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Abbas exibe cópia da carta que entregou a Ban Ki-Mon.
Foto: Reuters
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Francisco Vianna
Bradando que "a primavera
palestina chegou!", Abbas confirmou sua promessa de pedir sua inclusão na
ONU, com uma expressão que remete à “onda democrática” que varre o mundo árabe.
Como poucas vezes se viu em plenário, o líder palestino foi entusiasticamente
aplaudido por uma audiência que lotava o recinto, mostrando que provavelmente
os votos para que consiga ser incluído estão assegurados.
A jogada diplomática de Abbas
desafia Israel e põe em cheque a diplomacia de Washington que, após a votação,
provavelmente terá que vetar o ingresso dos Palestinos. O Conselho de
Segurança, do qual deverá vir o veto dos Estados Unidos, vai avaliar, depois de
amanhã, o pedido da ANP, muito embora isso não signifique que ele seja votado
nesse dia. De qualquer forma, trata-se de uma pressa inusitada em apreciar uma
proposta, o que pode ser sinal de que novos ventos de entusiasmo na burocracia
da organização mundial.
Em sua fala, o primeiro-ministro
israelense, Benjamin Netanyahu, disse: “venho dizer aqui a verdade num recinto
no qual muitas vezes se ouvem mentiras e nem sempre de faz uma boa imagem de
Israel". A seguir o representante israelense pediu que a Assembléia
desconsiderasse e não votasse o pedido de Abbas. “Faço esse pedido convencido
de que o contrário será dar aval a uma reedição das políticas de limpeza étnica
que alimentaram a matança de judeus, e persuadido de que a recusa que solicito
é necessária para garantir a segurança de Israel", que descreveu como
"um pequeno país, amante da paz, e que necessita ser protegido".
Abbas incluiu em seu pedido a
soberania sobre um território com a cidade de Jerusalém como capital e limitado
"pelas fronteiras de 1967", o que inclui a Cisjordânia, Jerusalém
leste – onde vivem, em ambos os lugares, 500.000 colonos israelenses – e a
Faixa de Gaza. Afirmou, também, que "este é apenas 22% do território que a
Palestina ocupava quando a região se encontrava sob controle militar britânico
e quando todo isto começou".
As potências ocidentais,
paralelamente, se esforçaram para desencalhar o mecanismo de negociação direta
e bilateral entre israelenses e a representação palestina, ainda que, pela
primeira vez em muitos anos, tal fato possa ocorrer a partir de uma ‘posição de
força’ por parte da ANP. A secretária de estado americana, Hillary Clinton,
tratou de "urgir ambas as partes em aproveitar esta ocasião para retomar o
diálogo". Era tido como certo que ambos os lados diriam que sim.
O chamado ‘quarteto da paz’
(EUA, Rússia, China e UE) destaca que "uma coisa não excluí a outra",
enfatizando a urgência, e pedindo que as negociações consigam definições ainda
este ano.
A novidade, na verdade, é a
apelação ao Conselho de Segurança (CS). Aí os palestinos necessitam de pelo
menos nove votos e que não haja nenhum veto dos cinco países que, como membros
permanentes, têm o poder de impô-lo. Os palestinos contam já com os avais da
China, da Rússia, do Brasil, do Líbano e da África do Sul (os três últimos
sendo membros não permanentes do CS). Sabem, também, que paira sobre sua
pretensão a ameaça explícita do veto estadunidense, muito embora haja indícios
de que Washington gostaria de não usá-lo. Parece haver a consciência, no
Departamento de Estado, de que, com o veto, os EUA se arriscam a sofrer uma
debacle de sua política externa no Oriente Médio.
Todos esses aspectos pairavam
no ar ao início dos discursos, quando Abbas, de 76 anos, sucessor do
carismático Yasser Arafat, executou sua melhor cartada política tentando, ao
mesmo tempo, evitar o ‘choque total’ com Israel e sensibilizar o mundo quando a
sua pretensão.
Abbas aceitou a possibilidade
do diálogo, sob a única condição expressa de que fossem interrompidos os
assentamentos israelenses. Em troca de tal ‘flexibilidade’, aceitou discutir
outras questões, como a volta dos refugiados palestinos caso Israel admita a
existência da Palestina como Estado, o que por sua vez, depende do mesmo
reconhecimento dos palestinos do estado judeu. Acrescentou que “a ANP não quer
isolar Israel nem deslegitimá-lo, mas apenas legitimar a nação palestina, que
estende a mão a Israel para que aproveite esta ocasião, pois está disposta a
voltar imediatamente à mesa de negociações".
É claro que tais declarações
podem conter mais um conteúdo retórico do que real, mas o certo é que tal
exercício de dialética terminou com uma ovação intensa por parte do plenário da
Assembléia Geral, principalmente quando ele brandiu da tribuna uma cópia da
solicitação que fez à secretaria-geral da ONU, e gritou que “a paciência dos
palestinos se esgotou e que chegou a hora de dizer basta".
Por sua vez, Netanyahu
rechaçou a proposta de Abbas por considerá-la uma "ameaça" para
Israel. Deixou também clara a sua convicção quanto à inviabilidade da Palestina
como estado regular e soberano, uma vez que parte de seu território está nas
mãos de perigosos extremistas que recebem mísseis do Irã e de outros poucos
países antijudeus".
Na verdade, foi através de uma
resolução da ONU que se criou o estado de Israel e se demarcou o território
para a criação de um futuro estado palestino, interesse manifesto, por diversas
vezes pelos próprios israelenses. Todavia, os palestinos jamais tiveram a
capacidade de montar tal estado e a própria ANP sobrevive graças aos recursos
financeiros mensais enviados pelas potências ocidentais e pelo próprio estado
de Israel.
Quanto ao território na época
fixado pela ONU para os palestinos, há que se considerar a intercorrência de
duas guerras – a dos Seis Dias e a do Yom Kipur – não iniciadas por Israel, e
que não podem ser ignoradas como se jamais tivessem ocorrido.
Até sobre o aspecto
territorial, o estado palestino encontra uma dificuldade que o inviabiliza:
como imaginar um país composto de duas áreas sem continuidade entre elas (Faixa
de Gaza e Cisjordânia)?
Os possíveis desdobramentos da iniciativa da ANP de Abbas que estão sendo
considerados são os seguintes, variando do mais provável para o menos provável:
1. ACEITAÇÃO CONDICIONADA – os diplomatas ocidentais podem conseguir
um acordo submetendo a aceitação do ‘estado palestino’ ao fato da retomada
ativa das negociações bilaterais que culminaria com um tratado de aceitação
mútua e de demarcação de territórios a serem ratificados pelo CS. A suspensão
dessas conversações ou seu impasse anulariam em si a aceitação condicionada e a
situação retornaria à estaca zero
2. NÃO ACEITAÇÃO POR DERROTA NA VOTAÇÃO OU POR VETO – Segundo uns esse
é o caminho mai provável a ser seguido, e que Abbas estaria, afinal, mais
interessado, pois poria, em tese, toda a região contra o país vetante, no caso
os EUA.
3. INDEFINIÇÃO DA ONU – o pedido palestino ficaria mantida por tempo
indefinido sob estudos de viabilidade da ONU e sendo progressivamente submetido
a diversas condicionantes, entre elas a principal de que o problema seja
resolvido apenas entre as partes envolvidas: palestinos e israelenses. Nesse
caso a pretensão palestina acabaria confinada numa espécie de limbo e se
perderia numa série interminável de conversações paralelas.
4. O RETORNO DA VIOLÊNCIA – é o que menos interessa a Abbas, mas é o
que mais interessa aos grupos militantes do Hamas, na Faixa de Gaza ou do
Hezbollah, no sul do Líbano. Segundo o ex-primeiro ministro de Israel, Ehud
Olmert, “esse é o pior dos casos, pois poderá inviabilizar qualquer acordo e,
em último caso, obrigar Israel a outra guerra de auto-defesa – como as duas
anteriores – que leve à ocupação definitivamente os territórios pretendidos
pela ANP, com provável alto custo humano.
Se a jogada política de Abbas
foi apenas para conseguir uma maior influência sobre Israel, de uma forma
política e pacífica, ela é bem-vinda pelos judeus, desde que os israelenses
possam sentir que há, pelo menos, uma intenção palestina de se acomodar com o
estado de Israel e construírem uma coexistência que possa proporcionar
condições de desenvolvimento para populações que, há menos de meio século, não
passavam de tribos nômades do deserto da Palestina. Caso contrário, trata-se
apenas de um número de prestidigitação, numa tentativa de tapar o sol com a
peneira.
Deve ser por isso que o
governo do Brasil o apóia...
Título e Texto:
Francisco Vianna
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