Maria João Guimarães é uma senhora que quase todos os dias escreve as suas opiniões sobre os conflitos do médio-oriente, embrulhando-as num simulacro de jornalismo.
"A GHF é duramente
criticada tanto pelo tipo de ajuda que fornece - uma boa parte precisa de ser
cozinhada e muitas pessoas não têm combustível para o fazer - e sobretudo por
estabelecer muito poucos pontos, onde têm sido mortas, por disparos israelitas,
centenas de pessoas: o último número, do Alto Comissário dos Direitos Humanos
da ONU, é de 613 mortos ...".
Esta pequena pérola merece
alguma atenção.
Primeiro ponto (porque Maria
João Guimarães o vem repetindo, ipsis verbis, há vários dias) é o que
diz respeito ao título do post "por disparos israelitas".
Como é que a jornalista sabe
qual é a origem dos disparos que resultam nos mortos referidos? (Já lá iremos
ao resto da discussão).
Não sabe, não sabe ela, nem
sabe ninguém.
Usemos então uma fonte que
manifestamente não é pró-israelita, a Aljazeera.
"Mahmoud
Basal, a civil defence spokesperson in Gaza, said they “recorded evidence of
civilians being deliberately killed by the Israeli military”".
O que é a defesa civil de Gaza de que este senhor será porta-voz?
É um dos muitos ramos dos
serviços de segurança palestinianos, diretamente dependente do ministério do
Interior que, no caso de Gaza, quer dizer, do Hamas.
Ou seja, a fonte das
afirmações taxativas de Maria João Guimarães é de uma das partes em conflito.
Como faria um aluno básico de
jornalismo, sabendo que uma das fontes de uma informação é uma das partes em
conflito (logo, sem a menor credibilidade), convém perguntar: quem e com que
benefício se espalha essa informação?
A questão de fundo prende-se
com um assunto sério, o controlo da ajuda humanitária resulta em potencial
controlo dos beneficiários (se não te portas bem, não levas farinha) e em
captação de recursos para quem a distribui, sobretudo se a desviar para um mercado
paralelo (apenas em Gaza, sobre cujos habitantes a ONU despeja milhões pelos
simples facto de alguém ter um estatuto de refugiado de um sítio onde nunca
esteve, mas sim o seu bisavô, é que os mercados continuam a funcionar, sem que
se perceba que economia existe ali).
Israel acusa a ONU de não
controlar convenientemente a ajuda humanitária (o que a ONU reconhece ao
referir os frequentes assaltos), permitindo que ela seja controlada pelo HAMAS
(coisa que a ONU nega) e, consequentemente, inventou um sistema de fazer chegar
ajuda humanitária que pretende evitar que essa ajuda seja controlada pelo
HAMAS.
A quem interessa
descredibilizar este esquema, a Israel, ou ao Hamas?
Ao Hamas, evidentemente
("The expected Israeli mechanism for distributing aid in Gaza is
completely unacceptable, and we call on our people not to cooperate with it, as
the occupation will use the aid distribution as a security and intelligence
operation under the cover of the Israeli-funded ‘Gaza foundation",
dizia o Ministro do Interior do Hamas, o tal que tutela a defesa civil citada
por Maria João Guimarães).
Logo, os problemas causados às
pessoas que se dirigem aos pontos de ajuda (e que o Hamas entende que devem ser
boicotados pelas pessoas comuns) são mais provavelmente causados pelo Hamas ou
por Israel?
Assim sendo, sendo mais do
interesse do Hamas que haja problemas, e não se sabendo de forma independente
do que resultam a maioria dos incidentes, como pode a jornalista dizer,
taxativamente, que os disparos são israelitas?
Pode, da mesma maneira que que atribui ao Alto Comissário da ONU umas declarações de são de um seu porta-voz, que aliás não diz que os 613 mortos são o que a jornalista diz que são, como se pode ver na ligação que fiz para a Aljazeera.
Resumindo, a lata com que
jornalistas se servem do seu estatuto para torturarem a informação a que têm
acesso até que ela diga o que querem, é incomensurável.
E depois queixam-se da crise
do jornalismo, quando a crise, que existe, parece ser em primeiro lugar uma
crise de confiança no jornalismo, que está
completamente enxameado de gente que quer mudar o mundo, sem as
complicações e riscos de fazer o que é necessário, tomar o poder, preferindo o
conforto do jornalismo sonso ao desconforto do confronto político aberto e
leal.
Título e Texto: Henrique
Pereira dos Santos, Corta-fitas,
7-7-2025
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