Henrique Pereira dos Santos
Agora que é já claro que a visão
catastrofista da epidemia que está em curso não se vai concretizar, é útil
olhar para o papel que a imprensa desempenhou.
Não porque a imprensa seja, como de facto é, uma das vítimas colaterais da epidemia, mas porque a imprensa, durante semanas cruciais, esqueceu o seu papel de contrapoder, assumindo o papel da propagandista do medo do inimigo externo a que habitualmente o poder instituído a tenta confinar em tempo de guerra.
Quando Jorge Torgal, com anos
de experiência e trabalho em epidemiologia disse o que hoje é claro -– que a
epidemia da covid-19, nas suas consequências de mortalidade, tinha a dimensão
de um surto de gripe –- caiu-lhe a toda a gente em cima, a imprensa cavalgou o
sentimento da opinião pública e os comentadores que nunca tinham alguma vez
pensado no que era uma epidemia, destrataram-no.
A imprensa não se interrogou,
verdadeiramente, que razões tinha Jorge Torgal para o que estava a dizer e
mesmo hoje, em que os dados existentes corroboram inteiramente essa ideia
inicial, a imprensa preocupa-se mais em saber se se acha desautorizado ou não,
que em verificar os factos.
É fácil dizer que fez umas
declarações infelizes, é fácil dizer que clinicamente a covid 19 não é uma
gripe, é fácil entrevistar intensivistas nas salas de cuidados intensivos,
fazer peças plenas de emoção sobre o drama dos profissionais de saúde que estão
na linha da frente, mas difícil, muito mais difícil, será a imprensa reconhecer
que foi um erro dar ouvidos a Jorge Buescu, que nunca na vida tinha visto
curvas epidémicas, em vez de procurar compreender Jorge Torgal.
Sem a menor sombra de teoria
de conspiração, há uma sucessão infeliz de factos que nos trouxe até aqui, a um
beco político e um poço económico.
· Um surto de uma nova doença declara-se na China,
segue o seu desenvolvimento natural, o regime tenta limitar os danos, como faz
qualquer governo que tenha de lidar com um surto.
· No fim do surto, e mesmo durante, a ditadura
chinesa faz o que é da sua natureza: chama a si os louros do fim de um surto
epidémico.
Como explica Knut Wittkowski neste vídeo todas as doenças
respiratórias seguem o mesmo padrão: aparecem em duas semanas, atingem um pico,
vão-se em duas semanas e é tudo.
Infelizmente, a Organização
Mundial de Saúde, ou mais precisamente, o seu Secretário-Geral, em vez de
tratar a bravata chinesa como aquilo que é, uma bravata, resolveu insuflar o
medo e, mais grave, deixar passar a ideia de que a OMS reconhecia que tinham
sido as medidas absurdas tomadas pelo governo chinês que tinham parado o surto.
As opiniões públicas
ocidentais, em especial uma boa parte das elites que tem a obrigação de manter
alguma racionalidade, com a imprensa e a academia em lugar de destaque, ficaram
fascinadas com a ideia de um combate heroico contra o vírus e passaram a exigir
aos seus governos que adotassem, o mais cedo possível, medidas draconianas,
como os chineses, convencidos de que, de outra forma, o vírus progredia
exponencialmente sem limite, até que todo o universo fosse uma massa de vírus.
A imprensa abandonou todo o
espírito crítico, acoitou charlatães variados – os mais perigosos de todos, os
que não sabem que não sabem – montou operações de contagens de mortos,
esquecendo toda a cautela em lhes atribuir um contexto, falou com dezenas de
pessoas que nunca tinham pensado sobre o que é uma epidemia e criou-se uma
unanimidade social em torno do pensamento mágico de que, sem a colaboração de
todos, o apocalipse chegava amanhã, às cavalitas de um vírus.
A imprensa não se interrogou
se o pandemônio nos cuidados intensivos era por causa da especificidade clínica
da doença ou por se ter decidido administrativamente concentrar os doentes em
hospitais de referência ou por se ter criado o medo do contágio que levou
famílias, lares, e todos os outros a não querem ficar à beira da cama de quem
tinha direito a uma morte digna e humana, e não à morte fria e solitária numa
cama de hospital.
Espero que agora se vire a
página, e se a imprensa quer emoção, que vá falar com os desempregados, com os
vendedores sem clientes, com os biscateiros sem biscates, com os operários sem
prêmios de produtividade, com os lojistas sem lojas.
Está na hora de acabar com
esta loucura absurda do mais estranho suicídio econômico que alguma vez poderia
ter imaginado e espero que a imprensa seja capaz de se olhar ao espelho e
avaliar bem o risco de perder o seu único verdadeiro ativo: a capacidade de
pensar pela sua cabeça e a coragem de quebrar o unanimismo.
Título e Texto: Henrique
Pereira dos Santos, ECO, 7-4-2020,
0h28
É visível o desnorteamento das ‘autoridades’ e políticos: mais perdidos que cego em tiroteio.
ResponderExcluirSe aferram à tal de OMS como náufragos.
Em Portugal tem um termo justo.
ResponderExcluirABORREGAR no Brasil significa ""DAR PT"...