Ao longo do dia, costumamos
reclamar de fatos absurdos que ocorrem rotineiramente sem que aconteça a punição
dos culpados. Os jornais estampam manchetes sobre atropeladores que sobem as
calçadas com seus veículos em busca de vítimas inocentes, relatam fuga de
políticos após desvios de verbas públicas e estampam fotos de suspeitos
espancados por policiais alucinados. Estes (e outros tão dolorosos) fatos, são
reflexos da conformidade em que mergulhamos. Nos limitamos a reclamar
que as autoridades nada fazem, mas as colocamos novamente no comando nas
eleições seguintes.
Nas empresas, também temos
administradores. A diferença é que não votamos neles. Quando entramos para a
empresa, eles já estão lá. Outros chegam lá por virtudes próprias
(técnicas ou políticas). Até mesmo um de nós. Quando alguns destes líderes
dentro das corporações privadas não demonstram aumento mínimo de produtividade,
são sumariamente trocados. Nas empresas públicas, podem desmandar à vontade,
desde que tenham um bom padrinho.
Muito se tem falado sobre o
programa do GQT estar sendo a atual base de sobrevivência das empresas, pois
ele define uma atuação uniforme das diversas áreas, usando linguagem comum e
ferramentas simples e eficazes para detectar erros e apontar os melhores
caminhos em busca de soluções adequadas a cada problema. Este programa prega o
fim da estrutura vertical em prol da horizontalização, distribuindo
responsabilidades entre os que realmente conduzem a firma. Quanto menos
gente para ficar assinando “decretos”, melhor.
Este discurso envolve o
pessoal da base, que vislumbra uma oportunidade de ter suas ideias colocadas em
prática quase sem burocracia, pois ele passa a ter maior autonomia (claro que
respeitando a “constituição” da empresa). Se planejou, elaborou, desenvolveu,
testou e funcionou em âmbito restrito, tem tudo para funcionar num
universo maior, tendo o cuidado de considerar as possíveis “diferenças
culturais” dos seus integrantes.
Numa tropa militar, os
soldados confiam muito no seu sargento. Se eles sentirem apoio deste líder,
formarão uma boa unidade. O mesmo ocorre com integrantes de um setor. Ouvem
falar que o GQT é a nova “bíblia” da empresa. Se entusiasmam no início,
se esforçam, consultam, copiam de onde deu certo. Porém, quando o líder não
participa junto e faz com que se tenha a impressão de que ir a um encontro do
GQT é “castigo”, o gás começa a rarear. O elemento se retrai. Começa a ficar
desconfiado que está dentro de um ciclone chamado “modismo”, que logo passará
como tantos outros. Quando percebe que seu líder não liga para o fato de outros
setores terem crescido, murcha de vez. Tenta se transferir para não afundar junto.
Mas o líder precisa manter o “status”. Nem sempre vai liberar o candidato,
ainda mais se este elemento é um alicerce importante na sustentação do setor.
Com o passar do tempo, é provável que este setor seja extinto, pois com nada
contribuiu para o crescimento da Divisão. Muito pelo contrário. Porém, o tempo
pelo qual sobreviveu à custa de um falso prestígio, causou um
desgaste enorme em outras áreas, pelo péssimo exemplo fornecido sem que nenhuma
atitude mais enérgica tivesse sido adotada em relação ao faltoso. Este falso
líder conseguiu se manter com frases do tipo:
“O pessoal ainda não absorveu
bem o espírito do GQT”
“Existem setores que conseguem
absorver as ideias mais rapidamente”
“Estamos com um projeto
prioritário em andamento, que não nos permitiu deslanchar”
“A partir do próximo trimestre
vamos dar uma arrancada para alcançar os demais”
E assim, seguindo o modelo lá
de fora (que tanto condenamos), vamos adiando o inevitável, enquanto as
“ilhas de excelência” tiverem fôlego para manter o prestígio da Divisão,
fornecendo oxigênio para a Empresa viver.
Título e Texto: Haroldo P. Barboza, Vila Isabel,
novembro de 1997
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