quinta-feira, 14 de setembro de 2017

Quarenta

Sérgio Barreto Costa 

Hoje faço 40 anos. Contando com os anos bissextos, passei, até agora, 350 640 horas vivo. Dessas 350 640 horas, é provável que tenha gasto umas 116 880 a dormir, permanecendo de olhos abertos nas restantes 233 760. Devia ter assistido, até este dia, a 21 420 horas de aulas, mas como fiz a Universidade longe das saias da mãe e do regador de água fria do pai, apenas estive presente em 18 270, incluindo-se as 3 150 que sobram nas 116 880 acima referidas. Dediquei mais de 30 000 horas à “carreira profissional”, eufemismo de “trabalho”, algumas das quais, poucas, a fazer coisas realmente interessantes.

Apostei forte, nestes 40 anos, em filas. Entre as de trânsito, as dos supermercados, as dos bancos, as dos CTT e as da caixa de pagamento do Sardinha Biba, avalio em 6240 o número de horas destinadas a essa civilizada forma de organização social, inspirada, segundo lendas, nas tribos índias da América do Norte. Como só tive telemóvel em aproximadamente metade da minha vida, gastei apenas 800 ou 900 horas a dizer que não estava interessado no produto ou serviço que me tentavam afincadamente vender; sobrou-me assim mais tempo para levar a cabo os vários rituais de higiene que me foram transmitidos pelas gerações precedentes. Contando com banhos, lavagens de dentes, corte de unhas e manuseamento de desodorizantes, não é descabido um cálculo aproximado de 7300 horas para estes exercícios de urbanidade. Também não poupei no tratamento da correspondência e no relacionamento com os vários níveis do poder político-administrativo. Nunca, ao longo destes muitos anos, fui esquecido pela EDP, SMAS, PT, etc.; é por isso justo que tenha consumido entre 1 000 e 1 500 horas a dar seguimento às cartas que simpaticamente me foram enviando. Já no que se refere ao Estado, nele incluindo as várias repartições públicas, os inúmeros institutos e os múltiplos departamentos autárquicos, estimo ter dissipado nas suas instalações físicas cerca de 1 500 horas, 800 das quais em primeiros contatos, 500 para entregar o papel que estava em falta aquando da visita inicial, e 200 para entregar o papel que se descobriu faltar já durante a segunda visita.

Hoje faço 40 anos. Contando com os anos bissextos, passei, até agora, 350 640 horas vivo. Algumas das quais a viver. 
Título, Imagem e Texto: Sérgio Barreto Costa, Blasfémias, 13-9-2017

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