Alexandre Garcia
O Ministro da Educação pediu
desculpas por ter dito, em entrevista à Veja, que o brasileiro no exterior
comporta-se como um canibal, roubando coisas dos hotéis e até assento
salva-vidas do avião. Pediu desculpas “a quem tiver se sentido ofendido” – quer
dizer, aos que fazem isso. Se a moda pega, vou ter que pedir desculpas àquela
senhora que antes de desembarcar em Brasília, colocou a coberta da TAP na sua
sacola. Terei que pedir desculpas para a brasileira que em Lisboa atrasou o voo
para Roma, fazendo gritaria, porque queria guardar a bagagem dela na classe
executiva, embora viajando na econômica. Vou ter que me desculpar aos
brasileiros barulhentos que perturbavam o sossego do restaurante da Galleria
Vittorio Emanuele, em Milão, para mostrar que lá estavam, e me envergonhei
deles.
Quando saía do hotel em Punta
del Este e o funcionário me fez abrir a mala para uma inspeção, fiquei
revoltado, mas ele explicou que brasileiros levam toalhas, lençóis, luminárias
e até abajur. Fiquei envergonhado de meus conterrâneos, mas, se tiver que
repetir o ato do ministro, devo pedir desculpas a esses ladrões de hotéis. Vou
pedir desculpas ao meu amigo que levou um pito de um porteiro de prédio, depois
de atravessar fora da faixa de pedestre uma avenida de Santiago do Chile.
Chamei meu amigo de incivilizado e agora vou pedir desculpas. Peço desculpas
aos brasileiros que iam comendo sanduíche e jogando papel no lindo piso da rua
Augusta{foto], na baixa lisboeta. Eu os critiquei em pensamento.
Já vi chineses cuspindo no
corredor do avião, entre Hong-Kong e Beijing; egípcio acendendo fogareiro
dentro do avião, sobre o Saara; americano agindo como bárbaro em Cancún;
japonês enlouquecido em Honolulu; argentino fazendo algazarra em Florianópolis.
Mas esses não me envergonham. Quando sou acordado à noite por brasileiros aos
gritos no corredor do hotel em Viena, ou quando vejo meus conterrâneos pulando
roleta no metrô em Paris, aí eu me envergonho. Será que devo pedir desculpas a
quem me provoca vergonha? Não seria melhor fazer como o Ministro Vélez
Rodríguez na entrevista, e sugerir que a educação talvez possa recuperá-los
para a civilização?
Eu não diria “canibais”, mas
selvagens. O excelente Paulo Pestana, do Correio Braziliense, usou o “canibais”
na sua página de domingo e sugeriu que o Ministro fosse além, falasse sobre
furtos em restaurante, xixi na calçada, barulho, grosseria com garçom, cigarro
no chão; e recordou o refrão chulo que “gritavam os canibais” para uma russa na
Copa do Mundo. Quando postei o assunto no twitter, choveram testemunhos dessa
incivilidade e comportamento antissocial no exterior. Então o Ministro não está
sozinho nessa constatação. Que não atinge a maioria, mas ensejou o pedido de
desculpas porque um advogado pediu no Supremo uma manifestação do Ministro.
Talvez o causídico não viaje e não perceba o que nos envergonha. Ou quem sabe
seja um dos que se sintam ofendidos.
Título e Texto: Alexandre Garcia, Facebook,
22-2-2019
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