Péricles Capanema
O Brasil, chocado,
teve notícia da delação premiada do empresário Joesley Batista, um dos donos da
JBS, a gigante do agronegócio brasileiro. Deixo de lado o primarismo
intelectual, a linguagem chula e o deboche, pelo visto correntes em escolhidas
esferas do dinheiro e da política. Trato aqui da naturalidade com que o delator
relata telefonema de Lula para ele. O ex-presidente solicitava que João Pedro
Stédile o procurasse para pedir dinheiro para o MST; depois com a bufunfa —
antes certamente fácil nos governos Lula e Dilma, de momento escassa — iria
invadir fazendas, formar militância e promover quebra-quebra.
“Ele [Lula] me ligou
esses dias, pediu para mim [sic!] atender os sem-terra. Eu digo ‘ô presidente’ (risos).
‘Joesley, eu tô aqui com o [João Pedro] Stédile não sei o que ele precisa falar
com você’ … ’Tá bom, presidente, manda ele vir aqui. Eu atendo ele, tá bom’”. Para
nosso caso, importa pouco se houve o encontro.
Importa outra coisa. Um dos
maiores empresários do agronegócio, com inteira naturalidade, aceita dar
dinheiro para o MST, cujo fim confessado é o coletivismo no campo, o que
implica a destruição dos fazendeiros. Recordo abaixo a já muito divulgada
declaração de Stédile, marxista com ligações com a “Teologia da
Libertação”: “Nós, marxistas, lutamos junto com o papa para parar o
diabo”. O diabo, para Stédile, são “o capital financeiro, os
bancos, as grandes multinacionais. Os inimigos do povo são esses. Como diria o
papa, esse é o diabo”. Outra lembrança, a ameaça de Lula, em fevereiro de
2015, de colocar o exército do MST nas ruas: “Também sabemos brigar.
Sobretudo quando o Stédile colocar o exército dele nas ruas”. De passagem,
a JBS é uma grande multinacional.
Judas, na História, foi o
traidor prototípico. Chamar alguém de Judas, dois milênios após o ato infame,
ainda era o pior insulto (agora, tenho minhas dúvidas). Mas ele se sabia
traidor, agiu como traidor, teve fim consoante o crime inqualificável. Seu ato,
por gerações foi qualificado infame. Era corrente a vida moral ancorada em
noções claras de honestidade, coerência, abjeção, honra, decência, degradação,
aviltamento. Em muitos ambientes desapareceu sua nitidez. Examino um deles.
A atitude de Joesley, acima
mencionada, objetivamente atraiçoa os ruralistas. Alguém ouviu falar de
felonia? Clima hostil para tal. No geral, os comentários sobre o ato, quando
papocados, seguem na linha da distensão do delator: “Tá bom,
presidente, manda ele vir aqui. Eu atendo ele”.
Há laivo de chantagem da parte
de Lula, oportunismo do lado de Joesley. Um fazendeiro, decepcionado com as
lideranças rurais, me disse: “Difícil demais. Kátia Abreu, fogo,
apoiando o PT. O Joesley, pecuarista forte, dando dinheiro para o MST. Tem
isso, quando os agitadores do Stédile passarem na frente de uma porteira da
JBS, não vão invadir. Entram na próxima, de gente que não socou dinheiro neles”.
Método mafioso comum, os narcoguerrilheiros das FARC (Forças Armadas
Revolucionárias da Colômbia) utilizaram tal expediente, extorquiam empresários
contra promessa de não serem sequestrados. Poderá existir chantagem no caso do
MST? Não estou informado, fico longe de negar a possibilidade. Não é tudo,
porém. Em parte do público e dos participantes do drama formigam critérios
morais distantes da nitidez do preto e do branco. Zonas cinzentas. Bruxuleia
ali a noção de que certos limites nunca podem ser transpostos. E isso é de
importância sem medida para o futuro do Brasil.
Outra. Chegam notícias a todo
instante da tortura dos venezuelanos, manietados e esfomeados. Conhecemos
alguns dos responsáveis: Lula, PT, demais partidos de esquerda, Odebrecht, João
Santana, Mônica Moura. As campanhas eleitorais milionárias, responsáveis pelo
assalto ao poder dos torcionários Hugo Chávez e Nicolás Maduro, foram regadas
por dinheiro desviado do contribuinte brasileiro mediante o agora conhecido
mecanismo — revelado no bojo da Operação Lava-Jato — dos carteis,
superfaturamento, porcentagem de obras para bolso e campanha de dirigentes
favorecedores do comunismo. Já são quase vinte anos de sofrimento na Venezuela,
cuja responsabilidade em parte pesa nas costas do governo e de empresários
brasileiros. Onde a inconformidade com o apoio de grandes capitalistas e
empresas brasileiras ao coletivismo, sempre causador de miséria? É muito mais
grave que o mero roubo de dinheiro público.
“Todas as coisas têm o seu
tempo [...] há tempo de amor e tempo de ódio, há tempo de guerra, e tempo de
paz”, ensina o Eclesiastes. Agora é tempo da inconformidade nutrindo
reflexões que iluminem as raízes da crise. Na busca da clareza total
encontraremos a saída. Sem ela, passo a passo aumentará a desorientação dos
espíritos; daí, escorregarão facilmente para o cansaço, a indiferença e a
atonia. A seguir, rápido, teremos a rota aberta para aventuras e tragédias.
Não será a primeira vez.
Ocorre-me uma delas, a queda repentina da monarquia com o público em céu de
brigadeiro. Assim a descreveu Aristides Lobo, ministro do primeiro governo da
República: “O povo assistiu àquilo bestificado, atônito, surpreso, sem
conhecer o que significava. Muitos acreditaram seriamente estar vendo uma
parada”. O atual aviltamento acinzentado também bestifica o povo que
dele não se defender, para desgraça nossa.
E tudo isso, virará um amontoado de pizzas.
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