terça-feira, 6 de maio de 2025

O Show da Gaga e o Circo Fiscal do Rio: A Mentira Brilhante com Maquiagem de Pop Star

Diego Muguet

Nos venderam um espetáculo de 2,1 milhões de pessoas em Copacabana, como se cada metro quadrado da praia tivesse se multiplicado por três e virado solo sagrado. A mídia repetiu o número sem piscar, sem questionar, sem uma mísera régua ou satélite. Os mesmos que, em tempos de manifestações conservadoras, chamam especialistas da USP para “corrigir” os números da PM, desta vez aplaudiram de pé os dados inflados, sem metodologia, sem verificação, apenas porque combinava com o figurino do momento: pop, progressista e global. 

Vamos aos fatos. A orla de Copacabana tem pouco mais de 4 km e uma largura útil de uns 50 metros. Mesmo enfiando gente até na faixa de pedestres, mal chegamos a 230 mil metros quadrados de área útil. Com uma densidade apertada de 3,5 pessoas por metro quadrado — o que já é um sufoco —, chegamos a cerca de 800 mil pessoas no máximo. E isso é sendo generoso, assumindo que todo mundo ficou parado, espremido, sem sair pra fazer xixi ou comprar cerveja. A conta de 2,1 milhões só fecha se somarmos rotatividade total e ainda esticarmos a geografia do evento até o Aterro do Flamengo. É propaganda, não estatística. 

Mas vamos supor que esses 800 mil tenham movimentado mesmo a economia. Os organizadores dizem que o show gerou R$ 600 milhões. Bobagem. A cidade do Rio já movimenta entre R$ 200 a R$ 250 milhões num fim de semana típico sem Gaga, sem drone, sem palco. O que conta, do ponto de vista fiscal e racional, é o incremental real. E esse, com muito otimismo, chegou a R$ 180 a 200 milhões — baseando-se na ideia de que algo como 350 mil turistas vieram de fora e gastaram em média R$ 500. Isso é cálculo com base, não com glitter. 

Agora vem o golpe de mestre: a prefeitura diz que “investiu” R$ 15 milhões. E quanto volta para os cofres públicos com isso? Apenas o ISS — o imposto sobre serviços — de no máximo 5% sobre os gastos em hospedagem, transporte, alimentação e eventos. Resultado? R$ 10 milhões de retorno, no máximo. Prejuízo líquido de R$ 5 milhões para os cofres municipais. A cidade gastou mais do que arrecadou para financiar um delírio pop hollywoodiano com verniz de política pública. 

E quando confrontados com os números, vêm com a ladainha de sempre: “geração de empregos temporários”. Empregos? Foram dois dias de trabalho informal, R$ 400 pra limpar chão ou empilhar cone. Isso não é emprego, é bico com holofote. Isso não reduz desemprego, não cria futuro, não qualifica ninguém. É só a velha prática de usar o povo como desculpa para torrar dinheiro e chamar de inclusão social. 

O que vimos foi um show caro, bancado com dinheiro público, aplaudido por uma bolha que exige rigor estatístico quando é protesto conservador, mas aceita conto de fadas progressista com olhos fechados. Uma cidade que diz não ter verba pra saúde ou educação, mas gasta milhões para importar diva americana e fingir que isso é investimento. 

Isso não foi sobre cultura. Isso foi sobre narrativa. Foi sobre reforçar uma imagem internacional do Rio “cool” e anestesiar a crise com coreografia. A cabine de som virou cabine de comando da propaganda. E enquanto os números verdadeiros gritam, a verdade continua apagada — porque, no Brasil, a conta só precisa fechar quando o evento não é de lacração. 

Se a Lady Gaga brilhou, foi porque alguém apagou a luz da razão. E essa conta, como sempre, sobra para o povo pagar.

Título e Texto: Diego Muguet, X, 5-5-2025, 20h29

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