Rui Ramos
Belmiro de Azevedo foi, enquanto
empresário, um dos agentes da democratização social e económica de Portugal.
Como poderiam os comunistas perdoar-lhe?
Já se tinha passado com Américo Amorim, agora foi com Belmiro de Azevedo [foto acima]: mais uma vez, o PCP e o Bloco de Esquerda fizeram questão de mostrar na Assembleia da República, com toda a solenidade, o seu rancor contra os cidadãos que por sua própria conta e iniciativa se atrevem a criar emprego em Portugal. Não seria de esperar outra coisa: para aqueles que pensam que só o Estado devia ser empregador, não pode haver maior crime.
Antigamente, os comunistas
disfarçavam esse preconceito com um argumento histórico: todos os grandes
empresários em Portugal teriam sido criaturas do “poder fascista”, e, portanto,
indignos de homenagem. Belmiro de Azevedo, porém, foi um empresário da
democracia, um cidadão que fez a sua fortuna neste regime, depois do
condicionamento industrial de Salazar e das nacionalizações de Vasco Gonçalves.
Belmiro de Azevedo apostou num país em que o capital e a confiança haviam sido
destruídos pela última revolução socialista na Europa. A adesão à CEE prometia
corrigir isso. Mas sem empresários como Belmiro de Azevedo e todos os
trabalhadores a quem eles inspiraram, a integração europeia teria sido
meramente burocrática. Entre outras coisas, Belmiro de Azevedo desenvolveu em
Portugal uma das mais sofisticadas redes de retalho da Europa, criando milhares
de empregos e animando bairros e localidades pelo país fora. Foram homens como
ele que ajudaram a dar à europeização de Portugal um sentido de transformação
social irreversível, associado à escolha e ao consumo, mas também ao mérito, ao
esforço e à inovação. Um mundo muito diferente do mundo de prateleiras vazias e
marchas de Praça Vermelha que os antecessores de Jerónimo de Sousa e de
Catarina Martins no PCP, na UDP e na LCI teriam imposto aos portugueses se
tivessem vencido em 1975. Sim, Belmiro de Azevedo foi, enquanto empresário, um
dos agentes da democratização social e económica de Portugal. Como poderiam os
comunistas perdoar-lhe?
Os comunistas não são tolos.
Sentem-se à vontade para desconsiderar Belmiro de Azevedo, na medida em que
podem ancorar as suas fobias ideológicas em preconceitos muito gerais contra
quem é rico, e por acaso não é cantor pop, ator de Hollywood ou campeão de
futebol. Belmiro de Azevedo foi de facto um dos homens mais ricos de Portugal.
Só que não nasceu com essa fortuna. Há aqui um problema de imaginação: mesmo no
caso de empresários como o de Belmiro de Azevedo, só vemos os valores que estão
em seu nome, mas não o que está por detrás deles: o trabalho, a capacidade de
agarrar oportunidades, a disponibilidade para correr riscos, a força para
ultrapassar adversidades. Imaginamos a riqueza como algo que já existia antes
do empresário, e de que ele se tivesse apossado, em vez de ser algo que ele
próprio criou com os seus sócios e colaboradores. As revistas especializadas
também só contabilizam a riqueza que o empresário criou para si, mas não a
riqueza que criou para outros, sob a forma de negócios, de empregos ou até de
impostos pagos ao Estado.
Belmiro de Azevedo investiu
num jornal diário, e tão desinteressadamente, que esse jornal é hoje geralmente
visto como o órgão principal da opinião de esquerda e de extrema-esquerda. Nem
isto, porém, o redimiu aos olhos do PCP e do BE. Porque para Jerónimo de Sousa
e Catarina Martins, a humanidade não deveria ter outra opção que não a massa
anonimamente compacta do sindicalismo comunista: fora da Fenprof, não há
salvação.
É com estes parceiros que
António Costa julga ir tornar a economia mais competitiva, a segurança social
mais sustentável, ou o Estado mais eficiente? Talvez não julgue, mas então que
está a fazer com Jerónimo de Sousa e Catarina Martins? Qual é o mundo de
António Costa?
Título e Texto: Rui Ramos, Observador,
1-12-2017
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