STF barrou busca em gabinete de Serra, mas
autorizou ação semelhante contra líder do governo
Sérgio Luis de Deus
Em setembro do ano passado, o
senador Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE), líder do governo Bolsonaro no Senado,
foi surpreendido por uma operação da Polícia Federal. Os agentes cumpriram um
mandado de busca no gabinete dele no Senado, apreendendo documentos, telefones
celulares e computadores como parte de uma investigação sobre corrupção.
Policiais legislativos chegaram a isolar a área para que a PF pudesse cumprir a
ordem judicial expedida pelo ministro Luis Roberto Barros, do Supremo Tribunal
Federal (STF).
Dez meses se passaram e a
Polícia Federal voltou a bater na porta do Senado. Desta vez no gabinete do
senador José Serra (PSDB-SP), investigado por suposto caixa dois eleitoral.
Agora, porém, os policiais foram impedidos de fazer o seu trabalho por ação do
presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP). O senador falou por telefone
com o delegado que presidia a diligência e alegou que o mandado era abuso de
poder e uma “violação à hierarquia do Poder Judiciário”.
A mando de Alcolumbre,
advogados do Senado acionaram o STF com um pedido de liminar enquanto os
agentes ficaram do lado de fora esperando um posicionamento da Suprema Corte. E
ele veio. O mandado de busca foi suspenso pelo presidente do STF, Dias Toffoli,
que considerou muito “ampla” a ordem judicial expedida pelo juiz Marcelo
Antonio Martin Vargas, da 1ª Zona Eleitoral de São Paulo.
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Foto: Rosinei Coutinho/STF |
Toffoli considerou que a
“extrema amplitude” da ordem de busca e apreensão contra Serra – abrangendo
computadores e quaisquer outros tipos de meio magnético ou digital de
armazenamento de dados – “impossibilita a delimitação de documentos e objetos
que seriam diretamente ligados ao desempenho da atividade típica do mandato do
Senador”. Nesse caso, a competência para tomar tal decisão seria do Supremo.
Decisão de Toffoli é equivocada, diz chefe da força-tarefa da Lava Jato
“Se a moda pega”, ironizou o
procurador Deltan Dallagnol, chefe da força-tarefa da Lava Jato em Curitiba.
Ele fez uma série de publicações no Twitter para explicar por que a decisão é
“muito equivocada”. “O mesmo argumento de Toffoli poderia ser utilizado contra
buscas e apreensões em quaisquer lugares, pelo risco de prejuízo à atividade
empresarial, judicial, advocatícia, ministerial etc., dignas de igual proteção,
o que inviabilizaria a apuração de crimes”, escreveu.
“Com todo o respeito ao STF e
seu presidente, trata-se de solução casuísta que está equivocada juridicamente
e que, independentemente de sua motivação, a qual não se questiona, tem por
efeito dificultar a investigação de poderosos contra quem pesam evidências de
crimes”, alertou Dallagnol.
O procurador da Lava Jato
citou a operação contra o atual líder do governo, mencionada no início do
texto, para argumentar contra a decisão de Toffoli. Em outubro de 2019, o
ministro Celso de Mello, decano do STF, rejeitou um pedido de habeas corpus da
mesa diretora do Senado em favor de Fernando Bezerra.
O HC pedia liminar para
suspender a análise do material apreendido no gabinete da liderança do governo,
com devolução integral dos documentos e objetos apreendidos. Solicitava ainda
que fosse reconhecida a inconstitucionalidade da decisão e abuso de poder.
Celso de Mello negou o pedido,
afirmando que a execução da medida de busca e apreensão em gabinete e imóvel
funcional ocupado por parlamentar sob investigação penal tem plena legitimidade
jurídico-constitucional, mesmo que o titular do mandato ocupe a função de líder
do governo, e não depende de autorização prévia do Congresso.
Em sua decisão, enfatizada por
Dallagnol, o decano afirmou que, ao entrar com o HC, a mesa do Senado tenta
criar um “círculo de imunidade virtualmente absoluta” ou um "santuário de
proteção" em torno dos gabinetes dos parlamentares e dos imóveis
funcionais que ocupam. Segundo Celso de Mello, isso é incompatível com o
princípio republicano, inconciliável com os valores ético-jurídicos que
orientam a atuação do Estado e conflitante com o princípio da separação de
Poderes. “Ninguém está acima da autoridade das leis e da Constituição da
República”, afirmou, acrescentando que o postulado republicano repele
privilégios e não tolera discriminações.
Mandado contra líder do governo partiu de outro ministro do STF
A diferença entre os casos
está na origem da ordem judicial. No caso de Bezerra, o mandado foi expedido
pelo ministro do STF, Luis Roberto Barroso, relator do caso. Celso de Mello
cita que a jurisprudência não admite habeas corpus contra decisão de ministros
da Corte. Já o mandado desta terça contra José Serra partiu de um magistrado da
primeira instância da Justiça Eleitoral de São Paulo.
Chamou a atenção a velocidade
com que Toffoli decidiu sobre o caso, a ponto de impedir que a PF cumprisse a
ordem de busca e apreensão. A ação foi ajuizada pelo Senado por volta das 9h10,
quando os agentes estavam no local. Duas horas depois já havia uma decisão
favorável ao pleito do Senado. No caso de Bezerra, o despacho do decano da Corte
veio quase 30 dias após a deflagração da operação no gabinete dele.
O relator do caso de Serra no
STF é o ministro Gilmar Mendes, mas, em função do recesso judiciário, coube ao
presidente da Corte analisar o pedido do Senado.
O senador tucano é investigado
pelo crime de caixa 2 eleitoral na campanha ao Senado Federal, em 2014. O
parlamentar tucano teria recebido R$ 5 milhões em três parcelas. Segundo a PF,
contratos foram fraudados para dissimular os repasses de dinheiro. Serra disse
que as acusações são falsas e criticou a “espetacularização” da operação
policial.
O senador Fernando Bezerra foi
acusado de receber propina quando era ministro da Integração Nacional do
governo Dilma Rousseff (PT). Segundo delação premiada de empresários, houve
desvio de dinheiro público em obras na Região Nordeste, como a transposição do
rio São Francisco, envolvendo o então ministro, o deputado Fernando Coelho
Filho (DEM-PE), filho dele, e quatro empresas, entre elas a empreiteira OAS.
Título e Texto: Sérgio Luis
de Deus, Gazeta do Povo, 21-7-2020, 19h33
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