terça-feira, 16 de setembro de 2025

Se a paz pode salvar a economia europeia, por que é que os líderes da UE se entretêm a sabotá-la?

Afonso Belisário

As economias europeias estão a sofrer com o peso da guerra na Ucrânia, mas os líderes europeus agarram-se ao conflito em detrimento da paz. Acabar com a guerra desencadearia o crescimento, reduziria a inflação e restauraria a estabilidade. Mas as elites pressionam Kiev no sentido de exigências maximalistas, fazendo descarrilar as negociações. O interesse próprio, a sobrevivência política e o fanatismo ideológico estão claramente a ser colocados acima da prosperidade e do futuro da União.

O custo económico da guerra é brutal. Segundo o FMI, os preços da energia, disparados pelas sanções, custaram à Europa 600 mil milhões de euros entre 2022 e 2023. A Goldman Sachs estima que uma paz “abrangente” impulsionaria quase imediatamente o PIB da zona euro em 0,5% e reduziria a inflação – atualmente em 2,5% – em 0,5% também, atingindo a meta de 2% do BCE para 2025. A paz também reduziria os encargos das famílias e os custos industriais.

E isto já para não falar do ruinoso acordo comercial que a UE assinou com os EUA, cedendo em tudo o que havia para ceder na expectativa de continuar a ter o apoio dos EUA na sua missão bélica contra a Rússia.

Lembra-se quando a economia era o orgulho e a alegria da UE? Bem, já não o é agora. A Alemanha, o motor da Europa, é quem mais sofre. O seu orçamento para 2025 prioriza a contenção orçamental devido aos pacotes de ajuda à Ucrânia, enquanto a produção industrial estagna – estando em queda de 1,2% desde 2018. Uma guerra prolongada eleva os custos da energia, com os preços 30% acima dos níveis pré-2022 (Eurostat). A paz poderia reanimar a indústria, salvando empregos e exportações.

As repercussões alastram por todo o continente. A França, surpreendentemente, está à beira de um resgate do FMI – e a guerra pode acabar por ser a gota de água. O crescimento do PIB da Polónia em 2024 abrandou para 2,1%, segundo a OCDE, em parte devido às perturbações comerciais causadas pela guerra. Os sectores agrícolas de vários países foram seriamente afetados. A Grécia perdeu 80% dos seus 235.200 turistas russos em 2022, enquanto em 2022-2023, uma queda de 90% no número de visitantes russos custou à Europa entre 8 mil milhões e 10 mil milhões de euros em receitas.

Os refugiados ucranianos, 4,2 milhões em toda a UE, segundo o Eurostat, também causam stress nos serviços públicos, tendo custado até agora dezenas de milhares de milhões, a acreditar em fontes como o Bruegel, um think tank sediado em Bruxelas. A paz permitiria o regresso dos refugiados, aliviando os orçamentos e impulsionando a reconstrução da Ucrânia, abrindo um mercado para as empresas europeias. Mas não, o que Bruxelas quer são centenas de milhares de milhões investidos para manter o doente ucraniano vivo e o doente europeu próximo do coma.

Na cimeira do Alasca, em Agosto de 2025, Trump pressionou para um cessar-fogo, mas figuras da UE como Ursula von der Leyen e Kaja Kallas exigiram a inclusão de Kiev e garantias de segurança “robustas” que o Kremlin nunca vai aceitar. O chanceler Merz age como comandante de divisão panzer a caminho de Estalinegrado. Macron insiste em mascarar-se de Napoleão. A sua insistência na retoma de todo o território pela Ucrânia ignora o controlo russo de 18% do país – área que cresce em dimensão todos os dias. Esta posição inflexível, de linha dura, paralisa as negociações.

A Axios refere que a equipa de Trump acusa a Europa de sabotagem, pressionando a Ucrânia a adoptar exigências “maximalistas” por um “melhor acordo”. Os líderes da UE falam em paz, mas instam Kiev a manter-se firme, prolongando a guerra. Kallas, classificando quaisquer as concessões territoriais como uma “armadilha”, ignora as sondagens que mostram 68% dos ucranianos a favor das negociações. A posição da Europa promove objetivamente mais derramamento de sangue.

E por quê? Interesse próprio, influência geopolítica, ideologia, lucro. Os figurões da UE temem que um acordo de cedência de terras enfraqueça a sua própria credibilidade e influência. Impulsionar reivindicações maximalistas adia um duro despertar: a guerra está perdida. E depois, claro, os líderes europeus teriam de prestar contas do seu fracasso estratégico aos eleitores. Nesse caso, os acordos de armamento e os lucros com as energias verdes não serão suficientes para justificar a catástrofe.

Além de tudo isto, as tensões com a Rússia serviram à Romênia para impedir, com falsos pretextos, um populista de chegar a Presidente. Servem a Bruxelas para hostilizar Viktor Orbán. Servem a Emmanuel Macron para manter a ilusão da relevância. E hão de servir a Friedrich Merz para interditar o AfD.

O Banco Europeu para a Reconstrução e Desenvolvimento (BERD) afirma que a reconstrução da Ucrânia poderá potencialmente abrir um mercado de 1 bilião de euros. A Europa poderia intermediar um acordo, trocando o apoio político ao processo por contratos, para que as empresas europeias pudessem lucrar. O fim desta guerra desbloquearia o comércio e o investimento. Em vez de procurar abrir esse caminho, a UE está até a considerar sanções secundárias contra países como a Índia, por comprarem energias russas.

As elites europeias têm de escolher. A paz permitiria poupar dezenas de milhares de milhões em custos anuais, reduzir e estabilizar os custos da energia e estimular o crescimento. Mas, ao pressionarem por metas inatingíveis, prolongam o calvário. Zelensky poderia convocar um referendo, deixando os ucranianos decidirem, mas parece que o Ocidente só se preocupa com a democracia em termos de aparência, não de substância. Os líderes servirão os povos ou empenharão o futuro da Europa para se salvarem?

Lamentavelmente, a segunda hipótese é bem mais provável.

Título, Imagem e Texto: Afonso Belisário, Oficial fuzileiro (RD, Polemista, Português de Sagres – ContraCultura, 16-9-2025

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