Aparecido Raimundo de Souza
1
Hoje acordei com 64.
Quem diria, seis décadas e meia! Nossa, parece que foi ontem, completava
vinte...
Tempo bom e de muitas
alegrias! A mocidade fluía de dentro do meu peito com uma intensidade elegante.
E o mundo, bem, o mundo, à minha volta, era apenas o começo de uma estrada
longa, cujo destino ignorava completamente.
2
Já naquela época,
havia dois caminhos à frente: um inteiramente desconhecido, misterioso,
secreto, o outro também. Qual seguir? Que direção tomar? Qual pedaço de chão me
conduziria à vida plena, ao sucesso que todo rapaz no albor da juventude
almejava?
3
Naqueles idos, a gente
podia exercer livremente o livre arbítrio, esse alvedrio que todos carregamos,
ou o poder de decidir sem maiores complicações o próprio destino sem a
interferência de terceiros. Segui, pois,
aquele carreiro que me pareceu o mais bonito e cheio de paisagens formosas,
onde um céu muito azul e sem nuvens parecia se encontrar com o horizonte lá
adiante, tão amplo e vasto como a minha jornada incerta e obscura.
4
Passei por altos e
baixos, vivi intensamente cada segundo desses dias, amei, fui amado, desprezei,
fui desprezado, chorei e fiz chorar. A eterna lei do retorno sempre presente,
não atropelando, mas ensinando que o que aqui se faz de bom, volve em bônus de
venturas e empolgamentos, como o que se planta de ruim, vem em forma de
tempestades violentas com relâmpagos irados riscando a amplidão e, sobretudo,
mostrando que uma força superior está atenta, dia e noite, de olhos abertos,
observando, conferindo, investigando os mínimos detalhes, apesar do domínio e
do controle de todos os poderes que nos são destinados pelo Pai Maior.
5
Evidentemente, convivi
com dias de completa magnificência, onde do acordar ao voltar a dormir, do sair
às ruas e retornar, dava tudo certo, como um relógio novo, e, ainda não usado,
como se uma varinha mágica de condão fosse fazendo as honras.
6
Igualmente fui
presenteado com momentos de ventos perversos, onde uma série de turbulências
inexplicáveis chegaram para marcar presença, assim como passei por pessoas me
dizendo um monte de “nãos” e portas sendo fechadas. Cruzei com criaturas me
virando o rosto, pressenti meu barco perdendo o rumo em mar proceloso, e o
tempo, meu tempo, se esvaindo, se desmanchando, sem atinar com um porto certo
onde ancorar com a tranquilidade almejada.
7
Muitos altos e baixos,
mais baixos que altos. Pedrinhas no sapato atrapalhando os passos, saudades
ingratas, muitas dores, seguidas de perdas irreparáveis. Contudo, equilibrando
os pratos da balança, ventos calmos sopraram benfazejos. Promessas tomavam
formas distintas, sonhos se abriam em realidades e dissiparam longos véus,
enquanto luzes iam se acendendo, rapidamente, no final de cada túnel escuro que
aparecia à minha frente.
8
De repente, a linha da
minha vida ainda a ser percorrida parecia não ter mais fim. Vezes houve em que
desejei ardentemente parar, dar meia volta e retornar ao ponto de partida. Mas
não havia mais ponto nem como voltar...
9
Como seria bom me ver
de novo dentro daquele menino de calças curtas, o moleque travesso que fazia
artes e deixava a mãe de cabelos em pé. Vezes sem conta, igualmente vivi em que
desgostoso de estar neste mundo, procurava a morte para finalizar com a
existência. Mas um Deus bondoso sinalizava que precisava seguir em frente, de
cabeça erguida, tropeçando, caindo, levantando, mas seguindo sempre adiante,
firme e forte, confiante na convicção de que um dia a esperada flor da bonança
nasceria num jardim encantado, e despejaria o perfume inebriante e mostraria a
felicidade tanto tempo almejada.
10
Não fui muito bom,
confesso. Não honrei a felicidade, ou os dons que recebi como o sopro perene da
vida, a saúde, os olhos perfeitos, os braços e as pernas. Não fui muito bom
comigo, verdade seja dita. Matei, aos poucos, desejos provindos de generosas
fontes, afoguei num poço de lamas meus devaneios mais simples. Fugi da
esperança, do amor, tranquei portas e janelas, criei uma redoma de vidro e me
pus lá dentro, como um bicho enjaulado, igual preso condenado ao corredor da
morte. Mas segui...
11
Apesar de tudo isso e
dos percalços enfrentados pela longa estrada, consegui chegar até aqui. À casa
dos sessenta e quatro. Graças a Deus, inteiro, sem precisar ter que parar em
hospitais, sem ser acometido de alguma doença que merecesse cuidados mais
específicos. Seis décadas e meia não são para qualquer um. Quero crer, e na
verdade creio, seis décadas e meia são para os fortes de espírito, para os que
lutam dia a dia por melhores horizontes. Sou pai de seis filhos maravilhosos:
Érica, Eduardo, Narjara, Amanda, Luana e Antonella.
12
Meus rebentos queridos
e amados estão aí, a pleno vapor, gozando saúde. Todos bem, vivendo a
felicidade absoluta de estarem vivos e de terem um pai batalhador, presente
(ainda que espevitado, meio louco das ideias), para dar a benção todos os dias
e desejar sucesso na escola. Acho que posso me considerar um cara feliz, um
sujeito de sorte em todos os sentidos que a felicidade possa vir a ser
expressada.
13
Tenho, por
conseguinte, meus pais vivos e com saúde, uma mulher maravilhosa que me ama e
me faz sentir plenamente realizado. Que
mais posso querer ou desejar? Que mais posso pedir ao Criador, senão agradecer
a Ele, do fundo da alma, por tudo de bom que consegui nessa longa corrida para
chegar até aqui?
14
Gostaria de
transcrever um texto de Robert Frost, meu poeta favorito, “The rod not taken”, cuja tradução livre para o português, seria: “O Caminho
não percorrido”. Tenho certeza, essa poesia, ou melhor, a mensagem que ela
traz, fará o mesmo bem para todos que tiverem a oportunidade de ler meus
textos, meus livros e ouvir as minhas músicas.
15
Do fundo do meu
coração espero que essa poesia acenda a chama apagada de cada um em particular,
notadamente de meus amigos e leitores, e que o fogo da felicidade mantenha a
vida e a sua alma de todos vocês, aquecida
ad aeternun.
16
Two
roads diverged in a yellow wood,
Num bosque amarelo dois caminhos se separavam,
And
sorry I could not travel both
E lamentando não poder
seguir os dois
And
be one traveler, long I stood
E sendo apenas um
viajante, fiquei muito tempo parado
And
looked down one as far as I could
E olhei para um deles
tão distante quanto pude
To
where it bent in the undergrowth;
Até onde se perdia na mata;
17
Then
took the other, as just as fair,
Então segui o outro,
como sendo o mais merecedor
And
having perhaps the better claim,
E tendo talvez melhor direito,
Because
it was grassy and wanted wear
Porque coberto de mato
e querendo uso
Though
as for that passing there
Embora os que por lá
passaram
Had
worn them really about the same,
Os tenham realmente
percorrido de igual forma
18
And
both that morning equally lay
E ambos ficaram esta
manhã,
In
leaves no step had trodden black.
Com folhas que passos nenhum pisou.
Oh,
I kept the first for another day!
Oh, guardei o primeiro
para outro dia!
Yet
knowing how way leads onto way,
Embora sabendo como um caminho leva para longe,
I
doubted if I should ever come back.
Duvidasse que algum dia voltasse novamente.
I
shall be telling this with a sigh
Direi isto suspirando
19
Somerwhere ages and
ages hence;
Em algum lugar, daqui a muito e muito tempo;
To
roads diverged in a wood, and I-
Dois caminhos se separam em um bosque e eu...
I
took the one less traveled by,
Eu escolhi o menos percorrido,
And
that made all the difference.
E isso fez toda a diferença.
20
Pelo que aqui deixei
posto, minhas senhoras e meus senhores, só me resta concluir dizendo o
seguinte: viva eu, Aparecido Raimundo de Souza, nascido aos l9 de março de
1953, no dia de São José, pai adotivo de Jesus, sob o signo de peixes, o último
do zodíaco. Oxalá possa ainda apagar muitas velinhas vida afora, escolhendo
muitas e muitas trilhas, atalhos e veredas que me levem sempre em busca do
sucesso de mim mesmo...
E, claro, da
FELICIDADE QUE TODOS OS DIAS IRROMPE MAIS PUJANTE, BROTA MAIS ENÉRGICA E
ENCORPADA DENTRO DO MEU CORAÇÃO EM FESTA.
AVISO AOS NAVEGANTES:
SE O FACEBOOK, CÃO QUE FUMA, PARA LER E PENSAR OU OUTRO SITE
QUE REPUBLICA NOSSOS TEXTOS, POR QUALQUER MOTIVO QUE SEJA, VIEREM A SER
RETIRADOS DO AR, APAGADOS OU CENSURADOS PELAS REDES SOCIAIS, O PRESENTE ARTIGO
(COMO OS DEMAIS QUE FOREM PRODUZIDOS), SERÁ PANFLETADO E DISTRIBUÍDO NAS
SINALEIRAS, ALÉM DE INCLUÍ-LO EM NOSSO PRÓXIMO LIVRO “LINHAS MALDITAS” VOLUME
3.
Título
e texto: Aparecido Raimundo de Souza, jornalista. Do
Sítio ”Shangri-La” – Um lugar perdido no meio do nada. 19-3-2017
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ResponderExcluirLembra patrão, quando ao completarmos nove anos trabalhando juntos eu lhe fiz essa homenagem? Pois é, corria o ano de 2011. Você com 58 anos e eu entrando na casa dos 23. Que confusão causou essa homenagem! Minha nossa! Todos os nossos amigos e familiares, sem exceção, caíram em nossa pele, dizendo que tínhamos um caso.
Baseados na música que escolhi para o vídeo, todos foram unanimes em afirmar que não era uma homenagem de uma simples secretária a seu patrão pelos anos de dedicação, mas, uma DECLARAÇÃO DE AMOR. O tempo passou, e aqui estamos, quase a completar 15 anos de vida profissional em comum.
As pessoas que se diziam nossas amigas, que frequentavam nossas casas, se foram. Sequer deixaram lembranças. Bem recordo, papai, quando você foi falar com ele, pedindo para me deixar viajar com você, ele disse: “A mãe dela está meio assim, desconfiada. Nossa menina é muito jovem. Mas a palavra final por aqui é a minha. Fui com a sua cara. Deixo meu amigo. Ela pode ir. Mas cuidado. Minha princesa é filha única, está indo em uma e não quero que volte em duas”.
Você, brincalhão, como sempre questionou papai, militar severo, austero, que negócio era aquele de “ir em uma e voltar em duas?”. Ao que ele, muito furioso, lhe respondeu, enquanto com as mãos, fazia contornos na própria barriga: “Você entendeu exatamente o que eu quis dizer”. E quando no leito de morte, em abril de 2015 no hospital, as suas derradeiras palavras foram: “Pois é meu rapaz! Pena que você me obedeceu ao pé da letra e não me deu um neto”.
Hoje, as portas de completarmos 15 anos, você com 64, eu com 29, aproveito essa oportunidade dentro desse texto maravilhoso que você escreveu (64 aos 19) para lhe desejar ainda que atrasado, muita saúde, muita esperança, muita paz, muitas alegrias e sucesso pleno. Que você continue sendo esse patrão maravilhoso, essa pessoa que amo como profissional, que amo com todas as forças de meu coração.
A você eu devo o meu primeiro emprego, a primeira oportunidade, os primeiros passos para conhecer o mundo que se descortinava além da porta da minha sala e que até então eu só sabia que existia do portão pra dentro. Parabéns pelos 64 anos, parabéns pelos nossos 15 anos trabalhando juntos. Se você não me mandar embora, a ideia e ficar a seu lado por mais 15, mais 15, mais 15...
Aparecido, obrigada por você existir, por fazer parte da minha vida, do meu dia a dia.
Sua sempre, secretária e assessora de imprensa,
Carina Bratt.
https://www.youtube.com/watch?v=O4isRVDaPY8
Somente a título de informação.
ResponderExcluirYELLOW WOOD é uma expressão idiomática sobre as folhas amareladas do outono.
Para não escrever:
-
32/5000
Fall yellow leaves fall
Dois caminhos por entre as folhas amarelas do outono,