Depois das palavras que o
primeiro-ministro teve a ousadia de dizer, sentem-se mentes agitadas e
antecipam-se análises de todo o calibre
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Passos Coelho, 1º de maio de 2012, foto: Lusa |
Carlos Carreiras
Cinco anos depois de ter
abandonado o poder, Tony Blair deu uma extensa entrevista ao “Financial Times”.
Na conversa com um dos directores do jornal, sem misericórdia, Blair foi
questionado sobre os milhões de libras que amealhou desde que fez as malas do nº
10 de Downing Street. A lista de actividades de Blair é quase tão extensa como
os zeros na sua declaração de rendimentos: mediador de conflitos (enviado
especial do Quarteto para o Médio Oriente), Tony Blair gere duas fundações (a Blair Faith Foundation
e a Blair Sports Foundation)
e lidera ainda a Africa Governance Initiative.
Ao lado filantrópico do seu trabalho, soma (ou somou) contratos milionários com
a JP Morgan (3,2 milhões/ano), discursos pagos a peso de ouro e serviços de
aconselhamento estratégico a empresas e países através da sua Tony Blair Associates.
Por esta altura,
interrogar-se-á o leitor, o que é que Tony Blair tem que ver com o título deste
artigo? Tudo e nada. Blair, tal como Bill Clinton, Gerhard Schroeder ou Alan
Greenspan, só para citar alguns, faz parte de uma elite que governou o mundo e
hoje se dedica a vender recomendações sobre como o mundo deve ser governado.
Paradoxalmente, o julgamento benévolo que a história faz deles tem sido
inversamente proporcional ao estado de coisas que nos deixaram. Greenspan,
governador da Reserva Federal, manteve taxas de juro incrivelmente baixas, administrando
esteróides à economia americana e gerando uma bolha no imobiliário que viria a
estoirar mais tarde. Clinton, tal como o libertário Greenspan, desdenhou a
regulação financeira e foi um dos presidentes americanos mais amigos do
capitalismo selvagem – tendência seguida pelo seu sucessor George W. Bush, que
viu a economia americana desabar a seus pés. Na Europa, Blair deixou para a
história a “Broken Britain”, e Schroeder,
antigo chanceler alemão, é acusado de ter assinado de cruz a entrada da Grécia
no euro. Exemplos, à esquerda e à direita, da política ou da finança, de homens
cujas opiniões são atentamente escutadas. Como se tivéssemos esquecido que, de
uma forma ou de outra, a eles devemos parte do caos em que vivemos mergulhados.
Adivinha-se que Sarkozy, Zapatero ou mesmo Berlusconi acabem por ganhar a mesma
respeitabilidade com o passar do tempo. Todos falharam, sem excepção,
precisamente porque governaram para as eleições ou para garantir o seu lugar na
história.
Eles são a versão
internacional daqueles a quem, em Portugal, obedientemente tratamos por
senadores. Vendem recomendações sobre como Portugal deve ser governado,
esquecendo como eles próprios exerceram a governação – seria um exercício
interessante coloca-los a comentar a história do seu exercício político.
Foi graças a eles que, durante
muito tempo, Portugal não foi um país normal. Anestesiada pelo politicamente
correcto, adormecida por uma certa forma de estar na vida pública, a nação foi
habituada pelo próprio poder a conviver mal com a normalidade, com a verdade,
com a realidade. Ao derrotar o Partido Socialista nas últimas legislativas, os
portugueses disseram basta a este modo de vida. Não querem que lhes seja
servida uma percepção de mudança: querem uma mudança a sério. É essa mudança
que, um ano depois de ter tomado posse, Pedro Passos Coelho tem oferecido ao
país. Uma mudança que, ninguém esconde, é dura.
Depois das palavras que oprimeiro-ministro teve a ousadia de dizer, sentem-se mentes agitadas e
antecipam-se análises de todo o calibre. Gente que talvez precise de ser
lembrada dos princípios da conduta normal de um homem de Estado. Passos Coelho
só verbalizou a confirmação da normalidade política. Eu, político com eleições
em 2013, estou incondicionalmente ao lado do primeiro-ministro: entre os
interesses do partido e os interesses do país, prevalecem os do país; entre as
ambições dos políticos e as necessidades dos portugueses, sacrificam-se as
primeiras. Que se lixem as eleições, o que importa é Portugal e os portugueses.
Título e Texto: Carlos Carreiras, Presidente do
Instituto Francisco Sá Carneiro, jornal “i”,
25-7-2012
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