1) Todo e qualquer
tratamento diferenciado conferido pelo Estado a um cidadão deve estar previsto
em lei, de forma que o humor do agente
público não afete (positiva ou negativamente) a vida
do indivíduo.
Não é diferente com políticos
que já tenham ocupado o posto de Presidente da República.
Agraciar Lula com um prazo de
24 horas para que ele se entregasse às autoridades a fim de iniciar o
cumprimento de sua pena, em vez de tocar sua campanha às seis da matina (como
ocorreu com todos os demais condenados da Lava Jato), já foi um privilégio
concedido sem amparo no ordenamento jurídico. Permitir que ele fizesse
discursos em rede nacional, almoçasse com os amigos e zombasse dos brasileiros
por mais 26 horas foi muito além do tolerável.
Cabe indagar: todos
aqueles que já foram chefes do Executivo devem usufruir de tal regalia? Se sim,
inúmeros deles tiveram esse direito
furtado ao longo do tempo. Se não, por que só Luiz Inácio
teve essa mamata? É nesse tipo de contradição que caímos quando um órgão
estatal não trata a todos como iguais — para o bem ou para o mal.
2 ) Muitos estavam
receosos com a possibilidade de que São Bernardo do Campo virasse uma praça de
guerra caso as forças de segurança resolvessem cumprir o mandado de prisão
conforme a praxe — aliás, convém ressaltar: dirigir-se à sede do sindicato dos
metalúrgicos do ABC e prender o meliante em questão era um típico ato
administrativo vinculado, ou seja, uma ordem que deveria ser executada
exatamente como determinou quem a expediu, sem margem para desvios esses ou
aqueles.
Pior: temia-se que o PT, ao
adotar a tática terrorista de usar pessoas — idiotas úteis — como escudo
humano, poderia acabar provocando a ira da população contra os policiais, caso
fossem produzidas cenas de violência, o que prejudicaria as investigações no
longo prazo pela eventual perda de apoio popular. Além disso, tal cenário
beneficiaria a extrema-esquerda, mestre na arte de amealhar capital político
por meio da vitimização.
A preocupação era, portanto,
compreensível, mas sem fundamento algum na realidade: uma única bomba de efeito
moral faria aquela meia dúzia de revolucionários Toddynho saírem em
disparada — como sucedeu-se em frente à Superintendência da PF em Curitiba logo
após o pouso do “amigo” da Odebrecht.
Ademais, Lula desistiu da
brincadeira exatamente quando recebeu um ultimato de meia hora.
Ou seja, restou claro que ele
e seus advogados estavam só aguardando alguém falar sério com
eles, e que só abusaram da situação porque sentiram que podiam.
Se continuassem os delegados “negociando” amigavelmente, talvez o condenado por
corrupção estivesse lá até agora jogando truco com os comparsas.
3) Há aqueles que
alegam que a Justiça fez bem em dar corda para Lula enforcar-se, pois sua
atitude desobediente o prejudicaria daqui por diante toda vez que pleiteasse a
liberdade — por ocasião de pedidos de progressão de regime ou cárcere
domiciliar, por exemplo.
Pouco provável. Primeiramente,
Lula não foi dado como foragido, visto que todos sabiam onde ele estava o tempo
todo. Ele tampouco resistiu à prisão, já que ninguém tentou sequer entrar no
prédio para prendê-lo. Também vai ser complicado alegar que Lula insuflaria
seus paus mandados em sua defesa caso necessário fosse, pois todos nós
conhecemos seu caráter falho, mas provar em juízo que ele faria algo que nem
precisou fazer é tarefa árdua.
Em suma: Lula ficou um dia
inteiro solto depois de decretada sua prisão porque foi autorizado a assim
proceder. Não vejo como isso vai complicar sua situação perante o Judiciário no
futuro.
Até mesmo Maluf teve a
dignidade que faltou ao encantador de burros, mas nem por isso pode-se
asseverar que não valeu a pena desafiar as instituições do Brasil.
Outrossim, analisar se seria
bom ou ruim para a carreira política de Lula conduzir a operação desta ou
daquela maneira não é trabalho da polícia. Especialistas no
ramo ou mesmo palpiteiros como nós podemos fazer conjecturas do gênero e torcer
por este ou aquele desfecho, mas o Estado precisa ater-se a sua missão de
encarcerar o criminoso assim que ordenado e ponto final, sob o risco de as
predileções políticas dos funcionários públicos envolvidos direcionarem suas
ações — algo totalmente temerário.
4 ) Foi comentário
generalizado: o espetáculo dantesco promovido pelo PT e suas linhas auxiliares
(entre eles sacerdotes e pastores que celebraram um culto ecumênico de fazer Lúcifer ficar com inveja)
teria ajudado a queimar o filme de
Lula perante os espectadores, sendo um tiro no próprio pé.
Ele teria adotado um tom muito belicoso no palanque, lançado mão da velha
tática do “nós X eles”, incentivado invasão de propriedade privada, ameaçado
censurar a imprensa, mentido e soltado bravatas
diversas, tudo regado à muita cachaça e música brega.
E aí eu pergunto: qual a
novidade? Por mais difícil que seja de acreditar, é exatamente esse Luiz Inácio
que ainda recebe mais de 20% das intenções de voto na atualidade — o que pode
ser canalizado para outro candidato que compartilhe da mesma ideologia até a
eleição presidencial (Joaquim Barbosa, por exemplo).
Permitir a realização daquele
evento e oferecer uma audiência como há muito eles não logravam atingir não foi
prejudicial aos neocomunistas de forma alguma. Se porventura eles tão somente
“pregaram para convertidos”, tanto pior: devem ter firmado a convicção de um
eleitorado que poderia vir a mudar de opinião até outubro.
Para refletir: vocês
perceberam que os marqueteiros do PT estão assistindo The Walking Dead?
No seriado, o antagonista
Negan [foto], poderoso líder de um dos grupos sobreviventes do apocalipse zumbi, prega
que todos os seus comandados “são Negan”. Eles repetem bovinamente “I AM
NEGAN”.
Pois foi exatamente aos gritos
da plateia de “EU SOU LULA” que ele saiu do palanque, simbolizando que suas ideias continuariam livres
apesar de sua detenção.
Certamente esta estratégia de
marketing atingiu o inconsciente de muitos desavisados, especialmente dos mais
jovens, exatamente como Antonio Gramsci ensinou a fazer.
Até o estilo de Martin Luther
King (“…eu tive um sonho…”) Lula
emulou entre os impropérios que saiam-lhe da boca!
Vocês pensam que este pessoal
dorme no ponto? Cochilou, o cachimbo cai. Dar espaço gratuito para eles na
mídia não foi inteligente sob ponto de vista algum. O Lulapajaula foi
um show de horrores para quem é vacinado contra o populismo rasteiro,
mas pode ter provocado alguma simpatia nos mais desatentos, sim.
5) A pior
consequência não intencional da prisão em câmera lenta de Lula, sem dúvida,
foram os precedentes criados a partir dela.
Será que todo transgressor da
lei condenado também poderá solicitar mais prazo para se apresentar na
delegacia? Ou o requisito é cercar-se de militantes antes de protocolar a
requisição, para então ser tratado como se tivesse reféns sob custódia? Quem
decide se os “termos da rendição” são razoáveis ou não?
Conclusão: às vezes o
“feijão com arroz” é a coisa mais eficaz a ser feita — e, nesse caso, consistia
em tratar Lula como um bandido comum, e não como um barril de nitroglicerina
que mal podia ser tocado. Este indevido e demasiado respeito somado com tamanha
leniência pode acabar cobrando um preço amargo ali na frente…
Título, Imagem e Texto: Ricardo Bordin*, Instituto Liberal, 9-4-2018
Título, Imagem e Texto: Ricardo Bordin*, Instituto Liberal, 9-4-2018
* Atua como Auditor-Fiscal do
Trabalho, e no exercício da profissão constatou que, ao contrário do que
poderia imaginar o senso comum, os verdadeiros exploradores da população
humilde NÃO são os empreendedores.
Formado na Escola de
Especialistas de Aeronáutica (EEAR) como Profissional do Tráfego Aéreo e
Bacharel em Letras Português/Inglês pela UFPR.
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Até entendo a ‘paciência’ da Justiça. Penso que ela, ao tratar com deferência um ex-presidente da República, esperava que este se portasse com dignidade. Quer dizer, até deu ao senhor Lula, de bandeja, uma oportunidade para que o mesmo pudesse se elevar como estadista. Mas, que nada! Lula mostrou, mais uma vez, de que massa é feito, qual o seu caráter e quais as suas intenções.
ResponderExcluirNa minha percepção, acho que ele mais perdeu do que ganhou. Com exceção dos seus seguidores, fanáticos ou não, as demais pessoas, aquelas a quem ainda restava uma dúvida, vamos dizer, uma certa dose de imparcialidade em relação ao senhor Lula, esclareceram a dúvida e deixaram escoar a dose da imparcialidade.