domingo, 28 de dezembro de 2025

[As danações de Carina] Algumas palavrinhas sobre o Natal

Carina Bratt

O DIA AMANHECEU diferente. Não é só o sol que ilumina as ruas, o mar aqui em frente à minha varanda, mas também as luzes piscando nas janelas, como se cada morador quisesse anunciar ao mundo que ali mora a Esperança.

As crianças acordaram mais cedo, não pelo barulho do despertador, mas pela ansiedade de descobrir se Papai Noel passou pela sala. Os adultos, entre risadas e abraços, fingiram surpresa diante dos presentes que eles mesmos compraram, porque no fundo sabem: o verdadeiro presente de natal é no dia de natal, estar todos juntos.

Na mesa do café, a mãe caprichou. O cheiro da rabanada se misturou ao som das conversas. Histórias antigas são recontadas, como se fossem novas, e cada gargalhada dos presente é um brinde silencioso à vida que passa sem pressa.

O Natal é isso: um instante em que o tempo parece suspenso, em que até os desencontros se tornam pequenos diante da grandeza de um abraço, de um beijo no rosto, de um gesto de carinho.

E quando a noite cair, entre o piscar das luzes e o silêncio das ruas, ficará a certeza de que o Natal não cabe apenas em um dia. Ele se estende em cada gesto de bondade, em cada palavra de afeto, em cada promessa de recomeço.

Natal é ainda aquele dia em que todo mundo acorda com espírito de paz… até perceber que esqueceu de comprar o presente da tia, do tio, do Aparecido, enfim, de algum vizinho que chegou para lembrar que está vivo.

Na cozinha, a ceia começou a ser preparada cedo Minha mãe insiste que ‘não vai exagerar na comida este ano’, mas de repente aparecerão três tipos de salpicão, duas travessas de arroz com passas (que todo mundo gosta) seguido de um peru que parece ter treinado na academia o ano inteiro.

O tio Belo veio de Curitiba chegou já com a piada pronta: ‘Cadê o meu presente? Aceito em dinheiro!’. E, claro, ele será o primeiro a atacar a farofa, antes mesmo de alguém dizer ‘bom apetite’.

As crianças da tia Arminda, meus sobrinhos, também de Curitiba, correm pela casa, disputando quem viu o Papai Noel primeiro. O cachorro que o tio Belo trouxe (o Piteco) aproveita a confusão para roubar uma rabanada da mesa da cozinha.

E sempre tem aquele primo que aparece atrasado, dizendo que ficou ‘preso no trânsito’, mas na verdade estava embrulhando os presentes de última hora com papel comprado na padaria aqui perto do prédio onde eu moro.

No fim, entre risadas, tropeços e histórias repetidas, todo mundo se reúne em volta da mesa. O Natal, afinal, é isso: uma mistura de caos e carinho, onde até os perrengues viram lembranças boas. Não sou muito chegada às noites de natal. Meu pai não está mais entre nós e isso me entristece muito e também a mamãe.

O dia amanheceu diferente. As luzes piscam nas janelas e nas varandas como se cada apartamento quisesse anunciar ao mundo que ali mora a esperança. As crianças acordaram cedo, foram a praia em frente acreditando que Papai Noel passou correndo pela areia.

Os adultos fingem surpresa diante dos presentes que eles mesmos compraram, porque no fundo sabem: o verdadeiro presente é estar todos juntos e misturados.

Mas daqui a pouco, bastará a mesa começar a se encher para que a poesia dê lugar à comédia. O arroz com passas surgira triunfante, como se fosse tradição obrigatória, mesmo que metade da família torça o nariz. O peru, coitado, só virá para ocupar espaço — e ninguém sabe se alguém vai dar conta de comer até o fim.

O tio, já com a piada pronta, pergunta de novo se pode trocar o presente por dinheiro. A tia reclama que o amigo secreto nunca funciona, porque sempre alguém esquece de comprar o presente e resolve improvisar com um sabonete e um desodorante. O cachorro do tio resolveu sujar meu banheiro e eu saí correndo em seu encalço quando eu o flagrei onde não deveria. 

Entre abraços e tropeços, o Natal se revela: uma mistura de caos e carinho. É o único dia em que até os desencontros viram lembranças boas, e em que a paz mundial se resume a todos concordarem em deixar o controle da TV com a mamãe.

No fim, entre o piscar das luzes e o barulho da louça acumulada na pia, fica a certeza de que o Natal não cabe apenas em um dia. Ou em uma noite. Ele se estende em cada gesto de bondade… e em cada piada ruim que o tio vai repetir no ano seguinte. O Aparecido ainda não deu as caras. Saiu com a neta dele, a Ellen, mas ela me contou o que ele comprou para me dar de presente.

Prometo não dizer nem a mim mesma o que comprei para ele. Vou deixar a surpresa, para quando ele chegar aqui. Feliz Natal a Todos. E para você também, meu papito amado, onde você estiver.

Título e Texto: Carina Bratt, de Vila Velha, no Espírito Santo, ES, 28-12-2025

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