Henrique Pereira dos Santos
O Estado de Israel foi criado por uma decisão unânime
das Nações Unidas.
Acontece que os seus vizinhos
e todos os estados árabes nunca estiveram de acordo com a decisão, e no dia
seguinte à proclamação do Estado de Israel, invadiram-no para o liquidar e
inviabilizar a resolução da ONU com base na qual tinha sido criado.
A história desse conflito é
muito anterior à criação do Estado de Israel, na região havia tensões entre
muçulmanos, judeus e cristãos (nas múltiplas variantes destas três grandes
religiões, a que se somam outras religiões que não se filia diretamente em
nenhuma destas três) há séculos, e na primeira metade do século XX essas
tensões assumiam, frequentemente, aspectos violentos, com massacres de parte a
parte.
Primeiro ponto que é preciso
reter: se é verdade que há uma migração contínua de judeus para o médio
oriente, sobretudo a partir de meados do século XIX e do reforço da ideia de
uma Jerusalém judaica eterna, é completamente falso que os judeus que formam o
Estado de Israel são invasores vindos de outro lado qualquer.
Sempre houve judeus onde hoje
é o Estado de Israel, a maioria das terras (mas não da população) eram de
judeus (embora a compra de algumas dessas terras tivessem uma propriedade
discutível e não fosse linear que os que se reclamavam donos e as venderam fossem,
de facto, os seus donos) e boa parte dos que migraram para o Estado de Israel à
procura de proteção eram judeus de todo o médio oriente, tendo sido expulsos ou
levados a migrar pelo poder crescente de estados árabes mais intolerantes que o
império otomano.
Era esse o contexto inicial da
presença da ONU, o de uma resolução que pretendia apaziguar as tensões
existentes, com a criação de um Estado judeu e um Estado árabe (tal como o
Líbano pretendia ser um refúgio para os cristãos do médio-oriente).
O projeto inicial da ONU falhou por completo visto que todos os Estados árabes rejeitam a criação do Estado de Israel, o atacam militarmente e são derrotados nessa guerra.
Os principais resultados dessa
derrota militar são que o Estado de Israel redefine as suas fronteiras, sem
respeitar a decisão inicial da ONU, e muitos árabes ou são expulsos, ou fogem
da guerra para os países vizinhos, dando origem ao grande problema dos
refugiados, que os estados árabes vizinhos de Israel não integram nas suas
sociedades, por entenderem que o direito de regresso era total e aconteceria
num futuro em que o Estado de Israel era destruído.
A ONU passa, por isso, a ter
dois problemas para resolver, o facto do Estado de Israel se recusar a voltar
às fronteiras anteriores à guerra (por entender que são indefensáveis) e o
facto de haver milhares de refugiados que não querem ou não podem voltar às
suas terras dentro das novas fronteiras de Israel, e são párias nos países para
que fugiram (há um conjunto alargado de direitos que lhes são negados pelos
Estados de acolhimento, como o direito de propriedade, e há conflitos
permanente com as populações locais, que de vez em quando se traduzem na sua
expulsão pelos países de acolhimento).
Esquecemos a primeira questão,
que na verdade está resolvida (a ONU faz resoluções a condenar Israel, Israel
reponde, como Golda Meir, dizendo que prefere receber condenações a
condolências), e olhemos para a forma como a ONU tem tratado a questão dos refugiados,
ligando-a com a atual guerra de Gaza.
A ONU assumiu um compromisso
humanitário para com os refugiados, mas, coisa extraordinária, estendeu esse
compromisso aos seus descendentes, pelo que hoje, em vez de terem diminuído, os
refugiados aumentam todos os anos, criando um exército de dependentes da ajuda
humanitária.
É a própria ONU que
admite, aqui e ali, a ineficiência dos seus sistemas de ajuda humanitária, ao admitir que 90%
da ajuda alimentar destinada a Gaza não chega ao seu destino.
É a ONU que explica a sua ligação funcional ao Hamas porque, em todos os cenários, trabalha com
os poderes de facto, mesmo quando, como é o caso, os poderes de facto são
poderes totalitários que não reconhecem outra regra que a que decorre da sua
leitura do Corão, usando as boas intenções da ONU a seu favor.
A ONU, tal como as
organizações internacionais que atuam em Gaza, fingem desconhecer que um poder
totalitário como o do Hamas jamais deixará que pessoas com reservas evidentes
contra a ditadura sanguinária do Hamas trabalhem para os organismos nacionais,
e acabam a lavar a propaganda do Hamas reproduzindo dados e alegações que lhes
são transmitidas pelos seus funcionários que, por exemplo, no caso da Médicos
sem Fronteiras, são 1000 palestinianos e trinta trabalhadores internacionais.
De resto, quando a ONU avalia
a alegação Israelita de que 12 funcionários da UNRWA participaram no massacre
de 7 de Outubro, diz que a alegação é falsa porque não são 12, são só 9 aqueles
em que há evidências de terem participado (se a informação for válida) e outros
9 não se conseguiu demonstrar que estavam envolvidos, na linha, aliás, do que
são as alegações gerais da UNRWA "less than 1 per cent of
its 30,000 staff across all UNRWA fields of operations were identified as
having breached neutrality throughout the period specified above, mainly
through posting inappropriate content on social media".
Quer isto dizer que a ONU é um
parceiro estratégico do Hamas?
Sim e não.
É um parceiro estratégico
porque é da natureza da ONU trabalhar com os poderes de facto que existem e, no
caso, o poder de facto é do Hamas (depois da guerra civil que permitiu ao Hamas
expulsar, torturar e matar todos os seus opositores, ocupando o poder de forma
totalitária).
É um parceiro estratégico, do
ponto de vista do Hamas, porque lhe permite controlar a ajuda internacional
como o mecanismo mais eficaz para manter o controlo sobre uma população
totalmente dependente da ajuda externa (é por isso que o Hamas combate
ferozmente o modelo militarizado de ajuda da GHF, que até agora não permitiu que nenhum dos seus camiões de ajuda alimentar tenham sido desviados, como acontece em percentagens que chegam aos 90% dos camiões da
ONU).
A ONU recusa-se a classificar
o Hamas como um movimento terrorista (como, aliás, se tem recusado, até agora,
a declarar a existência de fome em Gaza, é curioso, não é?) mas isso não
significa qualquer simpatia da ONU para com o Hamas, significa que a ONU não
quer cortar as ligações com o poder de facto que lhe permite estar em Gaza a
prestar ajuda humanitária e que a maioria dos países da ONU têm regimes mais
próximos da ditadura do Hamas que da democracia israelita, nada mais.
Na prática, a ONU tem
desempenhado na perfeição o seu papel de idiota útil em Gaza, o que se
compreende, dado que a alternativa era propor-se a tomar conta do governo de
Gaza com forças de capacetes azuis, o que a experiência do Sul do Líbano
evidentemente desaconselha.
Infelizmente, isso implica que
a ONU funcione como lavandaria da propaganda do Hamas, reciclando a informação
produzida pelo Hamas, dando-lhe a cobertura da credibilidade da ONU, à custa,
naturalmente, da erosão contínua dessa credibilidade.
Título e Texto: Henrique Pereira dos Santos, Corta-fitas, 10-8-2025
Thank you, @RepJoshG, for coming to witness our work firsthand.
— Gaza Humanitarian Foundation (@GHFUpdates) August 8, 2025
Over 112 million meals and counting. https://t.co/DHIKue3Xuz
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