao governo e tendo como adversários os
ex-aliados majoritários. Isso não acontecerá no curto prazo; quiçá, só no final
do governo, se for bem-sucedido.
O pirão
Talvez seja um grande equívoco
supor que tudo se resolverá com o ajuste fiscal e as reformas propostas para a
economia, principalmente a da Previdência e a trabalhista. No mundo inteiro,
essas reformas foram feitas a fórceps, por governos eleitos para isso, como na
Inglaterra de Margareth Thatcher, ou que se depararam com situações ruinosas
após as eleições, caso recente da Grécia de Aléxis Tsipras. O Brasil não está
numa situação, nem noutra. Não há saída de curto prazo para a economia, só há
uma luz no fim do túnel na política: as eleições de 2018. A manutenção do
calendário eleitoral é o melhor antídoto contra a narrativa do golpe. O
problema é como aprovar as reformas e chegar até lá com as forças que aprovaram
o impeachment unidas.
Não haverá grande apoio
popular às medidas de ajuste fiscal, esse apoio somente virá depois, se as
mudanças na economia resultarem em mais investimentos, mais oportunidades de
negócios e mais empregos para a maioria. O sucesso do governo depende mesmo é
de apoio político no interregno entre as eleições municipais e a sucessão de
Temer. Esse apoio, porém, não será possível se o PMDB e outros partidos da
antiga base governista atuarem como faziam no governo Dilma, ou seja, na base
do “farinha pouca, meu pirão primeiro”, esperando que a antiga oposição lhes dê
sustentação só porque apoiou o impeachment. A opinião pública está com ojeriza
a tudo o que acontece em Brasília.
Ou seja, por mais que o
presidente Michel Temer ande discutindo a relação com os aliados, é preciso que
as forças que o apoiam tenham uma agenda pactuada, ainda que o preço disso seja
reduzir a sua amplitude. Essa agenda ainda não está clara, tanto que o governo
enfrenta dificuldades para aprovar as propostas mais estratégicas do ajuste
fiscal — como o teto para os gastos públicos — por falta de apoio da sua
própria base.
Título e Texto: Luiz Carlos Azedo, Correio Braziliense, 7-9-2016
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