Depois de ter transportado em sonhos Ingrid
Bergman, o avião de Casablanca para Lisboa protagonizou uma das mais
espetaculares ações antissalazaristas.
Luís Almeida Martins
Todos os dias, nesse outono de 1961, iam até ao
porto de Tânger e fingiam observar atentamente barcos e tripulantes. Mas
aqueles portugueses, inimigos de Salazar, o que pretendiam era iludir os agentes
da PIDE (Polícia Internacional e de Defesa do Estado) que os vigiavam a
todo o momento, mesmo ali no estrangeiro. Palma Inácio, Camilo Mortágua e os outros queriam dar a
entender aos polícias do ditador que preparavam um desembarque de guerrilheiros
na costa algarvia, semelhante ao dos barbudos de Fidel Castro em Cuba. Na
realidade, a sua ideia era desencadear uma ação não marítima, mas aérea,
lançando sobre o país panfletos contra o regime.
Eludindo a vigilância dos “pides”, no dia 10 de
novembro embarcaram em Casablanca no avião da TAP com destino a Lisboa – o Super-Constellation batizado de Mouzinho de Albuquerque. Quando o
aparelho se aproximava já da Portela, induziram o comandante José Marcelino a
simular a aterragem e a voltar para trás, sobrevoando a cidade de Lisboa a
baixa atitude. Despressurizada a cabina, lançaram então sobre a capital, o
Barreiro, Setúbal, Beja e Faro milhares de panfletos impressos em papel de
seda.
Salazar, espumando de raiva, mostrou uma vez mais
que tinha pelos no coração. Dois caças a jato Sabre da base de Monte Real foram incumbidos de perseguir e abater
o avião de passageiros. Um, porém, não levantou voo e o outro recebeu ordem
para subir a uma cota demasiado elevada. A Força Aérea, sem o admitir,
recusava-se a acatar a diretiva do ditador. Mas claro que o Super-Constellation – com passageiros americanos,
ingleses, franceses, belgas e espanhóis – tivesse sido derrubado, o regime
tê-lo-ia sido com ele.
Ao começar o sobrevoo do mar, frente ao Algarve,
rumo a Tânger, onde pousaria finalmente, o Mouzinho
de Albuquerque ainda se cruzou com dois navios de guerra, cujos tripulantes
lhe acenaram. Estavam ali à espera do pretenso desembarque dos guerrilheiros
“castristas”…
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Palma Inácio libertado da prisão de Caxias a 26 de Abril de 1974 |
Este foi o primeiro desvio
de um avião de passageiros de toda a História. Nos anos seguintes, auge da
revolução cubana, tornar-se-ia prática corrente voos comerciais ocidentais
serem desviados para Havana.
Texto: Luís
Almeida Martins, in “365 DIAS com histórias da HISTÓRIA de PORTUGAL”,
páginas 487/488.
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