Péricles Capanema
“O Estado de São
Paulo, de 30 de janeiro, seção econômica, relata a situação quase desesperadora
da OAS, empreiteira baiana atingida pela Lava Jato e em
recuperação judicial (a antiga concordata) desde 2015. Antes da Lava
Jato, a empresa tinha em carteira 19,4 bilhões; depois da Lava Jato,
5,1 bilhões de reais. Antes da tempestade, faturava 8 bilhões; consegue de
momento 3 bilhões de reais por ano. Tinha 120 mil funcionários; agora, 20 mil.
Está ameaçada de falência.
Por onde enveredaram os
dirigentes buscando a saída do túnel? Procuraram parceria com grandes empresas
de engenharia do Exterior, para disputar licitações aqui e em países da América
Latina. A OAS entra com a expertise e a execução. A estrangeira põe o dinheiro.
Por aí se salvariam a empresa, os empregos, um know-how conquistado
com esforço ao longo de décadas. E, via e regra, o controle do negócio fica nas
mãos da estrangeira.
Começa o problema. Quais
empresas de fora foram escolhidas ou toparam se associar? Norte-americanas?
Inglesas? Francesas? Negativo. Todas chinesas. A OAS já assinou contratos em
condições favoráveis com a XCMG, fabricante de equipamentos para a construção
civil. A XCMG é estatal chinesa (OESP, eufemisticamente, escreve investidores
estrangeiros, nem uma vez esclarece que é dirigida pelo governo e PC da China).
Vamos às outras empresas que
se associarão à OAS para participar em grandes licitações de obras públicas ou
privadas: China Communications Construction Company (CCCC), China
Railway Construction Corporation (CRCC) e China Road and
Bridge Corporation (CRBC). As três são estatais chinesas. A ampla
matéria em nenhum momento traz este fato fundamental, as quatro empresas
gigantes com as quais a OAS pretende se associar são estatais chinesas.
Noticia ainda a matéria,
outras empreiteiras brasileiras estão interessadas nas parcerias com “os
investidores chineses”. Em linguagem crua, por trás, com o Partido Comunista da
China e o governo da República Popular da China. Escarrapachando a realidade,
são gigantescos trabalhos em comum que — somados a outras iniciativas
econômicas ou de natureza diversa do Partido Comunista Chinês — representarão
passos importantes no caminhar do Brasil rumo à situação de protetorado
efetivo, ainda que não confessado, da China comunista.
Desde o governo FHC,
importantes passos iniciais, deslizamos para a tragédia que quase ninguém
parece ver com clareza e tem a coragem de denunciar. A situação se agravou nos
períodos Lula e Dilma (são irmãos ideológicos dos donos da China e sempre os
favoreceram) e continua a piorar no governo Temer. Tomem nota: os que hoje
dizem que a situação não apresenta perigo, quando a ameaça virar realidade,
dirão que não tem mais jeito, é preciso se conformar.
Coloco um porém em maiúsculas.
Pela primeira vez, repentinamente, uma voz poderosíssima deu um basta. Tomara
que à voz, coerentemente, se sigam medidas eficazes. Sobre ela falo depois.
Algumas outras pauladas
recentes que agridem a soberania e a independência nacionais. Em 2017, a China
investiu no Brasil 20,9 bilhões de dólares, o maior valor desde 2010. Esse
valor não inclui acordos de empresas privadas chinesas que muitas vezes nem são
anunciados. E nem eu estou especialmente preocupado com elas. Minha ênfase é
investimento de estatais, dinheiro aplicado aqui, em última análise, por
determinação do Partido Comunista Chinês, para aos poucos ir tornando viáveis
seus objetivos imperialistas.
Mais uma. Como sabemos, desde
2009, a China é o maior parceiro comercial do Brasil. Trabalha afincadamente
para manter tal situação. Em 2017 foi constituído um fundo de 20 bilhões de
dólares, do qual participam bancos estatais chineses e empresas brasileiras.
Roberto Dumas Damas, professor do INSPER, explica que com o encolhimento do
BNDES, os bancos chineses assumiram o papel de financiadores de projetos
tocados por empresas da China no Brasil. Vai além na análise e em visão de
conjunto constata com frieza que a nação asiática “dá passos largos na
direção do posto de nova nação hegemônica do planeta”.
Poderia continuar na mesma
direção, mas paro por aqui. Quero logo comentar fato de enorme importância que
pode mudar da água (ou do ácido sulfúrico) para o vinho a situação toda.
Oficialmente, pela primeira
vez, os Estados Unidos, pela voz de Rex W. Tillerson [foto ao lado],
secretário de Estado, fizeram advertência duríssima a respeito. Em 1º de
fevereiro, Tillerson, na véspera de viagem à América Latina, em discurso lido
na Universidade do Texas, Austin, enunciou a política dos Estados Unidos para a
região.
Sobre a presença da China
começou assim: “Instituições fortes e governos que precisam prestar
contas ao povo também garantem sua soberania contra atores predadores que agora
estão aparecendo na região”. O secretário de Estado vai direto ao ponto: a
soberania nacional está ameaçada porque na região atua gigantesco predador —
tubarão, hiena ou harpia, por exemplo.
Continuou o secretário de
Estado: “A China, como faz com mercados emergentes no mundo inteiro, em
geral com investimentos dirigidos pelo Estado chinês, oferece a aparência de um
caminho atrativo para o desenvolvimento”. É resposta direta ao discurso de
Xi Ping no 19º Congresso do PC chinês em que afirmou, a China está mostrando
com fulgor “um novo caminho para outras nações em desenvolvimento”.
Adverte o chanceler dos
Estados Unidos, o caminho chinês troca “ganhos de curto prazo por
dependência no longo prazo”. É o segundo golpe seríssimo, (o primeiro,
perda da soberania), esse caminho trará dependência. Dependência
significa finlandização, satelitização, protetorado.
Avisa ainda o secretário de
Estado; “Hoje, a China está ganhando posições na América Latina. Usa
seu poderio econômico para arrastar a América Latina para sua órbita”.
Órbita lembra planetas e satélites, as palavras são claras, tal política
lançará os países da região na condição de Estados satélites, só formalmente
soberanos.
Termina o ministro do Exterior
com a constatação de que o plano vai mar alto: “A China é hoje o maior
parceiro comercial do Chile, Argentina, Brasil e Peru. A América Latina não
precisa de novos poderes imperiais. O modelo chinês de desenvolvimento,
estatista, é um restolho do passado”.
O discurso foi bem pensado. O
que está em jogo hoje na América Latina é soberania, Estados satélites e
sociedades com governos estatistas que ameaçarão todas as liberdades,
religiosa, política, de empreender, de ir e vir.
E é coisa séria. Repito, pela
primeira vez, os Estados Unidos, de forma oficial, denunciam ameaça para o
futuro da região e tomam posição. Que consequências advirão das palavras de Rex
Tillerson? Não sei. Ninguém sabe. Dependem inclusive da própria seriedade do
governo dos Estados Unidos.
Falta explicar o título.
Escalafobético, esquisito, extravagante, escangalhado. Lideranças da iniciativa
privada e setores do governo ainda se entusiasmam com a ação chinesa no Brasil.
Mas o governo de país estrangeiro, a maior potência mundial, está preocupado e
adverte gravemente. Estamos diante de traição? Irreflexão? Imediatismo?
Patetice? Não é esquisito, extravagante, escangalhado? Circuncisfláutico.
Misterioso, obscuro, triste, sorumbático, pretensioso. Padecemos situação
misteriosa, de desfecho obscuro, nos galarins vemos gente pretensiosa e sem
rumo. É triste, pressagia desastres.
Título, Imagens e Texto: Péricles Capanema, ABIM,
3-2-2018
Escalafobético e circuncisfláutico
ResponderExcluirO texto é perfeito.
Escalafobético é a fobia por degraus e circuncisfláutico é aquilo que parece mas não é. Há mais de 10 estamos sendo escravizados em escala crescente pela economia chinesa. No Brasil morreram as tecnologias, tudo que nos restou foram montadoras de algo que precisamos, importados da China.
fui...