Cesar Maia
1. Na primeira “delação premiada” registrada na história
brasileira, o delator entregou todos os envolvidos. Na “Devassa da Devassa”, o
historiador Kenneth R. Maxwell - analisando em profundidade as razões, os fatos
e os desdobramentos da Inconfidência Mineira - demonstra que não se tratava de
nenhuma luta pela independência do Brasil.
2. Conforme Kenneth Maxwell, os principais articuladores do
movimento eram contumazes sonegadores e, por isso, encabeçavam a lista dos
devedores da dívida ativa da coroa portuguesa. A reação contra a derrama – aumento
do imposto sobre o ouro - serviu como pretexto, de forma a adensar o movimento.
3. Mas o objetivo básico era cancelar a dívida ativa dos
sonegadores, entre estes o Desembargador e poeta Tomás Antonio Gonzaga;
advogado e poeta, Alvarenga Peixoto; advogado, minerador e poeta Claudio Manoel
da Costa (que se suicidou); Coronel Comandante Joaquim Silvério dos Reis;
Cônego Luís Vieira da Silva, etc. Ao todo, 37 denunciados foram presos,
julgados e condenados, num processo que durou quase 3 anos.
4. Silvério dos Reis - contratador de entradas, fazendeiro e
proprietário de minas - participava intensamente da conspiração. Estava a par
de tudo. A partir de um certo momento, aceitou a proposta de delatar o
movimento. O fez através do que, no caso JBS, se chamou de “ação controlada”.
Registrou tudo. Em acordo com os investigadores, entregou tudo: nomes e fatos,
local de reuniões na casa de Cláudio Manoel da Costa.
5. Todos foram presos, até Silvério dos Reis, este por um período
curto, de forma a não chamar a atenção sobre a fonte das denúncias e os riscos
por estar junto com os demais. O acordo de delação premiada de Silvério dos
Reis tinha como elemento central o perdão de toda sua dívida ativa, a maior de
todas.
6. A leitura dos atos por crime contra o Estado – lesa majestade -
durou 23 horas. Todos condenados, a maior parte à morte. Os condenados reagiram
gritando. Mas, no final, foi lida uma decisão da Rainha Maria I de Portugal,
transformando as penas de mortes em degredos perpétuos, asilos temporais... O
cônego e os padres envolvidos tiveram uma pena “sigilosa”. Apenas o alferes
Tiradentes foi condenado à morte.
7. A delação seria premiada com gratificação em ouro; o
cancelamento de seu débito; o cargo público de tesoureiro da bula de Minas
Gerais, Goiás e Rio de Janeiro; uma mansão como morada; pensão vitalícia;
título de fidalgo da Casa Real; fardão de gala e hábito da Ordem de Cristo.
Nada disso foi cumprido.
8. No final, Silvério dos Reis ganhou liberdade e mobilidade, indo
a Portugal, à Europa, e voltando ao Brasil pobre, sofrendo ataques e, no final,
indo morar no Maranhão, sempre escondido pelos riscos pessoais. Faleceu em
1819, 30 anos depois do início de sua delação.
Título e Texto: Cesar Maia, 3-7-2017
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