Helena Matos
Não é o aumento da carga
fiscal nem a austeridade que à direita não se perdoa a Passos mas sim o ter
tornado irrelevantemente dispensáveis os bagões, os penedas, os freitas, os
capuchos...

De facto Passos Coelho não só
vive nos subúrbios como os seus fatos são semelhantes a milhares de outros que
os habitantes dos subúrbios vestem durante os dias de semana. Ora aquilo a que
se assiste neste momento entre os protagonistas da política em Portugal é
também uma clivagem social e geracional. Uma clivagem transversal ao espectro
político e em que os subúrbios e os fatos de segunda não serão irrelevantes.
No caso do PSD isso é
evidente: os barões, os homens de fato de bom corte e apelidos históricos
retiraram-se para que Passos Coelho fosse ali queimar umas etapas até que eles,
naturalmente senhores da situação, fossem chamados a cumprir o papel para que
se consideravam predestinados: a salvação nacional. Não foi assim e por isso o
que não perdoam a Passos Coelho não foi o que este fez de errado mas sim, pelo
contrário, que o seu falhanço não tenha sido absoluto. Tão absoluto que eles,
numa certa noite de Julho de 2013, tivessem de ser chamados a Belém onde Cavaco
lhes diria que salvassem Portugal. Não é o aumento da carga fiscal nem a
austeridade que à direita não se perdoa a Passos mas sim o ter tornado
irrelevantemente dispensáveis os bagões, os penedas, os freitas, os capuchos…
À esquerda as dores ainda são
maiores. Em primeiro lugar porque o PS era e é a verdadeira aristocracia do
regime. Em segundo porque António Costa precisou do velho PS para chegar à
liderança. E mal esse PS se sinta beliscado no seu poder e influência vai
começar a sentir-se traído pelo actual secretário-geral. Afinal o PS como bom
partido de esquerda que é gosta de tratar os seus líderes como reis desde que
estes façam o PS reinar. Por isso o PS correu com Seguro e serviu Sócrates.
Este último deu ao PS uma pose e uma linguagem de poder e o PS calou. Aquilo
que os socialistas em particular e o povo de esquerda em geral lastimam na
queda de Sócrates nada tem de ideológico mas sim de social. O que lhes dói não
são as acusações nem as suspeitas que caem sobre o antigo primeiro-ministro
(que muitos socialistas aliás sempre tiveram) mas sim que todo este caso faça a
esquerda descer do seu pedestal.
Quando, agora que Sócrates
está preso, a esquerda se admira porque ao antigo primeiro-ministro é aplicada
a legislação (aprovada por sinal pelos governos socialistas para os demais
mortais) o que faz é simplesmente manifestar a sua estupefação e incredulidade
pelo facto de o país não lhes reconhecer a superioridade da esquerda que
acreditavam ter inscrito no ADN da democracia.
O PS não quer naturalmente ser
liderado por um corrupto mas quer que, se numa outra conferência de imprensa
algum jornalista perguntar ao líder, como sucedeu quando José Sócrates anunciou
a sua renúncia, se este não teme vir a ser alvo de investigações, de novo se
ouça uma vaia monumental a quem teve o desplante de formular tal questão. O PS
espera de António Costa que não compre fatos em Rodeo Drive nem faça férias em
hotéis topo de gama mas exige que Costa seja capaz, tal como o foi Sócrates, de
ridicularizar e humilhar quem insistir em perguntar aos socialistas donde vem o
dinheiro. Agora não para um estrambólico modo de vida mas sim para as obras,
para o investimento público e para as políticas anunciadas.
O que vivemos neste momento é
um desacerto entre o mundo mediático e uma parte das elites dos partidos. Não
interessa se se gosta ou detesta. Interessa apenas que é assim. Da
extrema-esquerda ao CDS as nomenclaturas falam, agem e imaginam-se num Portugal
em que eles, urbanos e cultos, pairam sob um povo de forte pendor rural. É o
país dos muito pobres e dos muitos ricos, dos privilegiados e dos sem-abrigo. O
país no qual eles, os políticos, se veem a corrigir os desequilíbrios e as
injustiças e a mudar a realidade à força de decretos-lei.
Só que esse país, por mais
fotogénico que fosse, e de facto era e ainda é nas reportagens paternalistas
que o New York Times nos dedica, coexiste com um Portugal suburbano, cheio de
homens que vestem fatos de alfaiates de segunda para ir trabalhar. Alguns optam
por uma ainda mais esteticamente dramática versão desportiva. As élites
partidárias, culturais e mediáticas abominam este mundo que não fica bem nas
fotografias, não aparece muito nas encíclicas e não encontra explicação em
Marx. Das universidades onde se multiplicam os centros de estudos dirigidos por
clones de Raquel Varela às sedes partidárias sejam elas de esquerda ou de
direita, a dicotomia entre os muito pobres e os muito ricos justifica-lhes
muito mais o seu pendor intervencionista.
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Massamá, junho de 2011, foto: JP |
Mas o país suburbano existe e
é fundamental que os grandes partidos e os seus líderes democratizem a relação
que têm com ele. Caso não o façam o desinteresse dessas pessoas será um dos
terrenos em que crescerão os populismos que tornarão o país ingovernável. Os
casos da França e da Espanha são um bom exemplo daquilo a que pode conduzir a
clivagem entre os partidos democráticos e a realidade. Só que em Portugal não
será sequer necessário que surjam uma Frente Nacional ou um Podemos para que
acabemos num beco sem saída ou mais propriamente a acreditar que é possível
regressar ao passado. PS e PSD têm mais do que quanto baste de gente que
acredita que tal não só é possível como desejável.
1 - Raquel Varela não teve a argúcia e a consciência suficiente para perceber que a sua frase foi uma grande homenagem a PPC.
ResponderExcluirHoje os cidadãos identificam-se com políticos probos e não com pavões de fatos de marca e outros gadgets, pagos com dinheiros públicos, obtidos com prebendas auto atribuídas, ou de modo ainda menos lícito e mais ignóbil.
2 - O ataque de sobranceria social é frequente aos políticos que ponham em causa o establishment estatista e socialista.
Aníbal e Maria CS são o exemplo acabado de todo o esse tipo de snobeira: a vivenda Mariani, o episódio do bolo-rei, a fotografia do beijo na mão de Letizia, a atitude antiquada de MCS, etc…
3 - Laura PC está a salvo; a sua cor de pele protege-a de qualquer comentário desta natureza, porque os audazes intriguistas político/sociais, morrem de medo de ser classificados de racistas. Estão à evidência dominados por novos preconceitos e baias de raciocínio.
4 -No mais relevante, dão pouco valor ao mérito, de onde quer que este provenha. E somos nós os liberais, que não compreendemos a sociedade e não respeitamos princípios humanitários!
5 - Baiões, Capuchos, Ferreiras Leite, Freitas, Penedas, Jardins, etc cometem o erro frequente dos políticos, conceberem-se de utilidade vitalícia. São sem dúvida, no domínio da sua vida pessoal, familiar, profissional, cultural, social, mas a política é uma área caprichosa, rebelde e volúvel, não um leito tranquilo para toda uma vida – por todos, o mau exemplo da longevidade governamental de Jardim.
Passos Coelho é isto, é aquilo, tem medo de sapos e de lagartixas, não é um "verdadeiro social-democrata", mora em Massamá, é inexperiente, imberbe, etc... E quem mais apregoa estas insofismáveis 'verdades'? Gente da Direita. (Desculpem-me se ofendo alguém, eu sou de direita, convictamente e sem complexos, feliz). Ou é ingenuidade, ou é infiltração. Na luta política, Passos Coelho precisa de guerreiros, não de pelegos, nem de ingênuos.
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