Paulo Zua
O final do mês de agosto foi
pródigo em decisões do Tribunal Constitucional (TC) e da Comissão Nacional
Eleitoral (CNE) sobre questões fulcrais da vida angolana, como as falcatruas
eleitorais ou a nomeação de Isabel dos Santos para a Sonangol.
Todas as decisões do TC foram
contrárias aos desejos dos autores dos processos judiciais e favoráveis ao
regime do MPLA. Todas. Não houve sequer uma excepção para disfarçar, porque em
coisas sérias o regime não brinca: no mesmo dia em que saíram essas decisões, o
governo colocou o exército armado nas ruas, em pequenos grupos com cães, para
que ninguém se atrevesse ao mais pequeno ruído de contestação.
A mensagem está dada… O MPLA
vai ganhar as eleições, com a percentagem que quer, independentemente dos
verdadeiros resultados.
Aqueles que beatificamente
“aconselham” a UNITA ou a CASA-CE a recorrerem aos meios legais para resolver
as dúvidas que têm sobre a contagem eleitoral são hipócritas, pois sabem que os
meios legais são do MPLA e só dão razão ao MPLA.
Vamos, a título de exemplo,
analisar a decisão do Tribunal Constitucional sobre o recurso da CASA-CE acerca
da divulgação provisória dos resultados pela CNE, que deu origem ao acórdão nº
589-A/2017.
O essencial da argumentação do
Tribunal estriba-se no artigo 135, nº 1 da Lei Orgânica das Eleições Gerais
(LOEG). Simplesmente o TC faz desse artigo uma interpretação contra legem (contra a lei) que nem um
cão vestido de beca faria.
Começa o TC por declarar que
uma das expressões do artigo 135 é imprópria: a expressão “resultados gerais
provisórios”. Esquecem-se os conselheiros do TC da regra base da interpretação
jurídica contida no artigo 9 nº 3 do Código Civil: “Na fixação do sentido e
alcance da lei, o intérprete presumirá que o legislador consagrou as soluções
mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados.” Ora,
dizer sem mais que uma expressão da lei é imprópria e afastá-la liminarmente é
uma “calinada” jurídica inaceitável.
Na realidade, ao utilizar a
expressão “resultados gerais provisórios”, o que a lei pretende é permitir que
a CNE divulgue resultados gerais antes da sua publicação oficial em Diário do
Governo ou da República, como acontece em vários países. A lei não pretende que
se façam previsões, extrapolações, ou contagens paralelas — daí a expressão “resultados
gerais provisórios”, que serão apresentados depois da contagem e apuramento em
cada círculo eleitoral realizado de acordo com a lei e não por qualquer meio
alternativo. Não há dois tipos de contagens, apenas uma cronologia formal.
Disparate, também é decidir
que as Comissões Provinciais Eleitorais (CPE) não têm que proceder ao
apuramento dos votos antes do envio à CNE. Diz o mesmo artigo 135, nº 1: “À
medida que for recebendo os dados fornecidos pelas Comissões Provinciais
Eleitorais, nos termos do artigo 123…” Portanto, basta ler a lei para perceber
que os dados têm de ser fornecidos pelas CPE, nos termos do artigo 123 da LOEG.
O que diz o artigo 123 da
LOEG? Estabelece o procedimento de transmissão dos resultados das assembleias
de voto às CPE. Nada mais. A lei até é clara. As assembleias de voto enviam os
resultados às CPE, e estas à CNE. Não há circuitos paralelos ou dois tipos de
resultados. A distinção entre provisórios e definitivos apenas existe a
posteriori, para efeitos de publicação nos termos dos números 2 e 3 do artigo
135.º. Não há resultados provisórios que não sejam apurados na chegada às CPE
provenientes das assembleias de voto.
O que se estranha é que os
conselheiros não percebam isto. Na realidade, eles percebem-nos muito bem, pois
não são cães vestidos de beca. Na realidade, eles apenas quiseram fazer a
vontade ao MPLA e para isso criaram mais uma “atipicidade angolana”: a
existência de dois circuitos de contagem de votos. Seria para rir, se não fosse
para chorar.
Eleições: O Quénia não é Angola
ResponderExcluirAdultério, juízes e sobas: arbitrariedade e abuso de poder
ResponderExcluirOPOSIÇÃO UNIDA NA CONTESTAÇÃO DO PROCESSO ELEITORAL
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